quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Acesso à central de dados bancários


O acesso à central de dados estava reservado a pedidos no âmbito de processos penais. Mas parlamento quer acesso de todos os processos judiciais.
O parlamento quer alargar o acesso à base de dados de contas do sistema bancário a todos os processos judiciais, uma medida que se insere na linha do reforço da transparência e combate à corrupção. Até agora apenas os pedidos remetidos no âmbito de processos de natureza penal podiam receber luz verde do Banco de Portugal. Mas caso o diploma seja aprovado na especialidade esta base de dados passará a estar acessível a todos os processos judiciais, incluindo processos cíveis.
A proposta foi apresentada pelo grupo parlamentar do Partido Socialista (PS) e aprovada na generalidade na quarta-feira com votos favoráveis do PS e do Bloco de Esquerda e com a abstenção dos restantes partidos. O PS justifica a iniciativa com o desfasamento da actual lei face aos pedidos recebidos pelo Banco de Portugal.
“Apenas cerca de 10% dos pedidos recebidos dizem respeito a pedidos efectuados no âmbito do processo penal, correspondendo a larga maioria dos restantes pedidos a processos com natureza cível, a que, por força da falta de habilitação legal, o Banco de Portugal está impedido dar resposta expedita através de uma consulta à Base de Dados de Contas do Sistema Bancário, com inegável prejuízo para a celeridade da justiça”, lê-se no documento. Fonte ouvida pelo Diário Económico considera que esta é uma medida que poderá ter impacto na celeridade dos processos que envolvem a cobrança de dívidas já que, “os tribunais estão inundados com cobranças judiciais de dívidas”, os quais constituem processos cíveis.
Segundo os dados publicados pelo regulador, desde Julho “foi dada resposta a 460 requerimentos formulados por autoridades judiciárias”. Ou seja, tendo em conta a percentagem de pedidos atendidos revelada na proposta de lei do PS (10%), o Banco de Portugal terá negado o acesso a mais de 4.000 pedidos por não cumprirem os requisitos legais para o efeito. Desta central não constam dados relativos a movimentos e saldos de conta, mas apenas dados que permitem localizar as contas existentes de determinado titular (ver texto ao lado).
A base de dados de contas do sistema bancário ficou operacional em Julho deste ano, com o intuito de ser um instrumento de investigação para as autoridades judiciárias, permitindo assim aumentar a celeridade dos processos. Até Julho, a Justiça pedia informação sobre se determinado particular ou empresa tinha contas em território nacional ao regulador que, por sua vez, divulgava o pedido entre todos os bancos. As instituições enviavam então informações (positivas ou negativas) ao processo, respostas essas que podiam demorar, em média, dois a três meses.
A informação concentrada junto do Banco de Portugal permite agora às autoridades judiciárias saber a que instituições deverão dirigir-se, e desta forma obter os dados bancários necessários de forma mais fácil e rápida. Esta base de dados reúne actualmente informação relativa a mais de 61 milhões de contas, nas quais são intervenientes 31 milhões de pessoas singulares ou colectivas na qualidade de titulares ou pessoas autorizadas a movimentá-las.
Após a aprovação na generalidade, a proposta desce agora à discussão na especialidade, podendo portanto sofrer ainda pequenos ajustes. No entanto, com a primeira aprovação e sem nenhum voto contra, tudo leva a crer que o diploma venha a ser aprovado também na especialidade. De lembrar que o diploma que cria e autoriza o acesso à base de dados do Banco de Portugal no âmbito de processos penais foi publicado a 2 de Setembro de 2010. A nova proposta visa apenas alterar a alínea c), do ponto 3 do Artigo 79º, permitindo o acesso à central de dados “no âmbito de um processo judicial”.
Diferentes interpretações do sigilo bancário
Já em Setembro, e com a base de dados do Banco de Portugal a funcionar há três meses, as opiniões dos especialistas continuavam a dividir-se quanto à conformidade da lei de Setembro de 2010 com o dever de sigilo bancário. “A interpretação da norma em causa não é líquida, longe disso”, afirmou na altura ao Diário Económico o penalista Germano Marques da Silva. E adianta que a questão que se coloca é a de saber se a alteração da lei apenas pretendeu substituir autoridades judiciais por autoridades judiciárias para a pôr em conformidade com o que já agora é possível (criminalidade organizada e económica e financeira) ou, diz, “se pretendeu mais, ou seja, em todos os casos permitir o acesso por parte do Ministério Público sem necessidade de intervenção do Tribunal Superior”. Já Eudides Dâmaso Simões, director do DIAP de Coimbra, afirmava também em Setembro, que esta lei “cumpre rigorosamente esse objectivo”, de equilibrar a eficácia da reacção penal e as liberdades e garantias individuais. L.S. e M.M.S.
Da base de dados não constam movimentos e saldos bancários.
A base de dados de contas do sistema bancário, que em Outubro já contava com 61 milhões de registos, visa ser um instrumento de investigação para as autoridades judiciárias. Esta base de dados, sob a alçada do Banco de Portugal, foi criada no âmbito do combate à corrupção em Março deste ano, e ficou operacional a partir de Junho.
1 O QUE MUDA NO ACESSO À BASE DE DADOS DE CONTAS BANCÁRIAS?
Até agora apenas podiam recorrer a esta base de dados, através de pedido dirigido ao Banco de Portugal, as autoridades judiciárias cuja solicitação decorresse de um processo de âmbito penal, ou seja, quando estivessem em causa indícios de crime. Com a aprovação do novo Decreto de Lei, passarão a ser atendidos os pedidos que resultem de qualquer processo judicial, incluindo os de natureza cível, ou seja, litígios de ordem privada.
2. O QUE JUSTIFICA ESTA ALTERAÇÃO?
De acordo com o documento aprovado na generalidade na última quarta-feira em Assembleia da República, “apenas cerca de 10% dos pedidos recebidos dizem respeito a pedidos efectuados no âmbito do processo penal, correspondendo a larga maioria dos restantes pedidos a processos com natureza cível, a que, por força da falta de habilitação legal, o Banco de Portugal está impedido de dar resposta expedita através de uma consulta à Base de Dados de Contas do Sistema Bancário, com inegável prejuízo para a celeridade da justiça”.
3. QUE TIPO DE INFORMAÇÃO CONSTA DA BASE DE DADOS?
Nesta central constam informações sobre a identificação do número de conta, a entidade bancária, a data de abertura, os titulares e pessoas autorizadas a movimentá-las, incluindo procuradores, e a data do seu encerramento. Estes dados apenas poderão ser transmitidos às autoridades judiciárias.
4. TRATA-SE DE ACESSO ÀS CONTAS BANCÁRIAS?
Não se deve confundir o acesso às contas bancárias com o acesso à base de dados de contas bancárias, uma vez que esta última apenas contém elementos que identificam as contas, os titulares e os seus representantes. Os movimentos e os saldos das contas bancárias não constam da base de dados.
5. QUAIS AS CONTAS REGISTADAS NA CENTRAL?
Contas de depósito à ordem e a prazo, contas de instrumentos financeiros, contas de crédito (incluindo as contas de cartão de crédito, de crédito à habitação e de crédito ao consumo) e contas de pagamento. Os titulares são pessoas singulares e colectivas em nome de quem se encontra aberta uma conta bancária.
Marta Marques Silva e Lígia Simões
 Diário Económico. 20-12-2011

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