sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Cortes financeiros vão atrasar a avaliação de juizes


Quebra de 30% no orçamento do Conselho Superior da Magistratura cria entraves nas inspecções.

O Conselho Superior da Magistratura (CSM) já definiu o plano de inspecções aos magistrados para 2012 mas admite que o corte orçamental vai obrigar a “racionalizações” e haverá, até, “problemas” e “atrasos” na avaliação dos juizes. O CSM sofreu em 2012 “um corte de 30% face aos 900 milhões deste ano e não conseguirá assegurar todas as deslocações dos inspectores aos tribunais para aferir o mérito dos juizes. “80% do nosso orçamento vai para as inspecções, o corte é grande e vai trazer constrangimentos e obrigar à racionalização nas avaliações”, admite ao Diário Económico o vice-presidente do CSM, que rejeita falar em perda de qualidade e de rigor nas inspecções.
António Francisco Martins, presidente da Associação Sindical dos Juizes Portugueses, desafia o CSM a aproveitar o momento para apresentar ao Governo a proposta de criação “do verdadeiro modelo de avaliação” que o programa do Governo PSD/CDS exige. O vice-presidente do CSM não abre o jogo, mas deixa implícitas algumas das mudanças que poderão ser propostas: aumento do número de inspectores (actualmente há 20), alargamento do prazo das inspecções ordinárias – agora são feitas de quatro em quatro anos – e também do prazo de avaliação dos juizes em início de carreira. Aliás, a avaliação destes últimos é a que, segundo reconhece Bravo Serra (ver entrevista ao lado), sairá mais prejudicada com os cortes. “Aqui haverá atrasos”, admite o vice-presidente do CSM, para quem poderá ter que ser necessário “alargar o prazo de um ano”. A lei, recorde-se, obriga a que os juizes em início de carreira sejam avaliados ao fim do primeiro ano de exercício.
António Francisco Martins reage e entende que o CSM está precisamente a defender o caminho errado: “A avaliação de um magistrado no primeiro ano é a mais importante, até do ponto de vista pedagógico, e é um erro mexer nesta avaliação inicial se querem melhorar o desempenho dos magistrados. Vale mais mexer no prazo de quatro anos das inspecções ordinárias que na avaliação dos juizes em início de carreira”, diz o juiz desembargador ao Diário Económico.
O projecto de inspecções ordinárias para 2012 – a que o Diário Económico teve acesso – prevê 150 avaliações a juizes de 1ª instância (menos cem que no ano anterior) mas, ainda assim, o CSM antecipa “que podem surgir problemas de pagamento” aos inspectores e que estes serão “obrigados a racionalizar” as suas deslocações. Isto é, em vez de fazerem, por exemplo, dez deslocações a tribunais por onde passou determinado juiz, farão apenas quatro. Numa entrevista recente ao Económico, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Noronha Nascimento, que é por inerência presidente do CSM, tinha já avisado que “todo o sistema de avaliação corria o risco de colapsar” ou, pelo menos, “ter grandes dificuldades”. As inspecções aos juizes para avaliação do mérito são feitas de quatro em quatro anos (para consequente classificação e progressão na carreira) e poderão ver o prazo alargado. Esta deverá ser uma das propostas que o CSM apresentará à ministra para a criação de um “verdadeiro” modelo de avaliação de magistrados. Passos Coelho incluiu esta meta no seu programa de Governo – e deixou aos conselhos superiores o ónus de apresentarem soluções – mas até hoje o Ministério da Justiça não explicou o que entende por “verdadeiro” modelo de avaliação. Certo é que um dos objectivos da ministra Paula Teixeira da Cruz é aplicar critérios quantitativos na avaliação da produtividade de tribunais e juizes e monitorizar a sua actividade, em prol de uma melhor gestão do sistema. “Somos favoráveis à existência de um modelo de avaliação, mas se há problemas financeiros é melhor definir novas formas de trabalho do que estar a fazer avaliações sem qualidade”, diz António Francisco Martins. A alegada falta de qualidade e exigência da avaliação dos juizes (que é feita por juizes em comissão de serviço) foi sempre muito atacada dentro do sector, inclusive pelo bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, que fala em “corporativismo”.
Inês David Bastos
Diário Económico 2011-11-25

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