segunda-feira, 6 de maio de 2013

Austeridade sobre pensionistas triplica em 2014


Cortes na despesa do Estado
As mexidas nas pensões desenhadas pelo Governo vão tirar 1,44 mil milhões de euros aos pensionistas só em 2014, mais do triplo da austeridade que estão a suportar este ano
ELISABETE MIRANDA elisabetemiranda@negocios.pt
Para quem já está reformado, uma nova taxa. Para quem se venha a reformar, uma maior penalização por viver mais tempo. Para os futuros reformados do Estado, novas regras de cálculo que trazem menos dinheiro. Estas são as três principais vias pelas quais o Governo pretende cortar nas despesas com pensões. Ao todo, é tirado ao bolso dos pensionistas l,44mil milhões de euros em 2014, um valor que representa mais do triplo da austeridade que estão a suportar este ano.
Nova taxa substitui CES, mas fundos privados escapam
Quem já está reformado enfrenta uma nova taxa a partir de Janeiro. Passos Coelho confirmou que o Governo está a estudar esta solução de modo a pôr os pensionistas a darem uma contribuição para a sustentabilidade dos sistemas de pensões. Trata-se, como o Negócios já tinha avançado, de uma espécie de “taxa social única” a incidir agora sobre um terceiro grupo. Por afectar as pensões em pagamento esta é uma medida melindrosa do ponto de vista constitucional, mas interpretações mais optimistas do Acórdão apontam no sentido que, ao viabilizar a CES, os juizes aceitaram que o sistema previdencial possa recorrer a outras fontes de financiamento além das empresas e trabalhadores. Passos Coelho anunciou que os cortes seriam indexados ao andamento da economia, o que poderá também ajudar a convencer os juizes. Apesar de pretender substituir a CES (em termos orçamentais elas valem sensivelmente o mesmo, 430 milhões de euros), há contudo diferenças. Desde logo, a taxa só abrangerá os reformados da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, o que deixará de fora quem recebe pensões através de fundos de pensões privados, onde estão algumas das pensões mais altas do País.
A taxa e o limiar mínimo das pensões que ficarão excluídas dos cortes não foram divulgados. Viver mais tempo custará mais caro aos futuros reformados Aos futuros reformados espera-os um encarecimento do preço por viverem mais tempo. Este “preço” é expresso através do chamado “factor de sustentabilidade”, que desde 2007é calculado a partir da divisão entre a esperança de vida aos 65 anos registada em 2006 (de 17,94 anos) e a esperança de vida no ano anterior ao da reforma. Segundo informações apuradas pelo Negócios, o plano do Governo é abandonar o ano de 2006 como indexante base e usar um ano mais recuado, o que dará cortes mais expressivos. Adicionalmente, o Governo pretende também fazer as pensões dependerem da massa salarial, o que significa que em anos em que os descontos dos trabalhadores para a Segurança Social caiam, como em tempos de crise, as pensões levam cortes maiores.
Para escapar a estes cortes há a alternativa (pelo menos teórica) de trabalhar mais tempo, para lá dos 65 anos de idade legal. Este ano, a idade de acesso à pensão sem qualquer penalização é de 65,5 anos, sendo o objectivo do Governo que ela passe para os 66 anos com a revisão da fórmula de cálculo. Segundo as contas do Negócios, tal poderá implicar cortes nas pensões em tomo dos 10% em 2014 (contra 4,78% este ano).
Futuras pensões do Estado emagrecem
Para os futuros pensionistas do Estado, a medida mais esperada vai concretizar-se: o ritmo de convergência da fórmula de cálculo das pensões será acelerado. Passos Coelho não disse qual a velocidade dessa convergência, nem a forma como será feita, mas a magnitude da poupança aponta para um processo de grande alcance: serão poupados 740 milhões de euros só em 2014, o que sugere uma harmonização imediata de regras. Todas estas intenções estão sujeitas a negociação, diz o Governo.
IDEIAS-CHAVE
PENSÕES SOFREM POR DIVERSAS VIAS
1 TAXA PROPORCIONAL SOBRE AS PENSÕES EM PAGAMENTO
Uma taxa universal e única a incidir sobre as pensões pagas pela Caixa Geral de Aposentações e Segurança Social: esta é a solução para substituir a CES de Janeiro de 2014 em diante. Passos Coelho diz, contudo, que quer usar esta medida com a maior parcimónia possível. Ela será indexada ao PIB, pelo que será pró-ciclica: mais penalizadora em tempos de recessão e mais ligeira quando a economia cresce.
2 FACTOR DE SUSTENTABILIDADE ROUBA NO VALOR DA PENSÃO
O factor de sustentabilidade continuará a roubar no valor da pensão da reforma, só que mais do que estava previsto. Esperava-se que quem se reformasse em 2014 sofresse um corte de 5%, aproximadamente, mas o Governo quer alterar a fórmula de cálculo e, com isso, agravar esta taxa. O agravamento surge por duas vias: a alteração do ano de 2006 como âncora em relação ao qual se mede a evolução da esperança de vida e a incorporação da massa salarial na fórmula, o que significa que em anos de grande desemprego, a penalização é maior. A alternativa é trabalhar mais tempo para compensar os cortes, sendo que o Governo quer que este “mais tempo” seja até aos 66 anos (agora está nos 65 anos e cinco meses). Esta penalização acumula com a anterior.
3 FUTUROS REFORMADOS DO ESTADO PERDEM A TRIPLICAR
Quem entrou no Estado antes de 1993 e se reforme agora tem a pensão calculada com base em duas regras. Pelo tempo de trabalho até fim de 2005, contará o salário de 2005. A segunda parte da pensão é calculada com base na média dos salários entre Janeiro de 2006 e a data da aposentação. Estas regras são mais favoráveis do que no regime geral de Segurança Social. Aqui, quem se reforme agora tem a pensão calculada com base em duas parcelas: os melhores dez dos últimos 15 anos terminados em 2007 e uma segunda parcela com a média de todos anos para o resto do tempo. A ideia é aproximar a Função Pública desta última, embora uma harmonização total seja difícil pelo facto de o Estado não ter registos de descontos anteriores a 1993.
Quem se reformar do Estado em 2014 sofre este efeito, mais o dos pontos anteriores.
Jornal Negócios, 6-5-2013

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