Público - 14/04/2013 - 00:00
Muita gente se tem declarado
incapaz de perceber a ideia de "igualdade" em que o Tribunal
Constitucional fundou a sua decisão de rejeitar uma parte do Orçamento do
Estado. É compreensível: "igualdade" é uma noção por natureza
equívoca e ambígua. Quando apareceu pela primeira vez, em 1789, na
"Declaração dos Direitos do Homem", por proposta dos liberais da
Assembleia Constituinte, queria dizer muito simplesmente "igualdade"
legal. Ou seja, servia para condenar e abolir os privilégios de que gozavam a
nobreza de "espada", a nobreza judiciária, parte da "classe
comercial" e as corporações. Mas pouco a pouco acabou por se alargar à
população inteira, dissolvendo as fronteiras entre os representantes políticos
da França e o homem comum; e o sufrágio censitário em que assentava a única
possibilidade de substituir o regime "absolutista". Com essa
solitária palavra a revolução começou.
E a revolução aumentou ainda
o alcance desse maleável conceito. Depois da "igualdade" legal chegou rapidamente a
"igualdade"social. Depois da queda da monarquia, e sob pressão
das "secções" de Paris (que não passavam de agências do radicalismo),
os jacobinos pediram pela voz do "virtuoso" Robespierre que o direito
a uma existência digna e modesta (claro!) fosse reconhecido como um direito
universal. Isto implicava, é claro, num país do século XVIII, a fixação dos
preços e o abastecimento do "povo" pelo confisco dos produtores e
também dos "ricos" (les riches égoïstes). O regime só podia
sobreviver pelo terror. E o "terror" veio como devia vir.
A carreira da
"igualdade", com algumas diferenças de tempo e circunstâncias, voltou
a acontecer nas genuínas revoluções do século XIX e até do século XX, da
revolução russa à revolução cubana. Todas trouxeram a miséria e o desespero. O
"igualitarismo" (de resto anunciado pela política de Bismarck e pelo
Império Austro-Húngaro e não pelos socialistas, que o combateram) da Europa
Ocidental posterior à II Guerra Mundial evoluiu para o Estado social, que o
transitório domínio dos mercados mundiais e a ajuda americana permitiam à
Europa financiar, sem violência ou acidentes de maior. Mas, desgraçadamente,
esse paraíso artificial, que parecia eterno, começou a morrer por volta de 1970
e hoje está manifestamente em agonia. Aceitar o princípio da "igualdade"
como princípio regulador da Constituição Portuguesa é, em 2013, absurdo e
perigoso; e um sinal do provincianismo de um país que, desde meados do século
XVIII, viveu sempre à margem da cultura europeia.
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