segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Felizmente há Sol!

Sentir o Direito
02 Dezembro 2012
Por: Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
Escrevo num estado de alma de máxima tristeza pela morte de minha mãe, a quem deverei sempre a determinação e a coragem de ser gente. Como ela dizia, sobretudo nas horas mais difíceis, é preciso "fazer das tripas coração". Mas a minha tristeza privada não é, neste frio Outono, totalmente diversa da angústia coletiva em que muitas famílias se vão arrastando.
Há um cheiro a morte, a suicídio e a atentado contra a vida no ar de Portugal. Ainda esta semana surgiu a notícia de que poderá haver novos cortes nas pensões – incluindo as mais baixas – e nos salários. Anuncia-se, igualmente, a retração do serviço nacional de saúde e o ensino está a deixar de ser tendencialmente gratuito, contra o que prescreve a Constituição.
Pelos rostos das pessoas perpassa o pessimismo. Os responsáveis políticos não desenham quaisquer perspetivas de solução para as nossas vidas e para a crise generalizada em que o país mergulhou. A "grande" discussão política parece centrar-se na escolha do tipo de definhamento do Estado social com o qual os cidadãos melhor se podem conformar.
Devem ser sacrificadas as pessoas mais idosas ou mais jovens? Devem ser preteridos os aposentados ou os desempregados? Vamos regressar à esperança de vida ou aos níveis de analfabetismo de há quarenta anos? É preferível sobrecarregar com sacrifícios os funcionários ou atingir todos os trabalhadores? Tudo se passa como se não houvesse alternativa.
Em ‘Felizmente há Luar’, Sttau Monteiro baseou-se numa situação ocorrida em 1817, que compreendeu uma tentativa de revolta liberal e o posterior enforcamento de Gomes Freire de Andrade. O luar permitiria, segundo D. Miguel, que melhor se visse a punição dos revoltosos. Mas para Matilde, personagem feminina, o luar simbolizava o triunfo sobre a opressão.
Escrita em 1961, esta peça de Sttau Monteiro só pôde ser encenada em Portugal depois da revolução, porque o antigo regime a compreendeu, corretamente, como uma denúncia da ditadura. Com efeito, a peça foi concebida como um hino de esperança na libertação de uma sociedade oprimida. O luar que felizmente havia era, contra tudo, o garante dessa esperança.
O sol é o que nos resta, apelando à força de existir e de lutar por um futuro justo e solidário. E por um futuro realmente nosso, que não seja determinado pelo interesse dos que estão a ganhar dinheiro à custa das nossas dificuldades. O sol é também a luz da racionalidade que nos mostra que este caminho é sombrio. Felizmente ainda há sol em Portugal!

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