sexta-feira, 6 de julho de 2012

Casa da Supplicação

Recurso - admissibilidade de recurso – sentença - acórdão do tribunal coletivo - concurso de infrações - penas parcelares - pena única - competência do STJ - competência da Relação

I - Nos termos da alínea c) do art. 432.º actualmente vigente, recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça «de acórdãos finais proferidos pelo tribunal de júri ou pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito
II - No caso dos autos, os recursos dizem respeito a uma decisão do tribunal colectivo, que aplicou aos arguidos penas singulares inferiores a cinco anos de prisão. Ora, os arguidos põem em causa no recurso, como se viu, tais penas singulares e não somente a pena única.
III - Mesmo que se leve em conta que a pena aplicada tanto é a relativa à pena singular, como à pena conjunta, dentro da perspectiva de restrição drástica dos recursos para o STJ, como objectivo visado pelas alterações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, só serão passíveis de tal recurso as decisões do tribunal colectivo ou de júri que isoladamente tenham aplicado por um crime pena superior a 5 anos ou que, num concurso de crimes, tenham aplicado uma pena única superior àquele limite, ainda que as penas parcelares aplicadas sejam iguais ou inferiores a 5 anos. Neste caso, porém, o recurso será restrito à medida da pena única, a menos que alguma das penas parcelares seja também superior a 5 anos, caso em que o recurso abrange essas penas parcelares e a pena.
IV - Na verdade, seria um contra-senso, na perspectiva da reforma introduzida, visando a restrição do recurso para o Supremo Tribunal, que o legislador, ao falar de pena aplicada em concreto, em vez de pena aplicável em abstracto, pretendesse levar o STJ a conhecer de todos os crimes que formam um concurso de infracções, mesmo que tais crimes correspondam àquela noção que normalmente se designa de criminalidade bagatelar ou a que tenha sido aplicada uma pena de gravidade não superior a determinado limite, a que, em geral, se associa a pequena e média criminalidade.
V - Sendo assim, como, no caso sub judice, se põem em causa as penas parcelares e não só a pena única, tem de seguir-se a regra geral, segundo a qual «exceptuados os casos em que há recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça, o recurso da decisão proferida por tribunal de 1.ª instância interpõe-se para a relação».
Ac. do STJ de 5 de julho de 2012, Proc. n.º 61/11.7JAPRT.S1, Relator, por vencimento: Conselheiro Rodrigues da Costa, Juiz Adjunto: Conselheiro Santos Carvalho, Presidente da Secção, com voto de desempate: Conselheiro Carmona da Mota
Voto vencido (sumário)
I - Se o critério é o da gravidade da pena “aplicada”, parece lógico concluir que, o que verdadeiramente assume importância, no caso de concurso de infrações, é a pena que o arguido terá de cumprir, pois que as penas parcelares se diluem e perdem a autonomia própria de “pena aplicada”, no sentido em que, mesmo que o recorrente só ponha em causa determinada pena parcelar, o seu objetivo final é o de alterar a pena única, ou para uma pena única mais grave (recurso da acusação) ou para uma pena única menos grave (recurso da defesa).
II - No domínio da lei anterior, a jurisprudência maioritária que se formou no STJ era a de que o legislador se referia à pena aplicável a cada uma das infrações em concurso, pois que era esse o melhor entendimento da expressão “mesmo em caso de concurso de infracções” que se encontrava no art.º 400.º do CPP.
III - Ora, o facto de agora o legislador se referir sempre à pena aplicada e de ter retirado menção expressa aos casos de concurso de infrações, em qualquer das normas que respeitam à competência para os recursos, só pode significar que o que assume importância, na visão atual, para efeito de recorribilidade, é a pena que o arguido tem efetivamente de cumprir.
IV - Acresce que o legislador tomou posição idêntica quanto à competência funcional do tribunal coletivo (art.º 14.º, n.º 2, al. b, do CPP), pois que se cingiu à pena única e não às penas parcelares, como de resto já era jurisprudência pacífica. E o mesmo sucede com a elevação do prazo da prisão preventiva (art.º 215.º, n.º 6) ou com os pressupostos da liberdade condicional (art.ºs 61.º e seguintes do CP), onde o que se tem em vista é a pena a cumprir e não as penas parcelares que tenham sido “aplicadas”.
V - Em suma, o recurso de acórdão proferido na 1ª instância que tenha aplicado, em caso de concurso de infrações, uma pena única superior a 5 anos de prisão e que se destine ao reexame de questões exclusivamente de direito, é sempre dirigido ao STJ, por força do disposto no art.º 432.º, n.º 1, al. c), do CPP, independentemente de tais questões dizerem respeito a crimes cujas penas parcelares tenham sido fixadas em medida igual ou inferior àquela.  

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