quinta-feira, 5 de abril de 2012

Uma ou mais polícias?


Segunda opinião
O sistema de investigação criminal é, seguramente, um dos sistemas mais complexos do Estado português.
05 Abril 2012
Por: Rui Pereira, Professor Universitário
Abarca mais de vinte órgãos de polícia criminal – de competência reservada (PJ), genérica (GNR, PSP e PJ) e específica (SEF, ASAE, PJM e DGF, entre outros). Tais órgãos de polícia criminal têm, em vários casos, competências sobrepostas, integram-se em diferentes ministérios e estão sujeitos a uma dupla tutela: subordinam-se funcionalmente a uma autoridade judiciária, que, consoante a fase do processo, pode ser o MP ou o juiz de instrução.
Este estado de coisas resulta de vários factores, endógenos e exógenos. O surgimento da criminalidade de massa contra o património a partir da década de 80 e a sua transformação em criminalidade de massa violenta na transição para o novo século exigem um corpo de investigadores muito mais vasto do que o possuído pelo Portugal rural e fechado de antes do 25 de Abril. Os órgãos de polícia criminal foram, assim, crescendo de forma casuística e, tal como os seres vivos, não estão dispostos a aceitar a extinção, fusão ou perda de competências.
Porém, independentemente das discussões sobre o futuro, há práticas que é necessário observar no dia-a-dia: em primeiro lugar, polícias e magistrados têm de respeitar a lei vigente, mesmo que discordem do regime; em segundo lugar, devem pôr acima de quaisquer interesses particulares o interesse público – que se identifica, aqui, com o êxito da prevenção e da investigação criminal; em terceiro lugar, cabe-lhes criar um clima de cooperação leal, nunca esquecendo que é sempre o crime (e nunca os seus colegas de ofício) que têm a obrigação de combater.
O sistema actual coloca enormes dificuldades, que vão da dispersão da informação à fragmentação de competências num momento em que não está definido o crime que é objecto do processo (início do inquérito). O princípio da legalidade, que manda abrir um processo por cada crime "perseguível" (apesar das inevitáveis "cifras negras"), obriga ao aproveitamento de todos os recursos, seja numa polícia, em várias polícias ou num corpo único de investigadores. Todas as soluções têm vantagens e inconvenientes. A sua discussão exige boa-fé e serenidade.

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