sábado, 1 de abril de 2006

PRIORIDADES DE POLÍTICA CRIMINAL E AUTONOMIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O debate sobre a “Lei-Quadro da Política Criminal” organizado pela República do Direito na passada 4ª feira em Coimbra foi ontem noticiado pela imprensa diária. E fiquei admirado de, na sequência da citação destas declarações do Procurador-Geral da República - "É com alguma estranheza que se vê intervir o Parlamento. Será que vai ser chamado a intervir na definição da política agrícola, ou da saúde, ou dos transportes? Por que não circunscrever a definição das prioridades de política criminal ao próprio Governo?», nenhuma referência ter lido à posição pelo mesmo assumida favorável ao restabelecimento de algo que foi eliminado após a Revisão Constitucional de 1989: a possibilidade de o Governo transmitir ao Procurador-Geral da República instruções, no caso sobre eventuais prioridades de política criminal.
Vale a pena, por isso, recuar a 1989.
A 2ª Revisão Constitucional consagrou a autonomia do Ministério Público que, até aí, apenas constava da respectiva Lei Orgânica, tendo tido como consequência, no que agora interessa, a eliminação, em 1992, da possibilidade de o Ministro da Justiça “dar ao procurador-geral da República instruções de ordem genérica no âmbito das atribuições do Ministério Público”.
Após a Revisão Constitucional de 1997, cujo preceito sobre as “funções e estatuto do Ministério Público” passou a dizer que este “participa na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania”, houve quem tivesse querido reintroduzir, agora no Estatuto do Ministério Público, o poder de o Ministro da Justiça transmitir orientações ao PGR, “no âmbito da participação do Ministério Público na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania” (sic). Mas esta proposta foi rejeitada na Assembleia da República exactamente porque violava a autonomia desta magistratura, consagrada constitucionalmente.
Igualmente inconstitucional seria a sua reintrodução hoje!

1 comentário:

Kamikaze (L.P.) disse...

Agradeço ao Rui o nao ter deixado passar "ao lado" estas afirmaçoes do PGR. Susceptiveis que sao de levantar enorme celeuma,avento duas hipoteses para o silencio que se fez a sua volta:

- quanto aos da comunicaçao social, mais preocupada com sound bytes do que com questoes realmente estruturantes, nem se devem ter apercebido do potencial noticioso que as declaraçoes continham;

- quanto aos bloggers que costumam fazer o papel de bombeiros voluntarios apagadores dos fogos ateados por Souto Moura, mormente os que sao MP, presumo (e por mim falo) que de tao cansados de ter de sair a terreiro, a toda a hora, devem ter preferido o silencio, a ver se desta vez "a coisa" passava despercebida e caia no esquecimento. E que as vezes ja nao ha pachorra!!!