São 29 os
deputados que concorrem às eleições autárquicas. Um movimento de cidadãos
mobiliza-se para os impedir
Movimento quer
travar candidaturas de deputados às autarquias
São 29 os
parlamentares que se candidatam a diversos cargos autárquicos. Movimento Manda
Quem Paga quer levar a questão aos tribunais, por entender que os mandatos
devem ser cumpridos até ao fim
Nuno Sá Lourenço
Depois dos
dinossauros autárquicos, parece ter chegado a vez dos deputados que se
candidatam às autárquicas. Um movimento cívico solicitou à Assembleia da
República a lista de deputados que se candidatam a cargos autárquicos.
O objectivo é
travar nos tribunais a possibilidade de candidaturas a órgãos autárquicos de
deputados em exercício de funções. Para tal solicitaram já, na sexta-feira, à
Assembleia da República “o acesso a todos os nomes dos deputados que pediram
suspensão de mandato para efeitos de candidatura às Eleições Autárquicas de
2013″. Para depois avançar com uma “acção popular individual, intentando anular
a suspensão de mandatos, requerida pelos deputados candidatos a Eleições
Autárquicas”. A Assembleia da República respondeu ao pedido confirmando que,
“até à data, nenhum senhor deputado requereu a suspensão do mandato para os
efeitos referidos”.
Pelas contas
feitas pelo PÚBLICO, há 29 deputados que se candidatam a diversos cargos
autárquicos, representando 12% dos 230 deputados actualmente em funções.
A iniciativa é da
autoria do Movimento Manda Quem Paga – Partido dos Contribuintes (MMP), que
surgiu nos últimos dois anos no caldo de contestação da sociedade civil. Pedro
Ladeira – que fez parte da comissão política do extinto partido Movimento
Mérito e Sociedade (MMS) – é um dos seus dirigentes e o responsável pela
iniciativa.
Questionado sobre
os motivos da acção, Ladeira justificou-a com o princípio de que “qualquer
cargo de um órgão de soberania deve ser desempenhado em regime de exclusividade
e cumprimento integral do mandato representativo nacional sufragado em
eleições, quer seja pela sua exigência quer seja pela sua responsabilidade”.
Ou seja, no entendimento
do MMP as candidaturas colocavam em causa o “normal funcionamento das
instituições”, uma vez que uma percentagem dos deputados se estaria a
concentrar numa campanha eleitoral em vez de na sua actividade parlamentar. “Um
deputado tem de respeitar o mandato para o qual foi sufragado”, resume Ladeira.
Pedro Ladeira tenciona levar o assunto aos tribunais. “Temos de acreditar que
os tribunais exerçam o seu papel de primeiro pilar da democracia, determinando
a nulidade das candidaturas.”
O PÚBLICO questionou
alguns dos deputados que são candidatos. José Junqueiro, deputado socialista
candidato em Viseu, começa por esclarecer que se mantém em funções na
Assembleia da República. “Eu estou no exercício pleno das minhas funções”,
assevera Junqueiro, antes de acrescentar que “o trabalho parlamentar não é só
feito na Assembleia da República”: “Também se faz no terreno, que é, aliás, uma
fonte de informação permanente.” E deixa um reparo aos membros do movimento:
“Antes de criticarem têm de trabalhar 18 horas por dia, como eu faço.”
Também Hélder
Amaral reage de forma assertiva ao que classifica de “moral de fim-de-semana”.
Confirmando não ter suspendido a sua actividade parlamentar, desafia o
movimento a “descobrir uma falta minha a uma reunião de comissão ou de
plenário”. E frisa não estar a cometer qualquer ilegalidade. “Gostava que me
dissessem qual é a lei que eu estou a infringir”, diz antes de devolver as
críticas aos seus autores. “Gostava de saber se as pessoas que fazem parte
desse movimento, no exercício da sua actividade cívica, também suspendem a sua
actividade profissional”, acrescenta. E, de seguida, lança um repto. “Eu estou
disponível para responder a todas as perguntas desse movimento, mas quero saber
quem são, o que fazem e qual é sua declaração de rendimentos. É que, enquanto
dirigente partidário e deputado, a minha declaração de rendimentos é pública…”
A questão
levantada pelo movimento gera reacções divergentes. Mesmo entre os que estudam
a actividade política. O politólogo António Costa Pinto, investigador no
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e professor convidado
no ISCTE, Lisboa, considera a crítica implícita à conduta dos deputados
“bastante exagerada”: “O envolvimento de um deputado na acção política é uma
actividade perfeitamente legítima” quando vista à luz do sistema político
português. Costa Pinto lembra ainda que em Portugal “o cargo de presidente da
câmara é incompatível com o de deputado”. “O que não acontece em outras
democracias, como a francesa”, acrescenta.
André Freire, do
Centro de Estudos e Investigação de Sociologia, do Instituto Universitário de
Lisboa, concede que a “crítica tem sentido”, embora sem considerar a situação
particularmente grave. Lembra não ser de agora o reconhecimento dos partidos da
necessidade de um maior esforço no sentido de fazer a “aproximação entre
eleitos e eleitores”, tendo mesmo assumido a necessidade de uma reforma do
sistema que tendesse para uma maior ligação com o eleitor.
“Nesse sentido,
[um deputado estar disponível para suspender e renunciar ao seu mandato para
concorrer a outro cargo] vai contra essa ideia de personalização do mandato de
deputado.” E Freire também reconhece que não ajuda à imagem dos parlamentares a
suspensão para concorrer. “Quer dizer que se as coisas correrem mal, eles podem
sempre voltar”, afirma. “Para isso mais valia renunciarem. Mas o ideal seria
mesmo que os deputados cumprissem o seu mandato.”
Público, 12 Agosto 2013
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