quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

ADSE e (má) ideologia

João Cardoso Rosas 

Professor Universitário 

Como se tem visto nos últimos dias, encontramos adversários da ADSE tanto no PSD e no CDS como no PS e no BE. Qual a razão para este facto? A divisão será apenas em torno de argumentos técnicos e, daí, a sua transversalidade? Nada mais falso. Vejamos porquê. 

Os argumentos pelos quais parte da esquerda está contra a ADSE não são de todo os mesmos argumentos que invocam os seus opositores à direita. Mas, em ambos os casos, eles são marcadamente ideológicos. O argumento básico da esquerda é claro e inscreve-se numa tradição conhecida: a ADSE faz com que os funcionários públicos recorram à medicina privada e, desta forma, transfere recursos do Estado para os privados. Para esta esquerda, todos os trabalhadores devem estar no mesmo sistema de saúde, estatal e universal. Por seu turno, o argumento da direita é o seguinte: os funcionários públicos têm privilégios injustificados e a ADSE é um deles. O Estado não deve pagar um sistema de Saúde especial para os seus servidores à custa dos contribuintes. 

Tanto os argumentos da esquerda como os da direita são baseados em preconceitos. No primeiro caso, trata-se do preconceito contra o sector privado. Se, como acontece realmente, os prestadores privados praticam preços melhores para o Estado, por que razão deve ele optar neste caso por prestadores públicos? Se uma consulta de medicina geral num privado custa à ADSE muito menos do que custaria no Serviço Nacional de Saúde, por que razão deve essa consulta ser estatizada? O problema é que parte da esquerda confunde justiça social com estatização e uniformização e quer, a todo o custo, acabar com subsistemas de saúde que perturbam essa lógica. 

Os argumentos da direita não são melhores. A ADSE não é grátis para os seus funcionários. Eles pagam todos os meses, em muitos casos mais do que pagariam por um seguro privado. Além disso, se muitas empresas privadas providenciam seguros de saúde para os seus empregados parece-me igualmente justificado que o Estado contribua para um seguro público dos seus servidores. Aliás, se o Estado não garantir a saúde dos funcionários por intermédio da ADSE acabará por fazê-lo através do SNS.

A verdade é esta: se a ADSE fosse extinta é bem provável que a despesa do Estado aumentasse. Com efeito, os recursos que seria necessário mobilizar para atender no SNS os 1.300.000 beneficiários desse sistema seriam provavelmente superiores à transferência orçamental para a ADSE, não só devido aos custos elevados do sistema público mas também porque os funcionários do Estado fazem co-pagamentos substanciais quando recorrem a privados. Além disso, a ADSE pode ser reformada para aumentar a sua sustentabilidade diminuindo algumas comparticipações e aumentando as contribuições.

Diário Económico - 23.01.2013

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