segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Juízes das Leis


Juízes das Leis
De tempos a tempos, surge um ataque ao Tribunal Constitucional que põe em causa a sua própria existência no actual modelo. Porém, resta apurar se há bons argumentos a favor de uma alteração, que implicaria sempre uma revisão constitucional. A defesa da Constituição – que é, afinal, a razão de ser daquele Tribunal – sairia reforçada com a sua extinção?
Um argumento que costuma ser invocado a favor da extinção do Tribunal Constitucional diz respeito à morosidade processual. No entanto, este Tribunal tem apreciado os processos com assinalável celeridade, não sendo responsável por atrasos significativos. Nos últimos anos, não se conhecem casos de prescrição que lhe possam ser imputados.
Aliás, a Lei do Tribunal Constitucional atribui ao juiz relator o poder de indeferir liminarmente os recursos, através de despacho, se concluir que são manifestamente infundados ou dizem respeito a questões que já foram apreciadas (artigo 78º-A). Este regime tem evitado que o Tribunal se ocupe de muitas questões artificiais, suscitadas com intuito dilatório.
Outro argumento, mais complexo, indica que o Tribunal Constitucional conduz à politização da Justiça, visto que os juízes são designados por iniciativa e acordo dos partidos. Na verdade, a Assembleia da República elege dez juízes (que cooptam mais três), através de uma maioria qualificada de dois terços. Pelo menos seis dos designados são juízes de carreira.
Mas todos os juízes são designados para um mandato não renovável de nove anos, não dependendo de quem os escolheu. São inamovíveis, não decidem de acordo com os interesses do partido político que os propôs e, na maioria dos casos, aprovam as decisões por unanimidade. A reconhecida qualidade jurídica dos acórdãos ajuda a rebater a crítica de politização.
Por outro lado, a História revela que só um tribunal autónomo e especializado pode apreciar a constitucionalidade das leis, fiscalizando quem as aprova e quem as aplica. Antes de 1974, só há memória de uma decisão (do juiz Ricardo da Velha) ter recusado a aplicação de uma norma julgada inconstitucional, por contrariar a inviolabilidade do domicílio.
Por fim, importa sublinhar que o Tribunal Constitucional goza de prestígio internacional. Faz parte de organizações que juntam tribunais de países europeus, ibero-americanos e de língua portuguesa e a sua jurisprudência é estudada em universidades nacionais e estrangeiras. Só por incompreensível autofagia poderíamos pôr em causa este capital de prestígio.
Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
Correio da Manhã 2011-11-13

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