quinta-feira, 14 de julho de 2011

Litigância fiscal e arbitragem

Litígios com fisco no tribunal arbitral

Contribuintes e fisco já podem litigar fora dos tribunais comuns em causas inferiores a 10 milhões de euros.
Os conflitos com o fisco, com o valor máximo de dez milhões de euros, podem agora ser resolvidos em tribunais arbitrais. A medida está em vigor desde 1 de Julho e o nome dos 92 “juizes” já foi divulgado pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), sendo a lista dominada por nomes ligados às maiores sociedades de advogados (texto em baixo). As custas de um processo, por esta via, podem oscilar entre 306 euros e os 120 mil euros. Mas, se essa for a escolha do contribuinte, a administração fiscal não pode recusar.
O novo regime de arbitragem tributária é aplicável nas situações em que o contribuinte discorda das decisões das Finanças, como, por exemplo, do valor que lhe foi cobrado de imposto sobre o rendimento, ou do valor que lhe foi atribuído à habitação para efeitos de imposto, ou do valor descontado mensalmente do ordenado.
É a primeira vez que, nesta matéria, os cidadãos podem escolher entre os tribunais tributários tradicionais e a via da jurisdição arbitrai. E estando em conflito valores inferiores a dez milhões de euros, a administração fiscal não pode se recusar a esta alternativa.
Este novo paradigma da justiça tributária está aberto tanto para os novos processos como para processos pendentes há mais de dois anos nos tribunais judiciais tributários de primeira instância. “Até 20 de Janeiro de 2012, os contribuintes podem fazer deslocar estes processos para os tribunais arbitrais com dispensa do pagamento de custas nos tribunais judiciais tributários”, explicou ao DN Nuno de Villa-Lobos, director do CAAD, entidade que promove e administra este novo regime. Os processos pendentes há menos de dois anos podem também ser transferidos para a via arbitrai. Mas, para isso, o contribuinte terá de solicitar ao juiz a alteração da causa de pedir podendo ser deferida se a administração fiscal não se opuser.
Para recorrer à via arbitral, o contribuinte em litígio com o fisco tem de informar o CAAD. Esta entidade escolhe depois o árbitro ou árbitros ou, se for esse o caso, solicita ao contribuinte e às Finanças que indiquem os seus árbitros.
Os litígios até 60 mil euros podem ter um só árbitro, oscilando as custas entre os 306 euros, no mínimo, e os cerca de cinco mil euros, no máximo, dependendo do valor da causa. Nos processos acima do 60 mil euros é obrigatória a presença de três árbitros, oscilando as custas entre os 12 mil euros, no mínimo, e os 120 mil, no máximo. Mas, se o litigante, nos processos inferiores a 60 mil euros, optar por escolher o árbitro, então o CAAD tem de indicar mais dois. Neste caso, as custas são acrescidas, passando a ter o mesmo valor dos processos acima dos 60 mil euros. Ou seja, quando a designação do árbitro é da iniciativa do Centro, os valores são substancialmente inferiores àqueles em que a designação do árbitro é feita pelo sujeito passivo.
O tribunal arbitral decide no prazo de seis meses. Se, no final, ainda não tiver chegado a uma decisão, este pode ser prolongado por, no máximo, mais seis meses. As decisões são recorríveis para o Supremo Tribunal Administrativo. O novo regime de arbitragem tributária é também uma resposta às imposições da troika. O acordo prevê que até 2013 Portugal acabe de vez com todos os processos pendentes nos tribunais.
Advogados dominam lista de ‘juizes’ da arbitragem tributária
As maiores sociedades de advogados têm sócios na lista de árbitros que vão julgar os litígios entre os contribuintes e o fisco
As grandes sociedade de advogados dominam a lista dos “juizes” que vão arbitrar conflitos entre os contribuintes e a administração fiscal. Os 92 nomes foram divulgados pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), entidade que administra e promove o novo regime de arbitragem tributária.
A PLMJ, de que é sócio fundador José Miguel Júdice, é uma grandes sociedades presentes na lista, com três nomes. Do núcleo restrito das firmas de advocacia mais dimensionadas foram também seleccionados quatro juristas da Morais Leitão Galvão Teles Soares da Silva & associados, entre os quais se encontra António Lobo Xavier. AAbreu Advogados e a Vieira de Almeida & associados têm na lista cada qual dois advogados.
Entre as maiores há também “juizes” do escritório de Pedro Rebelo de Sousa; da Miranda Correia Amendoeira & associados – no caso o fiscalista Samuel Mendes de Almeida; e da ABBC, através do sócio António Moura Portugal. No conjunto, as grandes sociedades de advocacia colocam 14 profissionais na lista de árbitros, entre um grupo maioritário de 33 advogados. A lista inclui ainda 12 juristas que têm a docência universitária como ocupação principal, assim como 11 juizes conselheiros jubilados.
À lista aderiram também quatro ex-secretários de Estado dos Assuntos Fiscais. São eles António Carlos dos Santos (esteve no primeiro Governo de António Guterres), Carlos Lobo (com José Sócrates), Rogério M. Fernandes Ferreira (presente no segundo Governo de Guterres) e Vasco Valdez (num dos Executivos de Cavaco Silva). O honorários auferidos por cada um destes árbitros é proporcional ao valor da causa de cada processo. Assim, num processo com custas a rondar os 120 mil euros aplicável aos litígios de valor entre os 600 mil e os dez milhões de euros – a verba será dividida pelos três árbitros, depois de descontada uma pequena percentagem para custos administrativos a cargo do CAAD.
Segundo Nuno de Villa-Lobos, presidente do CADD, “o valor a pagar pelo contribuinte na arbitragem tributária é absolutamente igual ao valor a pagar nos tribunais tributários”. Conforme explicou ao DN, ” o valor a pagar apenas será superior quando o contribuinte pretenda utilizar a prerrogativa de designar um dos árbitros do colectivo de três”.
3 PERGUNTAS A…
“Sentenças públicas e em seis meses”
- Estamos perante um novo paradigma da justiça tributária?
- Pretende-se que a arbitragem tributária venha melhorar a capacidade de resposta do Sistema de Justiça Fiscal, nomeadamente no que diz respeito ao grave problema da morosidade processual.
- O que beneficia o cidadão?
- Credibilidade, independência, publicidade, especialidade e acessibilidade são os aspectos positivos deste novo regime que cumpre em primeiro lugar realçar. Como resulta da lei, as decisões finais serão públicas e proferidas em regra no prazo de seis meses. Alista de árbitros contém profissionais de elevada qualidade e abarca magistrados, académicos, pessoas com serviço prestado na administração fiscal, advocacia, consultadoria, pessoas da área da economia e gestão. É portanto uma lista muito credível e especializada.
- Quem nomeia os árbitros?
- Os árbitros são designados pelo Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

Diário de Notícias, 14 de Julho de 2011

LICÍNIO LIMA

Sem comentários: