Concurso de infracções - Pena única - Proporcionalidade - Fundamentação - Cúmulos anteriores
1 – Se num acórdão que procedeu a um cúmulo jurídico, além de se fixarem os factos provados respeitantes aos crimes em concurso com uma minúcia maior do que habitual, se estabelece com algum detalhe as regras a que deve obedecer, em geral, o pena do cúmulo, correspondente ao concurso de infracções, se determinam os limites da moldura penal abstracta em que se vai mover, se aprecia a ilicitude global, na sua gravidade, a partir do número de crimes cometidos, relacionando-a com a personalidade do agente com ponderação da persistência da conduta durante 2 anos, concluindo por sensíveis necessidades de prevenção geral e especial, não se pode dizer que o mesmo se ficou pelo emprego de fórmulas tabelares ou conclusivas, antes cumpriu o dever de fundamentação
2 – O limite máximo da moldura penal abstracta não é o limite máximo absoluta da pena concreta: 25 anos, mas a soma material das penas aplicadas aos crimes em concurso
3 – O princípio da proporcionalidade ínsito no art. 18.º da Constituição deve ser reportado à moldura penal abstracta de cada crime, contendendo a a pena única concreta com o princípio da culpa e com o princípio da justiça.
4 – Importa então atender à soma das penas parcelares que integram o concurso, atento o princípio de cumulação a fonte essencial de inspiração do cúmulo jurídico sem esquecer, no entanto, que o nosso sistema é um sistema de pena unitária em que o limite mínimo da moldura atendível é constituído pela mais grave das penas parcelares (numa concessão minimalista ao princípio da exasperação ou agravação – a punição do concurso correrá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade de crimes), sem que possa ultrapassar a soma das penas concretamente que seriam de aplicar aos crimes singulares.
5 – Se anteriormente foram efectuados cúmulos anteriores cúmulos, deve atender-se às respectivas penas únicas conjuntas, apesar de tais cúmulos serem desfeitos, retomando todas as penas parcelares a sua autonomia. Assim, nada na lei impede que a pena única conjunta a encontrar possa ser inferior a uma outra pena idêntica anteriormente fixada para parte das penas parcelares, embora esse resultado se apresente como uma antinomia do sistema, uma vez que tendo a anterior pena única conjunta transitado em julgado e começado a ser executada, se vê assim reduzida, aquando da consideração de mais pena(s). Aceitar-se-á que assim possa ser em casos contados e especialmente justificados em que o conhecimento de mais infracções pelo agente constituirá o elo perdido entre condutas permitindo estabelecer uma clara e franca pluriocasionalidade.
AcSTJ de 6.11.2008, proc. n.º 2843/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
1 – Se num acórdão que procedeu a um cúmulo jurídico, além de se fixarem os factos provados respeitantes aos crimes em concurso com uma minúcia maior do que habitual, se estabelece com algum detalhe as regras a que deve obedecer, em geral, o pena do cúmulo, correspondente ao concurso de infracções, se determinam os limites da moldura penal abstracta em que se vai mover, se aprecia a ilicitude global, na sua gravidade, a partir do número de crimes cometidos, relacionando-a com a personalidade do agente com ponderação da persistência da conduta durante 2 anos, concluindo por sensíveis necessidades de prevenção geral e especial, não se pode dizer que o mesmo se ficou pelo emprego de fórmulas tabelares ou conclusivas, antes cumpriu o dever de fundamentação
2 – O limite máximo da moldura penal abstracta não é o limite máximo absoluta da pena concreta: 25 anos, mas a soma material das penas aplicadas aos crimes em concurso
3 – O princípio da proporcionalidade ínsito no art. 18.º da Constituição deve ser reportado à moldura penal abstracta de cada crime, contendendo a a pena única concreta com o princípio da culpa e com o princípio da justiça.
4 – Importa então atender à soma das penas parcelares que integram o concurso, atento o princípio de cumulação a fonte essencial de inspiração do cúmulo jurídico sem esquecer, no entanto, que o nosso sistema é um sistema de pena unitária em que o limite mínimo da moldura atendível é constituído pela mais grave das penas parcelares (numa concessão minimalista ao princípio da exasperação ou agravação – a punição do concurso correrá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade de crimes), sem que possa ultrapassar a soma das penas concretamente que seriam de aplicar aos crimes singulares.
5 – Se anteriormente foram efectuados cúmulos anteriores cúmulos, deve atender-se às respectivas penas únicas conjuntas, apesar de tais cúmulos serem desfeitos, retomando todas as penas parcelares a sua autonomia. Assim, nada na lei impede que a pena única conjunta a encontrar possa ser inferior a uma outra pena idêntica anteriormente fixada para parte das penas parcelares, embora esse resultado se apresente como uma antinomia do sistema, uma vez que tendo a anterior pena única conjunta transitado em julgado e começado a ser executada, se vê assim reduzida, aquando da consideração de mais pena(s). Aceitar-se-á que assim possa ser em casos contados e especialmente justificados em que o conhecimento de mais infracções pelo agente constituirá o elo perdido entre condutas permitindo estabelecer uma clara e franca pluriocasionalidade.
AcSTJ de 6.11.2008, proc. n.º 2843/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
*
Recurso de revisão - natureza - fundamentos - novas provas - novos factos
1 – Nenhuma legislação moderna adoptou o caso julgado como dogma absoluto face à injustiça patente, nem a revisão incondicional de toda a sentença frente ao caso julgado e entre nós foi escolhida uma solução de compromisso entre o interesse de dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, e que se traduz na possibilidade limitada de revisão das sentenças penais, tendo presente que se a segurança é um dos fins do processo penal, não é seguramente o único e nem sequer o prevalente, que se encontra antes na justiça.
2 – São fundamentos da revisão os seguintes: (i) — Falsidade dos meios de prova: falsidade reconhecidos por sentença transitada, de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão a rever [art. 449.º, n.º 1, al. a)]; (ii) — Sentença injusta: crime cometido por juiz ou jurado, reconhecido em sentença transitada relacionado com o exercício de funções no processo [art. 449.º, n.º 1, al. b)]; (iii) — Inconciabilidade de decisões: entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. c)]; (iv) — Descoberta de novos factos ou meios de prova, confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. d)]. (v) — Descoberta de que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do art. 126.º [art. 449.º, n.º 1, al. e)]; (vi) — Declaração, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação [art. 449.º, n.º 1, al. f)]; (vii) — Prolação, por uma instância internacional, de sentença vinculativa do Estado Português, inconciliável com a condenação ou que suscite graves dúvidas sobre a sua justiça [art. 449.º, n.º 1, al. g)].
3 – O STJ decidiu recentemente que embora a generalidade da doutrina e alguma jurisprudência admitam a revisão mesmo quando os factos, sendo novos para o tribunal, eram já conhecidos do recorrente ao tempo do julgamento, não deve este entendimento ser seguido, pois assentando, como se viu, em que o recurso de revisão, um remédio excepcional contra decisões transitadas, constitui um compromisso entre os valores da estabilidade e segurança jurídicas, sem os quais nenhum sistema jurídico subsiste, e a salvaguarda da justiça do caso, em ordem a fazer ceder aqueles, mas apenas pontualmente (nos casos taxativamente indicados) e havendo razões muito sérias, perante as exigências da segunda.
4 – Quando fundada na descoberta de factos novos, é enfatiza a excepcionalidade do recurso de duas formas: primeiro, restringindo-o à hipótese de os novos factos suscitarem graves dúvidas (não apenas quaisquer “dúvidas”) sobre a justiça da condenação (al. d) do n.º 1 do art. 449.º); depois, limitando a amplitude de produção de prova, rejeitando a admissibilidade de audição de testemunhas que não tenham já sido ouvidas no processo, a não ser que o requerente venha justificar que ignorava a sua existência ou que elas estavam impossibilitadas de depor (n.º 2 do art. 453.º).
5 – Ora, se o requerente só pode indicar testemunhas novas nessas situações é porque os factos novos, para efeitos de revisão, têm de ser novos também para ele: novos porque os ignorava de todo, ou porque estava impossibilitado de fazer prova sobre eles.
6 – Esta interpretação a fazer do n.º 2 do art. 453.º, pois seria incontestavelmente contraditório que o legislador admitisse a revisão com fundamento em factos já conhecidos pelo recorrente e simultaneamente o privasse de fazer prova dos mesmos, ou lhe dificultasse notoriamente essa prova, impedindo-o de apresentar testemunhas novas. E a que se harmoniza com o carácter excepcional do recurso de revisão, que não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa ou estratégias de defesa incompatíveis com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais.
8 – Se o arguido se “esquece” de apresentar certos meios de prova em julgamento ou os negligencia, ou se por qualquer outra razão opta por ocultá-los, no prosseguimento de uma certa estratégia de defesa, escamoteando-os ao tribunal, caso venha a sofrer uma condenação, não deve obviamente ser compensado com o “prémio” de um recurso excepcional, que se destinaria afinal a suprir deficiências, voluntárias ou involuntárias, da sua defesa em julgamento, sendo de ter por inadmissível o recurso de revisão interposto ao abrigo da al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP quando os factos novos alegados sejam já do conhecimento do requerente ao tempo do julgamento.
AcSTJ de 20.11.2008, proc. n.º 3543/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
1 – Nenhuma legislação moderna adoptou o caso julgado como dogma absoluto face à injustiça patente, nem a revisão incondicional de toda a sentença frente ao caso julgado e entre nós foi escolhida uma solução de compromisso entre o interesse de dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, e que se traduz na possibilidade limitada de revisão das sentenças penais, tendo presente que se a segurança é um dos fins do processo penal, não é seguramente o único e nem sequer o prevalente, que se encontra antes na justiça.
2 – São fundamentos da revisão os seguintes: (i) — Falsidade dos meios de prova: falsidade reconhecidos por sentença transitada, de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão a rever [art. 449.º, n.º 1, al. a)]; (ii) — Sentença injusta: crime cometido por juiz ou jurado, reconhecido em sentença transitada relacionado com o exercício de funções no processo [art. 449.º, n.º 1, al. b)]; (iii) — Inconciabilidade de decisões: entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. c)]; (iv) — Descoberta de novos factos ou meios de prova, confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. d)]. (v) — Descoberta de que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do art. 126.º [art. 449.º, n.º 1, al. e)]; (vi) — Declaração, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação [art. 449.º, n.º 1, al. f)]; (vii) — Prolação, por uma instância internacional, de sentença vinculativa do Estado Português, inconciliável com a condenação ou que suscite graves dúvidas sobre a sua justiça [art. 449.º, n.º 1, al. g)].
3 – O STJ decidiu recentemente que embora a generalidade da doutrina e alguma jurisprudência admitam a revisão mesmo quando os factos, sendo novos para o tribunal, eram já conhecidos do recorrente ao tempo do julgamento, não deve este entendimento ser seguido, pois assentando, como se viu, em que o recurso de revisão, um remédio excepcional contra decisões transitadas, constitui um compromisso entre os valores da estabilidade e segurança jurídicas, sem os quais nenhum sistema jurídico subsiste, e a salvaguarda da justiça do caso, em ordem a fazer ceder aqueles, mas apenas pontualmente (nos casos taxativamente indicados) e havendo razões muito sérias, perante as exigências da segunda.
4 – Quando fundada na descoberta de factos novos, é enfatiza a excepcionalidade do recurso de duas formas: primeiro, restringindo-o à hipótese de os novos factos suscitarem graves dúvidas (não apenas quaisquer “dúvidas”) sobre a justiça da condenação (al. d) do n.º 1 do art. 449.º); depois, limitando a amplitude de produção de prova, rejeitando a admissibilidade de audição de testemunhas que não tenham já sido ouvidas no processo, a não ser que o requerente venha justificar que ignorava a sua existência ou que elas estavam impossibilitadas de depor (n.º 2 do art. 453.º).
5 – Ora, se o requerente só pode indicar testemunhas novas nessas situações é porque os factos novos, para efeitos de revisão, têm de ser novos também para ele: novos porque os ignorava de todo, ou porque estava impossibilitado de fazer prova sobre eles.
6 – Esta interpretação a fazer do n.º 2 do art. 453.º, pois seria incontestavelmente contraditório que o legislador admitisse a revisão com fundamento em factos já conhecidos pelo recorrente e simultaneamente o privasse de fazer prova dos mesmos, ou lhe dificultasse notoriamente essa prova, impedindo-o de apresentar testemunhas novas. E a que se harmoniza com o carácter excepcional do recurso de revisão, que não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa ou estratégias de defesa incompatíveis com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais.
8 – Se o arguido se “esquece” de apresentar certos meios de prova em julgamento ou os negligencia, ou se por qualquer outra razão opta por ocultá-los, no prosseguimento de uma certa estratégia de defesa, escamoteando-os ao tribunal, caso venha a sofrer uma condenação, não deve obviamente ser compensado com o “prémio” de um recurso excepcional, que se destinaria afinal a suprir deficiências, voluntárias ou involuntárias, da sua defesa em julgamento, sendo de ter por inadmissível o recurso de revisão interposto ao abrigo da al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP quando os factos novos alegados sejam já do conhecimento do requerente ao tempo do julgamento.
AcSTJ de 20.11.2008, proc. n.º 3543/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
*
Processo penal - litigância de má fé - multa
I - O tribunal recorrido, ao apreciar um recurso movido pelo arguido, imputou-lhe uma conduta processual deliberadamente incorrecta, pois interpô-lo com uma fundamentação factual que sabia não corresponder à verdade. Ora, a consequência desta actuação está prevista no art.º 420.º, n.ºs 1, al. a) e 3 do CPP, pois que aí se impõe a rejeição do recurso por manifesta improcedência e a aplicação de uma sanção pecuniária que acresce às custas do processo.
II - Não há, pois, lacuna nas normas do processo penal. De resto o CPP prevê expressamente uma situação de má-fé processual na alínea c) do art.º 520.º do CPP (denúncia de má-fé) e configura outras situações afins (art.ºs 45.º, n.º 5, 223.º, n.º 6, 456.º, para além do apontado art.º 420.º, n.º 3), o que não permite a afirmação de que há uma lacuna a este respeito no conjunto do processo penal.
III - Assim, não há fundamento para aplicar o disposto no art.º 456.º do CPC ao caso em apreço, ainda que unicamente na modalidade de aplicação de uma multa à “parte” que agiu de má-fé, pois o CPP já prevê uma sanção pecuniária que tem a natureza de multa.
IV - Os tribunais penais têm ainda outros meios que podem e devem usar quando os sujeitos processuais e os advogados usam de expedientes manifestamente dilatórios para obstarem ao trânsito em julgado das decisões.
V - Efectivamente, para além da condenação numa quantia pecuniária como sanção processual pela manifesta improcedência, não se justifica, muitas vezes, atribuir efeito suspensivo a recursos interlocutórios, com o (falso) argumento de que a retenção o tornaria inútil, pois que não se deve confundir a absoluta inutilidade com a prática de actos que "a posteriori" se venha a verificar que afinal foram inúteis, como será o caso de se fazer um julgamento que poderá ser anulado.
VI - Por outro lado, o STJ tem entendido que é aplicável ao processo penal o disposto no art.º 720.º do CPC.
VII - Por fim, se o tribunal entender que um advogado não usou de lealdade processual e que deliberadamente actuou com o intuito de obstar o exercício da Justiça, nomeadamente, com a invocação dolosa de factos falsos, deve comunicar essa circunstância à Ordem dos Advogados, não para os fins do art.º 459.º do CPC, mas para eventual procedimento disciplinar.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3708/08-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
*
Perda de bens a favor do Estado - bens adquiridos com o produto do crime - bens apreendidos - tráfico de estupefacientes - presunções
I - O tribunal recorrido, ao apreciar um recurso movido pelo arguido, imputou-lhe uma conduta processual deliberadamente incorrecta, pois interpô-lo com uma fundamentação factual que sabia não corresponder à verdade. Ora, a consequência desta actuação está prevista no art.º 420.º, n.ºs 1, al. a) e 3 do CPP, pois que aí se impõe a rejeição do recurso por manifesta improcedência e a aplicação de uma sanção pecuniária que acresce às custas do processo.
II - Não há, pois, lacuna nas normas do processo penal. De resto o CPP prevê expressamente uma situação de má-fé processual na alínea c) do art.º 520.º do CPP (denúncia de má-fé) e configura outras situações afins (art.ºs 45.º, n.º 5, 223.º, n.º 6, 456.º, para além do apontado art.º 420.º, n.º 3), o que não permite a afirmação de que há uma lacuna a este respeito no conjunto do processo penal.
III - Assim, não há fundamento para aplicar o disposto no art.º 456.º do CPC ao caso em apreço, ainda que unicamente na modalidade de aplicação de uma multa à “parte” que agiu de má-fé, pois o CPP já prevê uma sanção pecuniária que tem a natureza de multa.
IV - Os tribunais penais têm ainda outros meios que podem e devem usar quando os sujeitos processuais e os advogados usam de expedientes manifestamente dilatórios para obstarem ao trânsito em julgado das decisões.
V - Efectivamente, para além da condenação numa quantia pecuniária como sanção processual pela manifesta improcedência, não se justifica, muitas vezes, atribuir efeito suspensivo a recursos interlocutórios, com o (falso) argumento de que a retenção o tornaria inútil, pois que não se deve confundir a absoluta inutilidade com a prática de actos que "a posteriori" se venha a verificar que afinal foram inúteis, como será o caso de se fazer um julgamento que poderá ser anulado.
VI - Por outro lado, o STJ tem entendido que é aplicável ao processo penal o disposto no art.º 720.º do CPC.
VII - Por fim, se o tribunal entender que um advogado não usou de lealdade processual e que deliberadamente actuou com o intuito de obstar o exercício da Justiça, nomeadamente, com a invocação dolosa de factos falsos, deve comunicar essa circunstância à Ordem dos Advogados, não para os fins do art.º 459.º do CPC, mas para eventual procedimento disciplinar.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3708/08-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
*
Perda de bens a favor do Estado - bens adquiridos com o produto do crime - bens apreendidos - tráfico de estupefacientes - presunções
I - O art.º 7.° n.º 1 da Lei 5/2002 de 11.01 dispõe que em caso de condenação pela prática determinados crimes, designadamente pelo de tráfico de estupefacientes, presume‑se constituir vantagem da actividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito.
II - Esta presunção, porém, só opera nos casos em que o tribunal não consegue apurar a proveniência lícita ou ilícita dos bens do arguido e em que, portanto, o ónus de provar a proveniência pertence ao arguido.
III - Na verdade, se o tribunal tem prova da proveniência lícita dos bens, manda restituí-los ao proprietário. Mas se determina a sua proveniência ilícita, designadamente, no caso do tráfico de estupefacientes, por apurar inequivocamente que foram adquiridos pelos proventos dessa actividade, tem de os declarar perdidos para o Estado, nos termos do art.º 36.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3269/08-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
*
Recurso penal - matéria de facto - factos genéricos - ónus da impugnação especificada - convite ao aperfeiçoamento
I - O STJ tem reafirmado que o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.
II - Conhecendo-se pela fundamentação da sentença o caminho lógico que, segundo a 1ª instância, levou à condenação do recorrente, deveria este ter-se limitado a sindicar os pontos de facto que nesse percurso foram erradamente avaliados, com a indicação das provas que impunham uma decisão diversa e com referência aos respectivos suportes técnicos.
III - Por outro lado, devia ter-se abstido de sindicar os factos que, embora provados, não são penalmente relevantes, por serem suposições, factos genéricos, simples ocorrências sem relevo, próprias do desenrolar da investigação que recolheu elementos indiciários até à descoberta do facto criminal e dos seus autores.
IV - Factos como, por exemplo, o n.º 9 (Nesta altura, o então suspeito M. V. revelou-se muito cuidadoso com a organização do encontro, uma vez que, antes de se reunir com os referidos indivíduos junto à Praça de Touros, local onde manusearam alguns volumes que se encontravam na mala do veículo Citroën C15, realizaram algumas inversões de marcha e percorreram algumas das mais estreitas e pacatas ruas da localidade de Santa Eulália, procurando detectar a presença de um qualquer dispositivo policial de vigilância) são insusceptíveis de fundamentar a aplicação ao arguido de uma pena e mesmo o seu grau de participação num eventual crime, pois, na verdade, os “referidos indivíduos” não são arguidos nos autos, terão sido suspeitos na investigação policial, como se desconhece o que continham os “volumes” ali mencionados.
V - Também certas referências a “aquisição de droga”, sem outra concretização, não passam de afirmações genéricas, insusceptíveis de contradita, pois não se sabe se houve uma verdadeira aquisição, se foi de estupefacientes, quando foi feita, a quem, o que foi efectivamente adquirido, se era mesmo heroína ou cocaína, etc. Por isso, a aceitação dessas afirmações como “factos” inviabiliza o direito de defesa que assiste ao arguido e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art.º 32.º da Constituição.
VI - O Tribunal da Relação, perante essas falhas, deveria ter convidado o recorrente a aperfeiçoar as conclusões do recurso (e só destas, pois já não lhe é permitido modificar a motivação, limite absoluto que não pode ser extravasado), antes de se pronunciar, como tem sido jurisprudência constante deste STJ e do Tribunal Constitucional, para permitir um segundo grau de recurso em matéria de facto.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3269/08-5 , Relator: Cons. Santos Carvalho
II - Esta presunção, porém, só opera nos casos em que o tribunal não consegue apurar a proveniência lícita ou ilícita dos bens do arguido e em que, portanto, o ónus de provar a proveniência pertence ao arguido.
III - Na verdade, se o tribunal tem prova da proveniência lícita dos bens, manda restituí-los ao proprietário. Mas se determina a sua proveniência ilícita, designadamente, no caso do tráfico de estupefacientes, por apurar inequivocamente que foram adquiridos pelos proventos dessa actividade, tem de os declarar perdidos para o Estado, nos termos do art.º 36.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3269/08-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
*
Recurso penal - matéria de facto - factos genéricos - ónus da impugnação especificada - convite ao aperfeiçoamento
I - O STJ tem reafirmado que o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.
II - Conhecendo-se pela fundamentação da sentença o caminho lógico que, segundo a 1ª instância, levou à condenação do recorrente, deveria este ter-se limitado a sindicar os pontos de facto que nesse percurso foram erradamente avaliados, com a indicação das provas que impunham uma decisão diversa e com referência aos respectivos suportes técnicos.
III - Por outro lado, devia ter-se abstido de sindicar os factos que, embora provados, não são penalmente relevantes, por serem suposições, factos genéricos, simples ocorrências sem relevo, próprias do desenrolar da investigação que recolheu elementos indiciários até à descoberta do facto criminal e dos seus autores.
IV - Factos como, por exemplo, o n.º 9 (Nesta altura, o então suspeito M. V. revelou-se muito cuidadoso com a organização do encontro, uma vez que, antes de se reunir com os referidos indivíduos junto à Praça de Touros, local onde manusearam alguns volumes que se encontravam na mala do veículo Citroën C15, realizaram algumas inversões de marcha e percorreram algumas das mais estreitas e pacatas ruas da localidade de Santa Eulália, procurando detectar a presença de um qualquer dispositivo policial de vigilância) são insusceptíveis de fundamentar a aplicação ao arguido de uma pena e mesmo o seu grau de participação num eventual crime, pois, na verdade, os “referidos indivíduos” não são arguidos nos autos, terão sido suspeitos na investigação policial, como se desconhece o que continham os “volumes” ali mencionados.
V - Também certas referências a “aquisição de droga”, sem outra concretização, não passam de afirmações genéricas, insusceptíveis de contradita, pois não se sabe se houve uma verdadeira aquisição, se foi de estupefacientes, quando foi feita, a quem, o que foi efectivamente adquirido, se era mesmo heroína ou cocaína, etc. Por isso, a aceitação dessas afirmações como “factos” inviabiliza o direito de defesa que assiste ao arguido e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art.º 32.º da Constituição.
VI - O Tribunal da Relação, perante essas falhas, deveria ter convidado o recorrente a aperfeiçoar as conclusões do recurso (e só destas, pois já não lhe é permitido modificar a motivação, limite absoluto que não pode ser extravasado), antes de se pronunciar, como tem sido jurisprudência constante deste STJ e do Tribunal Constitucional, para permitir um segundo grau de recurso em matéria de facto.
AcSTJ de 20/11/2008, Proc. n.º 3269/08-5 , Relator: Cons. Santos Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário