quarta-feira, 9 de abril de 2008

Casa da Supplicação

Concurso de infracções - Cúmulo jurídico superveniente - Cúmulo anterior - Medida da pena
1 - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena, considerando-se, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, sendo também atendíveis os elementos a que se refere o art. 71.º do C. Penal, mas sem se esquecer que isso já aconteceu em relação a cada uma das penas parcelares e que tudo se terá de reflectir na personalidade do agente, atenta a globalidade dos factos.
2 - A pena aplicável tem como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite superior a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa, atento o princípio de cumulação a fonte essencial de inspiração do cúmulo jurídico em que são determinadas as penas concretas aplicáveis a cada um dos crimes singulares e é depois construída uma moldura penal do concurso, dentro do qual é encontrada a pena unitária, mas sem esquecer, no entanto, que o nosso sistema é um sistema de pena unitária em que o limite mínimo da moldura atendível é constituído pela mais grave das penas parcelares (numa concessão minimalista ao princípio da exasperação ou agravação - a punição do concurso correrá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade de crimes), sem que possa ultrapassar a soma das penas concretamente que seriam de aplicar aos crimes singulares.
3 - Se anteriormente foram efectuados cúmulos anteriores cúmulos, deve atender-se às respectivas penas únicas conjuntas, apesar de tais cúmulos serem desfeitos, retomando todas as penas parcelares a sua autonomia.
4 – Se se tem de realizar um cúmulo numa moldura penal abstracta: 3 anos e 2 meses a 16 anos e 6 meses, mas anteriormente numa moldura de 3 anos e 2 meses a 14 anos e 6 meses foi aplicada uma pena única de 4 anos, a consideração da pena de 2 anos, torna aceitável, tratando-se de um delinquente jovem que a penas única se situe em em 5 anos e 1 mês de prisão.
AcSTJ de 09.04.2008, proc. n.º 814/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Aplicação da lei no tempo - Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça - Tribunal do júri - Matéria de facto - Competência
1 – Se, num recurso interposto de decisão do Tribunal do júri proferida depois de 15.9.2007, são questões de facto e de direito é competente para o conhecimento desse recurso a Relação e não o Supremo Tribunal de Justiça.
2 – Com efeito, o novo texto do CPP, introduzido pela Lei n.º 48/2007, veio alterar as regras quanto ao recurso das decisões do tribunal de júri, equiparando-as às decisões dos tribunais colectivos: tratando da questão de facto, o recurso é sempre interposto para as Relações a quem cabe então um conhecimento amplo; tratando exclusivamente da questão de direito, é necessariamente interposto para a Relação se a pena aplicada não for superior a 5 anos de prisão ou para o Supremo Tribunal de Justiça se a pena aplicada for superior a 5 anos de prisão.
3 – Não contendo a Lei n.º 48/2007 qualquer disposição transitória que contemple a sua aplicação no tempo, as questões serão resolvidas à luz do disposto no art. 5.º do CPP, pelo que as alterações em matéria de recurso serão aplicadas imediatamente, sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior, salvo se daí resultar agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa, o que não é o caso.
Decisão Sumária de 8-4-2008, proc. n.º 807/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Tráfico de estupefacientes - 1,3 Kg de cocaína - medida da pena - suspensão da execução da pena
1 – Se um cidadão espanhol transporta do Brasil, por Portugal, com destino a Espanha, cocaína transformada em 140 botões cosidos em 6 casacos, para mais facilmente tentar iludir as autoridades alfandegárias, demonstra significativa sofisticação, mas, por outro lado, a quantidade é a menor que, por via de regra, é transportada por via aérea estes percursos: 1.387,852 gramas de cocaína e não estando provado que o arguido detinha o produto estupefaciente destinando-o à distribuição a outras pessoas, mediante a sua venda, não se pode aferir o “desvalor da acção pelo fim da acção criminosa, obtenção do lucro fácil” e ponderar que o perigo concreto desencadeado pela mesma acção “era susceptível de colocar em perigo a vida e a integridade física de muitas pessoas, de agravar o sofrimento moral e físico de centenas ou milhares de toxicodependentes (destinatários finais da droga apreendida) e da família destes, ameaçando igualmente a segurança da sociedade”.
2 – Não tendo registados antecedentes criminais em Portugal é aceitável a fixação de uma pena de 5 anos de prisão, mesmo que não venha provado que se trata de um correio de droga, pois a actuação em causa centra-se essencialmente no transporte de droga e necessária detenção, por se não ter apurado que visasse o lucro e a distribuição a terceiros, mediante a venda.
3 – Mas não é de suspender a execução dessa pena de prisão, não só por ser a matéria apurada insuficiente para formular um juízo de prognose social favorável, como o combate ao tráfico de droga em que Portugal internacionalmente se comprometeu impõe que não seja suspensa a execução da pena nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes, em que não se verifiquem razões muito ponderosas, que no caso se não postulam, seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral.
AcSTJ de 09.04.2008, proc. n.º 825/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Concurso de infracções - cúmulo jurídico superveniente - fundamentação - nulidade
1 – De acordo com a al. a) do n.º 1 do art. 379.º do CPP é nula a sentença que não contiver as menções referidas no art. 374.º, n.ºs 2 e 3, alínea b) do mesmo diploma, ou seja, além do mais a fundamentação, «que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão».
2 – A fundamentação no caso de concurso de infracções, afasta-se da fundamentação geral prevista no art. 374.º, n.º 2 do CPP, tudo se resumindo a uma especial e imprescindível fundamentação onde avultam, na fixação da pena unitária, a valoração em conjunto, dos factos enquanto “guia” e a personalidade do agente, mas sem o rigor e a extensão pressuposta nos factos de fixação da pena prevista no art. 71.º do C. Penal.
3 – Se na decisão recorrida, no que se refere aos factos se limita a relatar as condenações, o tipo de crime e as penas e só se acrescenta que: «na determinação da pena única considerar-se-ão, em conjunto, os factos que ficaram descritos nos processos em apreço e a personalidade do agente, pessoa familiar e profissionalmente inserida, normalmente acatador dos normativos éticos e jurídicos vigentes», não cumpre o dever de fundamentação, não relaciona os factos entre si e com a personalidade do arguido, elemento essencial na elaboração do cúmulo jurídico, integrador da pena do concurso, nem avalia essa personalidade quanto à questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente a uma “carreira”) criminosa, ou tão só uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade.
AcSTJ de 09.04.2008, proc. n.º 1125/08-5, Relator: Cons. Simas Santos
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Aplicação da lei no tempo - recurso - recurso penal - admissibilidade de recurso - pena parcelar -
pena única - confirmação da pena
I - A lei aplicável para se aferir da recorribilidade de certa decisão é a vigente na altura em que a mesma for proferida, o que, aliás, é uma decorrência do princípio da aplicação imediata da lei processual penal
II - E o que conta é, obviamente, o momento em que a decisão foi proferida, pois, independentemente do terminus a quo do prazo legal de interposição do recurso (depósito da sentença na 1ª instância ou notificação postal ao mandatário nos tribunais superiores), nada impede que haja uma interposição imediata do recurso logo no momento da prolação da sentença. O direito ao recurso afere-se, pois, no momento em que é proferida a decisão de que se quer recorrer e pela lei então aplicável.
III - Para o efeito da recorribilidade nos termos do disposto na al. f), do n.º 1, do art.º 400.º do CPP na versão originária, a confirmação ou não confirmação de cada uma das penas parcelares nada tem a ver com o agravamento imposto pela Relação das condições de suspensão da pena (única). Mas, nesse caso, tal norma já não se aplicará em relação à pena única, pois esta, efectivamente, não foi confirmada pela Relação, pelo que as penas parcelares serão irrecorríveis, se confirmadas, porém será recorrível a pena única.
IV - No domínio da actual versão do CPP, as alíneas e) e f) do n.º 1 do art.º 400.º referem-se à pena aplicada e não à aplicável, sem menção da frase “mesmo em caso de concurso de infracções”.
V - Houve, portanto, uma inversão do legislador quanto a esta questão da recorribilidade, restringindo drasticamente o recurso da Relação para o Supremo. Importa, por isso, não ir mais além do que a letra da lei.
VI - Daí que seja razoável concluir que, actualmente, ao contrário do que dantes sucedia, a questão da irrecorribilidade deve aferir-se pela pena única aplicada e já não atendendo às penas parcelares, isto é, o que importa é a pena que foi aplicada como resultado final da sentença, toda ela abrangida no âmbito do recurso, nos termos do art.º 402.º, n.º 1, do CPP, salvo declaração em contrário por parte do recorrente.
AcSTJ de 03/04/2008, Proc. n.º 574/08-5, Relator: Santos Carvalho

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