Deixem-me contar-vos a pequena história do meu eucalipto, quase centenário.
Era uma árvore frondosa e cheia de viço, estendendo as suas raízes longamente em busca de água, que sorvia que nem um desalmado. Um dia, veio uma nova estrada – a “Correcção da Rua O” – e cortou-lhe uma parte substancial do seu abastecimento no sopé da colina.
Alguns ramos principiaram a secar, a casca do tronco começou a soltar-se com mais pressa e não fôra a intervenção urgente dos “Cirurgiões das Árvores” – firma do Porto com um excelente “cirurgião” – e o seu fim teria sido rápido.
Mau grado aquela intervenção de há cerca de cinco anos, inopinadamente no cume abrasador de Agosto uma pernada soltou-se lá do cocuruto e ficou suspensa a baloiçar a baloiçar sobre o caminho de acesso à habitação e os fios do telefone.
Pedido de apoio urgente à Protecção Civil e no mesmo dia apareceram dois bombeiros e um Chefe, que levaram um quarto de hora a descrever os equipamentos necessários para remover a pernada, os que tinham mas não funcionavam e os que precisavam mas não tinham. Considerei-me elucidado, e descalço de verba para filantropicamente remediar a situação, despedimo-nos sob o olhar vigilante da pernada – qual espada de Dâmocles suspensa sobre as nossas cabeças (as nossas e não as dos bombeiros que entretanto se haviam recolhido de sirene calada).
Lembrei-me logo dos “cirurgiões”...mas estavam de férias ( mal se falava ainda das férias às horas extraordinárias nos hospitais).
Restava-me a Câmara Municipal: usando o correio electrónico e o telefone, quando já desesperava e três dias eram passados, eis que vem uma resposta. Não devia fazer “reply” mas que telefonasse para um número que se indicava – quase à 007. Depois de um exercício mental de conjugação de horários administrativos, à quarta vez atingi o alvo e fui encaminhado para a área dos Espaços Verdes: metia-se o fim-de-semana e só na segunda-feira teria notícias.
Apesar do vento que engrossara, a pernada aguentava-se galhardamente e até o eucalipto esboçou um sorriso com uns pingos de chuva que caíram.
Finalmente a mensagem chegara aos Espaços Verdes, o contacto funcionou ao inverso, da Administração para o cidadão, e no dia seguinte a máquina com suporte e ascensor, em vinte minutos arreou a pernada. O eucalipto soltou um uf! aliviado e os fios do telefone e da Internet continuaram incólumes.
Punha-se o magno problema de saber como era possível ter-se soltado a pernada – estaria podre, o que era de mau agoiro para o centenário e já se pensava como abatê-lo com o mínimo de mossa. Mas não, a madeira está sadia ...o que leva a pensar que ainda podemos desfrutar do eucalipto se cuidarmos de lhe dar água com mais abundância e podá-lo dos ramos secos.
Moral da história: os códigos, tal como as árvores, não se podem deitar abaixo de qualquer maneira. Houve umas pernadas que se soltaram – especialmente depois de uns ventos fortes se terem abatido sobre certos processos e uns senhores terem profetizado as três questões essenciais para rever (ou reformar, ao tempo ainda não se punha a delicada questão). Por isso, há que arrear as pernadas e cuidar do eucalipto...por dentro, diria eu, e com aqueles que tratam das árvores todos os dias.
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De um momento para o outro vejo que a este blog chegou uma nova lufada. Ainda bem.
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