Não menos chocantes do que muitas situações viriam a ser, porém, as reacções corporativas logo desencadeadas - ora disfarçadas sob a forma de reivindicações sindicais, ora invocando pretensos direitos adquiridos, ora intentando manter insustentáveis regimes especiais ou excepcionais. Causa espanto que se manifestem tantos egoísmos corporativos e tanta falta de solidariedade nacional!
Paradigmáticos são, entre vários casos que poderiam ser referidos, os casos dos professores sindicalistas do ensino básico e secundário, de alguns juízes, de presidentes de câmara municipal e de deputados. Paradigmáticos e difíceis de entender, em face do lugar eminente que ocupam na sociedade e do magistério cívico que lhes deveria estar associado.
(...)
Outro caso: a reacção de alguns juízes perante certas medidas anunciadas pelo Governo. Os juízes, os magistrados do Ministério Público e quantos trabalham nos tribunais (não raro em condições precárias) merecem todo o respeito. No entanto, justamente por isso, eles devem dar-se ao respeito, não fazendo declarações, movimentações e ameaças de greve que contrariam o seu estatuto constitucional de titulares de órgãos de soberania. Então os órgãos de soberania podem fazer greve? Admiti-lo, admitir as formas de luta que alguns juízes reclamam, equivaleria a pôr em causa o próprio Estado.
(A este propósito, vale a pena perguntar se, em vez da redução das férias judiciais, outra providência legislativa não deveria ser adoptada: a proibição absoluta de qualquer juiz ou qualquer magistrado do Ministério Público desempenhar funções estranhas aos tribunais. E isso não tanto por causa da multiplicação de processos quanto por imperativo de dignidade das respectivas funções. Como conceber um juiz - que deve ser isento politicamente e independente - a assumir cargos políticos ou de confiança política? Não representa tal o contrário da atitude que os deve marcar? E como conceber que depois voltem à carreira e até, por vezes, venham a ser promovidos?
(...)
Mais do que o respeito do princípio republicano como princípio jurídico, está aqui em causa a ética republicana como ética de responsabilidade, de exigência cívica e de desprendimento ao serviço do interesse geral. Esperamos que ela venha a prevalecer!
Jorge Miranda, Público, 09Jul05
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