Tráfico de estupefaciente — estabelecimento prisional — tráfico agravado — tráfico comum — tráfico de menor gravidade
1 - As circunstâncias que podem agravar a moldura do crime de tráfico de estupefacientes, previstas no art.º 24º do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, não são de funcionamento automático, pelo que é admissível que o arguido que detém cerca de 50 gramas de haxixe no interior do estabelecimento prisional onde se encontra a cumprir pena, em que não se prova o destino que lhe pretendia dar, não seja punido por força do referido art.º 24.º, al. h), dada a natureza e quantidade do produto e a existência de uma mera detenção.
2 – Mas, a circunstância do tráfico ser exercido em estabelecimento prisional é suficientemente forte para impedir que a imagem global do facto seja a de uma ilicitude acentuadamente diminuída, pelo que teria sido correcto punir o arguido no quadro do tráfico comum, p.p. no art.º 21.º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, e não no de menor gravidade.
Ac. de 21.04.2005 do STJ, proc. n.º 1273/05-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
Jovem delinquente — atenuação especial da pena — atenuante de carácter geral
1 - A atenuação especial da pena para jovens delinquentes, prevista no art.º 4.º do Dec.-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, não se aplica apenas à criminalidade menor, antes se torna mais necessária para crimes de moldura penal mais elevada, quando a imagem global que se forma dos factos e da personalidade do agente nos aponta no sentido de uma futura ressocialização.
2 – Mas, ainda que as circunstâncias da personalidade do arguido afastem essa atenuação especial, a sua juventude é uma circunstância atenuante de carácter geral, de resto com valor significativo, pois, em qualquer caso, não se deve tratar um jovem de 17 anos, primário, sem atender à imaturidade própria dessa fase da vida.
Ac. de 21.04.2005 do STJ, proc. n.º 658/05-5, Relator: Cons. Santos Carvalho
Sigilo profissional — dispensa de sigilo profissional — -solicitador — Parecer da Camâra de Solicitadores — valor jurídico do Parecer
A dispensa de depor concedida pela Ordem respectiva a um solicitador seu afiliado, podendo, eventualmente, e em face do respectivo Estatuto, ter valor vinculativo nas «relações internas», isto é, nas relações Ordem-afiliado, não tem eficácia «erga omnes», não se impondo, nomeadamente, aos tribunais, a quem cabe decidir, caso a caso, com supremacia sobre o parecer dado, e face à ponderação dos concretos interesses em presença, se se justifica ou não, a dispensa de sigilo profissional.
Ac. de 21.04.2005 do STJ, proc. n.º 1300/05-5, Relator: Cons. Pereira Madeira
Conflito negativo de competência — contra-ordenação — recurso da decisão da administração — envio pelo correio — tribunal que primeiro teve contacto com o caso
1 – É competente para conhecer do recurso da decisão da administração o tribunal em cuja área territorial se tiver consumado a infracção e, se a infracção não se tiver chegado a consumar-se é competente o tribunal em cuja área se tiver praticado o último acto de execução ou, em caso de punibilidade dos actos preparatórios, o último acto de preparação (art. 61.º do RGCO)
2 – Considerando-se o facto praticado no lugar em que, total e parcialmente e sob qualquer forma de comparticipação, o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, bem como naquele em que o resultado típico se tenha produzido.
3 – Se a contra-ordenação consiste na omissão do envio, antecedido de autoliquidação e que pode ter lugar pelo correio, para a sede de um serviço de uma determinada importância, não se sabe de onde poderia ter sido a mesma enviada, pelo que se não sabe onde se consumou.
4 – Daí que deva ser deferida a competência ao tribunal que primeiro tomou conhecimento da infracção.
Ac. de 21.04.2005 do STJ, proc. n.º 1134/05-5, Relator: Cons. Simas Santos
Instrução — indeferimento de diligências — legitimidade para recorrer — difamação em depoimento — punibilidade
1 – Se o arguido na instrução pedida pela assistente requerer o depoimento de testemunhas, que vem a ser consideradas desnecessárias pelo Juiz de Instrução, não tem a assistente legitimidade para recorrer desta decisão, pois que nada requereu nesse domínio, pelo que não se pode considerar que a decisão de dispensar a produção da prova requerida pelo arguido, tenha sido proferida contra ela.
2 – Quando um Juiz de Direito depõe num processo disciplinar instaurado contra uma funcionária judicial, por actos praticados no Tribunal onde ambos exerciam funções, e declara: “que confirma que por várias vezes chamou a atenção do Sr. Escrivão para expressões e actuações menos próprias da Sra. Funcionária, Carla Borrões. Não pode agora confirmar quais, mas recorda-se de alguns tratamento por “você” e de por vezes de má vontade no cumprimento do determinado.” Recorda-se ainda de duas boas funcionárias concorrerem para o Tribunal do Trabalho, por via do mau ambiente criado por aquela funcionária. Para isso poderia concorrer o facto de a mesma ser licenciada em Direito e por isso se julgar mais apta que as demais”, não comete um crime de difamação e falsidade de testemunho.
3 – Isto porque a prova recolhida vai no sentido da verdade dos factos imputados pelo juiz nas suas declarações e as declarações tiveram lugar: no decurso de um processo disciplinar (DL n.º 343/99 de 26 de Agosto, alterado pelo DL 157/00 de 26 de Agosto) contra a funcionária, sendo aplicável (art. 89.º) o regime geral dos funcionários e agentes da Administração Pública e no domínio desse diploma (DL n.º 24/84, de 16 de Janeiro) as testemunhas devem ser ouvidas de acordo com as regras próprias do processo penal, mas adaptadas, por aligeiramento, ao procedimento disciplinar e, de acordo com o art. 132.º do CPP é dever das testemunhas responder com verdade às perguntas que lhe forem dirigidas [n.º 1, al. d)].
4 – O interesse público (e a lei) impõem que aqueles que são ouvidos em processo administrativo de natureza disciplinar têm a obrigação de se pronunciar, com verdade, sobre os factos que se encontrem a ser averiguados: a matéria respeitante aos elementos constitutivos da infracção disciplinar, e a personalidade da arguida, bem como todas as circunstâncias em que a infracção tiver sido cometida que militem contra ou a favor da arguida (art. 28.º do ED).
5 – Do art. 180.º do C. Penal, resulta a ideia de que o legislador não foi alheio à ideia de, em casos especiais, se considerarem não puníveis condutas que têm atrás de si motivos relevante e sérios, declarando o n.º 2 desse artigo a impunibilidade da conduta quando: a imputação vise realizar interesses legítimos, como «sucede, por exemplo, quando se exerce o direito de informar ou qualquer outro direito, bem como quando se actua no cumprimento de um dever, como é o caso da prestação de um depoimento em juízo» ou em processo sancionatório público, como é o caso de um processo disciplinar; ou se faça a prova da verdade da imputação ou mesma seja tida, de boa fé, como verdadeira.
6 – Mas também se pode afirmar que está ausente a intenção, ou a consciência de injuriar, toda a vez que o arguido se limitou a depor no âmbito daquele processo, narrando o que de relevante conhecia, procurando somente colaborar na descoberta da verdade e não ofender quem quer que fosse.
Ac. de 21.4.2005 do STJ, proc. n.º 756/05-5, Relator: Cons. Simas Santos
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