A imprensa dá conta de que se fixaram em duas as candidaturas ao Supremo Tribunal de Justiça. Li aqui alguns excertos do “programa” dos candidatos.
Hoje – em que muitos estarão concentrados, a justo título, nos resultados das eleições gerais – queria porém assinalar dois aspectos, ligados às eleições para o STJ, marcadas para o dia 3 de Março.
Um tem a ver com o sistema.
Continua, a meu ver, a ser inaceitável que as eleições para os Tribunais Superiores, especialmente para o Supremo Tribunal de Justiça, decorram desta maneira, com “campanhas” sem quaisquer regras, em que a captatio benevolentiae oculta, no corredor, no gabinete ou no comboio, é uma constante. Seria assim tão complexo – sem que vá implícita a adesão a um sistema em que a quarta figura do Estado é eleita por 70 pares – designar uma Comissão de Eleições apropriada, a qual recebia as candidaturas, promovia a discussão atempada de verdadeiros programas, de forma transparente e participada, inclusivamente com a presença de entidades estranhas ao Supremo? Nem sequer estou a pensar – e por que não? – numa discussão em certos meios de comunicação social, por exemplo na televisão. Nisto, a inspiração em outros colégios, mesmo da comunidade forense, só podia ser benéfica.
O outro tem a ver com os candidatos: o respeito pelos dois candidatos que se apresentaram, que é o mesmo e não toca na consideração profissional, não pode inibir ninguém de comentar, aprovar ou discordar, porque não está em jogo a eleição para um qualquer clube, é do Supremo Tribunal de Portugal que se trata. Na minha opinião, com as duas candidaturas apresentadas será desperdiçada mais uma oportunidade de o Poder Judicial (agora alguns dizem o “Judiciário”, expressão com que antipatizo) se actualizar, de deixar entrar uma lufada de ar fresco.
Um dos candidatos – que é Vice-Presidentes – propõe-se assegurar a continuidade, o que só por si dá uma ideia de como o Supremo continuaria na maré negra em que viveu nestes últimos anos sem qualquer voz activa nas questões em que o Poder Judicial não podia deixar de ser ouvido e respeitado. Tanto mais respeitado quanto mais se desligar de interesses meramente internos ou de arrogâncias descabidas e se abeirar do que pensa o cidadão comum sobre a Justiça e de como se lhe pode tornar a vida mais fácil... e mais Justa. Diz-se ainda que esta eleição seria de preparação – dado o tempo próximo da jubilação – para a renovação... Perfeito desatino.
O outro candidato – anterior Vice-Presidente do CSM – não deixa de ser o “homem do aparelho”. Também já deu provas de que não está ao seu alcance criar um ambiente propício, dentro e fora da magistratura, para que sejam efectuadas as verdadeiras reformas, que tardam a sair da forja, desde logo porque não se quer gastar com os tribunais aquilo que se consome com sectores bem menos relevantes da Administração Pública. É uma pena... se se perde mais este tempo.
Será que os nossos conselheiros do activo vão, por momentos, levantar o sobrolho do processo e olhar uma vez para a realidade que os circunda? Valia a pena ligar o despertador!
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