quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Os tribunais de contas e o governo económico

Público | quinta-feira, 18 Outubro 2012

Por Guilherme d' Oliveira Martins

A realização em Portugal da reunião do Comité de Contacto dos Tribunais de Contas da União Europeia, neste momento, constitui uma oportunidade de grande importância para uma reflexão aprofundada sobre a crise económica europeia e sobre a procura de respostas que façam regressar a esperança e a confiança aos cidadãos europeus. 

Desde o momento em que tivemos os primeiros sinais da crise financeira os Tribunais de Contas dos Estados membros da União têm, com o Tribunal de Contas Europeu, procurado, através da coordenação de iniciativas e de um reforço do controlo das contas dos Estados e dos dinheiros públicos, encontrar instrumentos eficientes capazes de garantir um acompanhamento rigoroso e uma avaliação relevante e profícua. De igual forma se tem procurado intensificar uma atitude de responsabilização no tocante à gestão e aos resultados na aplicação dos recursos provenientes dos cidadãos contribuintes.

Como têm afirmado pensadores europeus com militância cívica assinalável, impõe-se recuperar a autoridade e o prestígio das instituições democráticas europeias - o que exige a mobilização dos cidadãos e a consagração de instituições que permitam: responsabilizar os decisores que gerem o dinheiro público; melhorar o controlo da respetiva utilização e dar condições de confiança que permitam a ultrapassagem da atual crise, através da capacidade criadora e da realização da justiça distributiva em nome da dignidade da pessoa humana. Precisamos de prever e de prevenir, de planear e de avaliar. Mais do que a austeridade que é passageira, necessitamos de uma sociedade capaz de assumir a temperança e a sobriedade.

Conscientes, porém, de que a crise não se ultrapassa em cada um dos Estados-membros, a partir das soluções exclusivas de âmbito nacional, os Tribunais de Contas da União Europeia têm vindo a intensificar a cooperação entre si, de modo a assegurar a existência de coordenação no controlo e na responsabilização financeira - como sinal e como exemplo. Com efeito, a União Europeia necessita de reforçar os mecanismos de governo económico e de união politica, únicas formas de encontrar respostas audaciosas e efetivas para a situação de fragilidade e de irrelevância da Europa no contexto global.

Uma coordenação nas ações de controlo e auditoria deverá ser acompanhada por um governo económico da União Europeia, capaz de encontrar respostas positivas nos mercados internacionais no sentido de prevenir a indisciplina e de minorar a especulação.

Insatisfeitos com os resultados relativamente ao crescimento económico, conscientes dos efeitos sociais graves da fragmentação e do aumento do desemprego, preocupados com o ambiente depressivo e com as consequências dos egoísmos nacionais, das injustiças e das desigualdades - os cidadãos são chamados ao reforço democrático dos mecanismos de avaliação de controlo e auditoria, uma vez que, perante o dilema entre a disciplina financeira e orçamental e a necessidade de promoção de emprego e de desenvolvimento, se torna indispensável uma compatibilização entre tais objetivos aparentemente contraditórios.

Com efeito, a disciplina nas Finanças Públicas é essencial com uma preocupação de assegurar saídas para a crise económica, através de sinais de esperança para a economia e a sociedade. Entre Cila e Caríbdis, entre o rigor e o desenvolvimento, tem de haver uma complementaridade entre a redução do endividamento e a criação económica. Se o projeto da União Europeia tem de ser reforçado, através de uma vontade política atuante e de uma melhor coordenação efetiva - a verdade é que esse objetivo tem de ser prosseguido quer na governação, quer no controlo e na responsabilização.

Ao debater os desafios globais para a União Europeia do novo quadro financeiro (com transparência e accountability), os desenvolvimentos decorrentes da ação dos Tribunais de Contas da União Europeia perante a crise e ao refletir sobre o futuro, designadamente quanto à Estratégia Europa 2020, o Comité de Contacto pretende, assim, contribuir positivamente para que haja uma oportunidade de reforço da criatividade, de coesão da justiça, da equidade e da confiança na Europa. Só no contexto europeu poderemos superar a atual crise. Contudo, só se houver inteligência e coragem, se houver capacidade de pôr em primeiro lugar o que nos une em lugar do que nos divide, poderemos dar resposta ao desafio tão difícil e exigente em que nos encontramos.

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