quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Justiça em três meses


No caso Strauss-Kahn, sabemos que não foi possível provar nada “além da dúvida razoável”
A 14 de Maio, Dominique Strauss-Kahn, director do FMI, estava dentro de um avião quando a polícia o prendeu por suspeita de abuso sexual. Ontem, três meses depois, as acusações foram retiradas, Strauss-Kahn foi libertado e o caso encerrado.
Não deixa de ser extraordinário - num caso que é isso mesmo do princípio ao fim -, que em apenas três meses se tenha feito justiça. Há uma leitura possível deste desfecho: um homem branco e poderoso conseguiu esmagar legalmente uma imigrante africana, humilhando-a e, ao mesmo tempo, dando um sinal universal às mulheres que, no futuro, venham a ser vítimas de abusos sexuais. Mas há outra leitura, talvez mais correcta: dois advogados, ambos excelentes e famosos, trabalharam os seus casos e a justiça fez, e fez-se depressa.
Strauss-Kahn contratou Benjamin Brafman, que defendeu Michael Jackson e outras estrelas americanas. Nafissatou Diallo, a empregada do hotel, teve Kenneth P. Thompson a defendê-la, um homem que em Nova Iorque todos conhecem como o procurador que pôs na prisão os polícias que foram acusados de uma dos mais horríveis actos de brutalidade policial na história da cidade contra um imigrante negro, o famoso “caso Abner Louima”.
A mulher que apresentou queixa contra Strauss-Kahn mentiu várias vezes e isso destruiu o caso. Não é relevante que tenha mentido na sua documentação para conseguir entrar nos EUA, mas é relevante que tenha mentido sobre o caso, mudado a versão dos acontecimentos várias vezes e falado ao seu namorado em extorquir dinheiro. Perdeu a credibilidade, o caso foi encerrado. Nunca saberemos o que aconteceu naquele quarto de hotel e se o sexo foi ou não consensual. Mas sabemos que não era possível provar fosse o que fosse “além da dúvida razoável”.
Público, 24 de Agosto de 2011
Editorial

1 comentário:

José António Barreiros disse...

Não será interessante chamar à colação que 90% dos casos criminais americanos não chegam à barra dos tribunais porque - como o revelou um juiz de um tribunal federal americano numa conferência na Relação de Coimbra - tudo termina em acordos entre os advogados e os procuradores?