Escutas telefónicas
V - Existe uma diferença qualitativa entre a intercepção telefónica efectuada à revelia de qualquer autorização legal e a que, autorizada nos termos legais, não obedeceu aos requisitos a que alude o art. 187.º do CPP. Nesta hipótese o meio de prova foi autorizado e está concretamente delimitado em termos de alvo, prazo e forma de concretização, e se os pressupostos de autorização judicial forem violados estamos em face de uma patologia relativa a uma regra de produção de prova.
VI - As proibições de prova são «barreiras colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo». Mais do que a modalidade do seu enunciado, o que define proibição de prova é a prescrição de um limite à descoberta da verdade. Normalmente formulada como proibição, a proibição de prova pode igualmente ser ditada através de uma imposição, e mesmo de uma permissão. É que toda a regra relativa à averiguação dos factos proíbe ao mesmo tempo as vias não permitidas de averiguação.
VII - A proibição de prova em sentido próprio no sistema processual penal português é somente aquela norma probatória proibitiva cuja violação possa redundar na afectação de um dos direitos pertencentes ao núcleo eleito no art. 32.º, n.º 8, da Lei Fundamental, e que o art. 126.º do CPP manteve, sem alargar. VIII - Diferentemente, as regras de produção da prova – cf., v. g, o art. 341.° do CPP – visam apenas disciplinar o procedimento exterior da realização da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração. As regras de produção da prova configuram «meras prescrições ordenativas de produção da prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova (...) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor». Umas vezes pré-ordenadas à maximização da verdade material (como forma de assegurar a solvabilidade técnico-científica do meio de prova em causa), as regras de produção da prova podem igualmente ser ditadas para obviar ao sacrifício desnecessário e desproporcionado de determinados bens jurídicos.
IX - Admitindo que a circunstância de não ter sido determinada a destruição das intercepções telefónicas não transcritas, conforme determina o art. 188.º, n.º 3, do CPP, constitua uma nulidade processual, é manifesto que, pelo facto de não ter sido, oportunamente, suscitada a arguição de nulidade, se produziu a convalidação do acto processual imperfeito.
X - É que, para além da teleologia do processo penal, é o próprio dever de lealdade processual de todos os intervenientes no processo que impõe que a imperfeição seja suscitada por forma a causar o menor dano na tramitação processual e não como último argumento que se mantém resguardado para se utilizar como último recurso caso o resultado final não agrade.
XI - Aliás, e em última análise, se a intercepção utilizada consubstanciava virtualidades probatórias não concedidas em sede de inquérito pelo juiz de instrução, mas escrutinadas em audiência, então o vício praticado não foi a não destruição das intercepções, mas sim o facto de as mesmas não terem sido decididamente valoradas e consideradas como relevantes pelo mesmo juiz instrutório.
XII - O art. 8.º da CEDH permite a ingerência de uma autoridade pública, com finalidade preventiva ou repressiva, na área dos direitos fundamentais, desde que devidamente respeitadas duas condições essenciais: a legalidade, e a sua necessidade face a interesses particularmente protegidos. Assim, se forem observadas as regras de produção de prova legalmente consignadas nada impede que as intercepções telefónicas constituam o único meio de prova a fundamentar a convicção do tribunal.
XIII - Conforme referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (in CRP Anotada), para além dos pressupostos de previsão constitucional expressa e salvaguarda de direito ou interesse constitucionalmente protegido, o terceiro pressuposto material para a restrição legítima de direitos, liberdades e garantias consiste naquilo que se designa por princípio da proporcionalidade, que se desdobra em três subprincípios: o da adequação, o da necessidade ou indispensabilidade e o da proporcionalidade. O denominador comum aos três é exactamente o de equacionar a restrição que constituem em termos de direitos fundamentais com os interesses que se pretende prosseguir. Porém, tal adequação de perfil superior em termos de admissibilidade e ponderação constitucional nada tem a ver com um inusitado pressuposto processual penal de que um determinado meio de prova, desacompanhado de outro, não tem relevância para fundamentar a convicção do Tribunal.
XIV - A afirmação da recorrente de que o seu direito ao silêncio é violado pela utilização das intercepções telefónicas tem subjacente uma deturpação da teleologia do processo penal, quando não uma visão alheia a princípios fundamentais – entre os quais se encontra o da procura da verdade, seguindo pelos caminhos delimitados pelo respeito dos direitos e garantias dos intervenientes processuais, que, diga-se de passagem, não se resumem aos direitos do arguido e que, em última análise, é o direito da própria comunidade à exigência de um processo justo»
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 578/08-3, Relator: Cons. Santos Cabral
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Impedimentos
A questão colocada pelo arguido, relacionada com o facto de, em caso de repetição do julgamento do recurso, se impor a participação no respectivo julgamento de outros juízes que não os subscritores do anterior, tem a sua sede própria de enquadramento no instituto dos impedimentos, recusas e escusas, regulado nos arts. 39.º e ss. do CPP. III - Tendo dois dos juízes subscritores do acórdão ora recorrido participado em acórdãos anteriores proferidos, em recurso, no processo, um como juiz relator, o outro como juiz adjunto, encontravam-se impedidos de intervir no julgamento do recurso, devendo ter declarado esse impedimento nos autos, conforme impõe o n.º 1 do art. 41.º do CPP. IV - Não o tendo feito, e podendo o acto concretamente praticado ser repetido, com utilidade, o mesmo tem de ser considerado nulo, de acordo com o disposto no art. 41.º, n.º 3, do CPP. V - Não se encontrando tal nulidade prevista em qualquer das als. do art. 119.º, nem a sua insanabilidade cominada em qualquer outra disposição legal, maxime no art. 41.º, trata-se de uma nulidade sanável, a arguir no prazo de 10 dias a contar do momento em que o interessado tem conhecimento do impedimento do juiz ou dele devia ter tido conhecimento.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 208/08-3, Relator: Cons. Oliveira Mendes
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Imputações genéricas e caso julgado
II - A afirmação «12. O arguido ES vinha vendendo heroína a consumidores, e em resultado dessa actividade vinha adquirindo, seja por troca directa, seja por compra com dinheiro obtido na venda de heroína, inúmeras coisas, que lhe foram apreendidas e que se encontram examinadas a folhas 142 a 145, para onde se remete, e de que destacam objectos de ouro, telemóveis, relógios, câmaras fotográficas e vestuário, além de outras» corresponde não propriamente a um facto, mas antes a uma imputação genérica, com utilização de fórmulas vagas, imprecisas, nebulosas, difusas, obscuras, que é de evitar de todo em sede de fundamentação de facto.
III - Como vem sendo afirmado pela jurisprudência dominante do STJ, as imputações genéricas, designadamente no domínio do tráfico de estupefacientes, sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o aludido comércio e do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, não podem servir de suporte à qualificação da conduta do agente.
IV - Por isso, será de ter por não escrita aquela imputação genérica (...).
V - Verificando-se que: - nos presentes autos, a única actividade provada do arguido tem a ver com as duas vendas de heroína no dia 10-08-2004 (duas doses, a perfazerem o total de 1,195 g), e no outro processo [em que foi condenado na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, por autoria material de crime de tráfico de estupefacientes, por decisão transitada em 29-11-2005] está em causa a posse de 10,022 g de heroína e vendas, por três vezes, do mesmo produto, no dia 13-08-2004; - da vida anterior do recorrente nada se provou, cingindo-se a sua actividade global conhecida aos referidos factos, devendo tais intervenções do recorrente no mercado ser vistas como duas etapas de uma mesma e única actividade, como duas condutas parcelares, actos desdobrados de um mesmo desempenho, entre si conexionados por uma muito estreita proximidade temporal, estando-se perante crime que normalmente é de actuação prolongada no tempo; deve entender-se que a sua condenação pelo episódio do dia 13-08-2004 abarca toda a sua actividade, sob pena de violação do princípio ne bis in idem.
VI - A solução será, assim, por verificação de caso julgado, absolver o recorrente desta segunda condenação.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 4197/07-3, Relator: Cons. Raul Borges
Recurso directo do colectivo para o Supremo Tribunal de Justiça
I - A redacção impressa na reformulação legal do art. 432.º do CPP pela Lei 48/2007, de 29-08, entrada em vigor em 15-09-2007 [estabelecendo agora aquele preceito que dos acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo apenas é admissível recurso para este STJ, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito, caso tenha sido aplicada pena de prisão superior a 5 anos], suscita questão nova que se prende com a formação da pena conjunta no caso da realização de cúmulo jurídico em que alguma ou algumas das penas parcelares são inferiores a 5 anos de prisão e a pena conjunta resultante do cúmulo é superior a 8 anos de prisão. II - Tal questão tem de ser resolvida com o apelo aos princípios de determinação da pena de concurso e aí deverão distinguir-se dois momentos: o primeiro é o da determinação da pena que concretamente caberia a cada um dos crimes em concurso como se de crimes singulares, objecto de cognições autónomas, se tratasse, seguindo, para tanto, o processo normal de determinação da pena; o segundo momento consiste na definição da pena de concurso que resultará de uma moldura penal proveniente da conjunção das penas parcelares e da determinação da pena dentro dos limites relativos àquela moldura penal, que se efectivará em função das exigências gerais de culpa e de prevenção. Temos, assim, dois momentos possíveis de definição de pena com sujeição a critérios diferentes: a definição das penas parcelares que modelam a moldura penal dentro da qual será aplicada a pena conjunta resultante do cúmulo jurídico e, posteriormente, a definição da pena conjunta dentro dos limites propostos por aquela. III - É, quanto a nós, evidente que as penas parcelares englobadas numa pena conjunta só podem ser objecto de recurso para este STJ desde que superiores a 5 anos de prisão. Por outras palavras, dir-se-á que está, então, em causa a forma como se produziu a pena conjunta de concurso superior a 5 anos de prisão e não qualquer uma das penas parcelares relativamente à qual foi cominada pena inferior àquele limite. Sendo assim, é liminar a conclusão de que o objecto do presente recurso [em processo em que o recorrente foi condenado nas penas parcelares de 6 anos de prisão e de 1 ano e 6 meses de prisão, respectivamente por um crime de tráfico de estupefacientes e por um crime de detenção de arma proibida, e na pena única de 7 anos de prisão), nos termos do normativo citado, se cinge à pena parcelar relativa ao crime de tráfico p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93 e à pena conjunta resultante das penas parcelares determinadas.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 415/08-3, Relator: Cons. Santos Cabral
V - Existe uma diferença qualitativa entre a intercepção telefónica efectuada à revelia de qualquer autorização legal e a que, autorizada nos termos legais, não obedeceu aos requisitos a que alude o art. 187.º do CPP. Nesta hipótese o meio de prova foi autorizado e está concretamente delimitado em termos de alvo, prazo e forma de concretização, e se os pressupostos de autorização judicial forem violados estamos em face de uma patologia relativa a uma regra de produção de prova.
VI - As proibições de prova são «barreiras colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo». Mais do que a modalidade do seu enunciado, o que define proibição de prova é a prescrição de um limite à descoberta da verdade. Normalmente formulada como proibição, a proibição de prova pode igualmente ser ditada através de uma imposição, e mesmo de uma permissão. É que toda a regra relativa à averiguação dos factos proíbe ao mesmo tempo as vias não permitidas de averiguação.
VII - A proibição de prova em sentido próprio no sistema processual penal português é somente aquela norma probatória proibitiva cuja violação possa redundar na afectação de um dos direitos pertencentes ao núcleo eleito no art. 32.º, n.º 8, da Lei Fundamental, e que o art. 126.º do CPP manteve, sem alargar. VIII - Diferentemente, as regras de produção da prova – cf., v. g, o art. 341.° do CPP – visam apenas disciplinar o procedimento exterior da realização da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração. As regras de produção da prova configuram «meras prescrições ordenativas de produção da prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova (...) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor». Umas vezes pré-ordenadas à maximização da verdade material (como forma de assegurar a solvabilidade técnico-científica do meio de prova em causa), as regras de produção da prova podem igualmente ser ditadas para obviar ao sacrifício desnecessário e desproporcionado de determinados bens jurídicos.
IX - Admitindo que a circunstância de não ter sido determinada a destruição das intercepções telefónicas não transcritas, conforme determina o art. 188.º, n.º 3, do CPP, constitua uma nulidade processual, é manifesto que, pelo facto de não ter sido, oportunamente, suscitada a arguição de nulidade, se produziu a convalidação do acto processual imperfeito.
X - É que, para além da teleologia do processo penal, é o próprio dever de lealdade processual de todos os intervenientes no processo que impõe que a imperfeição seja suscitada por forma a causar o menor dano na tramitação processual e não como último argumento que se mantém resguardado para se utilizar como último recurso caso o resultado final não agrade.
XI - Aliás, e em última análise, se a intercepção utilizada consubstanciava virtualidades probatórias não concedidas em sede de inquérito pelo juiz de instrução, mas escrutinadas em audiência, então o vício praticado não foi a não destruição das intercepções, mas sim o facto de as mesmas não terem sido decididamente valoradas e consideradas como relevantes pelo mesmo juiz instrutório.
XII - O art. 8.º da CEDH permite a ingerência de uma autoridade pública, com finalidade preventiva ou repressiva, na área dos direitos fundamentais, desde que devidamente respeitadas duas condições essenciais: a legalidade, e a sua necessidade face a interesses particularmente protegidos. Assim, se forem observadas as regras de produção de prova legalmente consignadas nada impede que as intercepções telefónicas constituam o único meio de prova a fundamentar a convicção do tribunal.
XIII - Conforme referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (in CRP Anotada), para além dos pressupostos de previsão constitucional expressa e salvaguarda de direito ou interesse constitucionalmente protegido, o terceiro pressuposto material para a restrição legítima de direitos, liberdades e garantias consiste naquilo que se designa por princípio da proporcionalidade, que se desdobra em três subprincípios: o da adequação, o da necessidade ou indispensabilidade e o da proporcionalidade. O denominador comum aos três é exactamente o de equacionar a restrição que constituem em termos de direitos fundamentais com os interesses que se pretende prosseguir. Porém, tal adequação de perfil superior em termos de admissibilidade e ponderação constitucional nada tem a ver com um inusitado pressuposto processual penal de que um determinado meio de prova, desacompanhado de outro, não tem relevância para fundamentar a convicção do Tribunal.
XIV - A afirmação da recorrente de que o seu direito ao silêncio é violado pela utilização das intercepções telefónicas tem subjacente uma deturpação da teleologia do processo penal, quando não uma visão alheia a princípios fundamentais – entre os quais se encontra o da procura da verdade, seguindo pelos caminhos delimitados pelo respeito dos direitos e garantias dos intervenientes processuais, que, diga-se de passagem, não se resumem aos direitos do arguido e que, em última análise, é o direito da própria comunidade à exigência de um processo justo»
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 578/08-3, Relator: Cons. Santos Cabral
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Impedimentos
A questão colocada pelo arguido, relacionada com o facto de, em caso de repetição do julgamento do recurso, se impor a participação no respectivo julgamento de outros juízes que não os subscritores do anterior, tem a sua sede própria de enquadramento no instituto dos impedimentos, recusas e escusas, regulado nos arts. 39.º e ss. do CPP. III - Tendo dois dos juízes subscritores do acórdão ora recorrido participado em acórdãos anteriores proferidos, em recurso, no processo, um como juiz relator, o outro como juiz adjunto, encontravam-se impedidos de intervir no julgamento do recurso, devendo ter declarado esse impedimento nos autos, conforme impõe o n.º 1 do art. 41.º do CPP. IV - Não o tendo feito, e podendo o acto concretamente praticado ser repetido, com utilidade, o mesmo tem de ser considerado nulo, de acordo com o disposto no art. 41.º, n.º 3, do CPP. V - Não se encontrando tal nulidade prevista em qualquer das als. do art. 119.º, nem a sua insanabilidade cominada em qualquer outra disposição legal, maxime no art. 41.º, trata-se de uma nulidade sanável, a arguir no prazo de 10 dias a contar do momento em que o interessado tem conhecimento do impedimento do juiz ou dele devia ter tido conhecimento.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 208/08-3, Relator: Cons. Oliveira Mendes
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Imputações genéricas e caso julgado
II - A afirmação «12. O arguido ES vinha vendendo heroína a consumidores, e em resultado dessa actividade vinha adquirindo, seja por troca directa, seja por compra com dinheiro obtido na venda de heroína, inúmeras coisas, que lhe foram apreendidas e que se encontram examinadas a folhas 142 a 145, para onde se remete, e de que destacam objectos de ouro, telemóveis, relógios, câmaras fotográficas e vestuário, além de outras» corresponde não propriamente a um facto, mas antes a uma imputação genérica, com utilização de fórmulas vagas, imprecisas, nebulosas, difusas, obscuras, que é de evitar de todo em sede de fundamentação de facto.
III - Como vem sendo afirmado pela jurisprudência dominante do STJ, as imputações genéricas, designadamente no domínio do tráfico de estupefacientes, sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o aludido comércio e do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, não podem servir de suporte à qualificação da conduta do agente.
IV - Por isso, será de ter por não escrita aquela imputação genérica (...).
V - Verificando-se que: - nos presentes autos, a única actividade provada do arguido tem a ver com as duas vendas de heroína no dia 10-08-2004 (duas doses, a perfazerem o total de 1,195 g), e no outro processo [em que foi condenado na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, por autoria material de crime de tráfico de estupefacientes, por decisão transitada em 29-11-2005] está em causa a posse de 10,022 g de heroína e vendas, por três vezes, do mesmo produto, no dia 13-08-2004; - da vida anterior do recorrente nada se provou, cingindo-se a sua actividade global conhecida aos referidos factos, devendo tais intervenções do recorrente no mercado ser vistas como duas etapas de uma mesma e única actividade, como duas condutas parcelares, actos desdobrados de um mesmo desempenho, entre si conexionados por uma muito estreita proximidade temporal, estando-se perante crime que normalmente é de actuação prolongada no tempo; deve entender-se que a sua condenação pelo episódio do dia 13-08-2004 abarca toda a sua actividade, sob pena de violação do princípio ne bis in idem.
VI - A solução será, assim, por verificação de caso julgado, absolver o recorrente desta segunda condenação.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 4197/07-3, Relator: Cons. Raul Borges
Recurso directo do colectivo para o Supremo Tribunal de Justiça
I - A redacção impressa na reformulação legal do art. 432.º do CPP pela Lei 48/2007, de 29-08, entrada em vigor em 15-09-2007 [estabelecendo agora aquele preceito que dos acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo apenas é admissível recurso para este STJ, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito, caso tenha sido aplicada pena de prisão superior a 5 anos], suscita questão nova que se prende com a formação da pena conjunta no caso da realização de cúmulo jurídico em que alguma ou algumas das penas parcelares são inferiores a 5 anos de prisão e a pena conjunta resultante do cúmulo é superior a 8 anos de prisão. II - Tal questão tem de ser resolvida com o apelo aos princípios de determinação da pena de concurso e aí deverão distinguir-se dois momentos: o primeiro é o da determinação da pena que concretamente caberia a cada um dos crimes em concurso como se de crimes singulares, objecto de cognições autónomas, se tratasse, seguindo, para tanto, o processo normal de determinação da pena; o segundo momento consiste na definição da pena de concurso que resultará de uma moldura penal proveniente da conjunção das penas parcelares e da determinação da pena dentro dos limites relativos àquela moldura penal, que se efectivará em função das exigências gerais de culpa e de prevenção. Temos, assim, dois momentos possíveis de definição de pena com sujeição a critérios diferentes: a definição das penas parcelares que modelam a moldura penal dentro da qual será aplicada a pena conjunta resultante do cúmulo jurídico e, posteriormente, a definição da pena conjunta dentro dos limites propostos por aquela. III - É, quanto a nós, evidente que as penas parcelares englobadas numa pena conjunta só podem ser objecto de recurso para este STJ desde que superiores a 5 anos de prisão. Por outras palavras, dir-se-á que está, então, em causa a forma como se produziu a pena conjunta de concurso superior a 5 anos de prisão e não qualquer uma das penas parcelares relativamente à qual foi cominada pena inferior àquele limite. Sendo assim, é liminar a conclusão de que o objecto do presente recurso [em processo em que o recorrente foi condenado nas penas parcelares de 6 anos de prisão e de 1 ano e 6 meses de prisão, respectivamente por um crime de tráfico de estupefacientes e por um crime de detenção de arma proibida, e na pena única de 7 anos de prisão), nos termos do normativo citado, se cinge à pena parcelar relativa ao crime de tráfico p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93 e à pena conjunta resultante das penas parcelares determinadas.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 415/08-3, Relator: Cons. Santos Cabral
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Conjugicídio
I - A doutrina e a maioria da jurisprudência nunca consideraram que a relação conjugal pudesse ser encarada como abrangida pela al. a) do n.º 2 do art. 132.º do CP.
Conjugicídio
I - A doutrina e a maioria da jurisprudência nunca consideraram que a relação conjugal pudesse ser encarada como abrangida pela al. a) do n.º 2 do art. 132.º do CP.
II - A nova formulação deste preceito [ao qual a Lei 59/2007, de 04-09, aditou a circunstância qualificativa que passou a integrar a sua al. b) – praticar o facto contra cônjuge, ex-cônjuge, pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação, ou contra progenitor de descendente comum em 1.º grau] vem consagrar a inserção de forma autónoma do conjugicídio e situações paralelas, para além de outras, o que se justificará atendendo à evolução legislativa, que tem tido em vista o fenómeno da violência doméstica (conjugal), da violência familiar e dos maus tratos familiares (...)
III - Tal agravativa será de ter em conta apenas para o futuro, atento o princípio ínsito no comando constitucional expresso no art. 29.º, n.º 4, da CRP e concretizado nos arts. 1.º, n.º 1, e 2.º, n.º 4, do CP.
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 4730/07-3, Relator: Cons. Raul Borges
AcSTJ de 02-04-2008 Proc. n.º 4730/07-3, Relator: Cons. Raul Borges
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