quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Competência dos tribunais comunitários para fiscalizar medidas adoptadas pela Comunidade para implementar resoluções do Conselho de Segurança da ONU

O ADVOGADO-GERAL M. POIARES MADURO SUGERE QUE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA ANULE O REGULAMENTO QUE CONGELOU OS FUNDOS DE Y. KADI

Na opinião do advogado-geral, os tribunais comunitários são competentes para fiscalizar as medidas adoptadas pela Comunidade para implementar resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas. No exercício dessa competência, considera que o regulamento viola direitos fundamentais de Y. Kadi à luz do direito comunitário

Pontos principais da Opinião do A-G:

Nas suas conclusões, apresentadas hoje, o advogado-geral Miguel Poiares Maduro sugere que o Tribunal de Justiça anule o acórdão do Tribunal de Primeira Instância e anule o regulamento impugnado na parte em que diz respeito a Y. Kadi.

Em particular, o advogado-geral é de opinião de que o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro ao considerar que os tribunais comunitários têm apenas uma competência limitada para fiscalizar o regulamento. O advogado-geral Poiares Maduro afirma que são os tribunais comunitários que determinam os efeitos das obrigações internacionais no ordenamento jurídico comunitário segundo as condições estabelecidas pelo direito comunitário. Observa que a relação entre o direito internacional e o ordenamento jurídico comunitário é regulada pelo próprio ordenamento jurídico comunitário e que o direito internacional apenas pode produzir efeitos nas condições estabelecidas pelos princípios constitucionais da Comunidade. O mais importante desses princípios é o de que a Comunidade se baseia no respeito dos direitos fundamentais e no princípio do Estado de Direito.

Além disso, o advogado-geral discorda da afirmação segundo a qual proceder à fiscalização judicial seria inadequando pelo facto de o assunto em causa ser de natureza «política». Em sua opinião, a alegação de que uma medida é necessária para a manutenção da paz e da segurança internacionais não pode ter o efeito de silenciar os princípios gerais de direito comunitário e de privar os indivíduos dos seus direitos fundamentais. Pelo contrário, afirma que é quando se considera que os riscos para a segurança pública são extremamente elevados e a pressão é especialmente forte para adoptar medidas que não levem em conta os direitos individuais que cabe aos tribunais proteger o princípio do Estado de Direito com vigilância acrescida.

O advogado-geral Poiares Maduro também refuta o argumento segundo o qual, se o Tribunal de Justiça considerasse ter competência para apreciar esta questão, estaria a actuar para além dos limites do ordenamento jurídico comunitário. A este respeito, observa que os efeitos jurídicos de uma decisão do Tribunal de Justiça se limitam ao ordenamento jurídico comunitário.

Consequentemente, a seu ver, os tribunais comunitários são competentes para fiscalizar a conformidade do regulamento impugnado com os direitos fundamentais tais como são reconhecidos pelo direito comunitário.

O advogado-geral propõe que, em vez de remeter o processo ao Tribunal de Primeira Instância, seja o próprio Tribunal de Justiça a proferir uma decisão final sobre a questão de saber se o regulamento viola os direitos fundamentais de Y. Kadi.

O advogado-geral Poiares Maduro conclui que o regulamento em causa viola o direito de Y. Kadi à propriedade privada, o seu direito de audição e o seu direito à tutela jurisdicional efectiva.

Na sua opinião, todos estes direitos se encontram intimamente relacionados. O congelamento, por tempo indeterminado, dos bens de um indivíduo constitui claramente uma interferência profunda no seu direito de propriedade privada quando não existem garantias processuais que obriguem as autoridades a justificar essas medidas, como a sua fiscalização por um tribunal independente. No caso em apreço, Y. Kadi foi sujeito a graves sanções com base em sérias acusações e, no entanto, foi-lhe negada qualquer possibilidade de ver a justiça dessas alegações e a razoabilidade dessas sanções apreciadas por um tribunal independente. O advogado-geral afirma que, uma vez que não existe qualquer mecanismo de fiscalização judicial por um tribunal independente ao nível das Nações Unidas, a Comunidade não pode ser dispensada da obrigação de proceder à fiscalização judicial das medidas de implementação das resoluções do Conselho de Segurança. Se isso suceder, a inexistência daí resultante de qualquer possibilidade de Y. Kadi obter uma fiscalização independente viola os seus direitos fundamentais e é inaceitável numa comunidade baseada no princípio do Estado de Direito. Consequentemente, o regulamento deve ser anulado na parte em que lhe diz respeito.


Para aceder ao Comunicado de Imprensa:
http://curia.europa.eu/pt/actu/communiques/cp08/aff/cp080002pt.pdf

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