domingo, 29 de julho de 2007

Trindade Coelho e o direito (II)

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De modo que me vi na vida sozinho e pobre, e com mulher e um filho. Comecei a advogar, mas fugia de pedir dinheiro pelos meus serviços – e ainda estive uma temporada administrador (maire) interino de Coimbra, e o governador civil gostava de mim, mas os políticos embirraram porque a minha «política» era só... a «lei!».
Até que vim a Lisboa a dois concursos: para «conservador do registo predial» e para «delegado do Procurador Régio», mas regressei a Coimbra sem esperança de ser despachado, porque não tinha ninguém que me protegesse...
Mas um dia de manhã recebo uma carta, de Camilo Castelo Branco, o grande escritor, que eu nunca tinha visto, nem ele a mim: dizia-me que vira nos jornais que eu fora a concurso e que escrevera ao Ministro pedindo-lhe que me despachasse!
Caí das nuvens! Mas daí a poucos dias estava efectivamente despachado «delegado do Procurador Régio» do Sabugal, e eu ia ao Minho visitar o grande escritor, vê-lo pela primeira vez (primeira e última) e beijar-lhe as mãos pelo seu tão grande favor.
Mais tarde eu soube como as coisas se tinham passado: Camilo estava casualmente numa livraria do Porto, quando viu num jornal o meu nome, entre os dos outros que tinham vindo também a Lisboa fazer concurso. Constou-me que dissera:
– Ora aqui está um rapaz que provavelmente vai ser preterido por estes todos!
Perguntaram-lhe:
– Quem é?
– Um rapaz que escreve: Trindade Coelho.
Disse-lhe o livreiro (que era precisamente aquele redactor do jornal onde eu publicara o Cepticismo, o editor Costa Cantos):
– Ninguém melhor do que V. Exª para o despachar!
– Como?
– Escrevendo ao Ministro.
Camilo calou-se; e o resto já nós sabemos.
Trindade Coelho, «Autobiografia», in Os Meus Amores

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