quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Revisão do Código de Processo Penal — Nótula 8

Artigo 409.º
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— O n.º 2 actual refere-se à possibilidade de agravação em recurso da pena de multa, sem distinguir os respectivos contornos: agravação dos dias ou só da quantia fixada?

Entendia-se que dada a condição que desencadeia a possibilidade de agravação: melhoria sensível da situação económica e financeira do arguido, a agravação só podia incidir sobre a quantia fixada, a única relacionada com a melhoria daquela condição.

Foi esse mesmo entendimento explicitado na nova redacção do n.º 2.

— A propósito da alteração proposta ao art. 402.º (não prejuízo do arguido não recorrido), entendeu-se que este seria o local adequado para a consideração de tal problemática.

Na verdade, se é certo que a proibição de, em caso de comparticipação, retirar consequências desfavoráveis do julgado de um recurso em relação a arguido não recorrente, é uma limitação ao dever prescrito na al. a) do mesmo art. 402.º: «aproveitar ao co-arguido, em caso de comparticipação», deve reconhecer-se que o actual n.º 2, al. a) ao usar o vocábulo «aproveitar» já afasta o prejuízo que é exactamente o oposto.

Depois, colocam-se hoje questões, a propósito do alcance do princípio da proibição da reformatio in pejus, designadamente das suas consequências processuais, que poderiam abranger a questão levada ao n.º 3 do art. 402.º, mas que vão muito além. Questões que continuam nesta revisão sem tratamento normativo adequado.

É que as consequências também podem colocar-se em relação ao co-arguido em situações que não são de comparticipação, resultantes de apensação por conexão ou autoria paralela, e em relação ao próprio arguido recorrente.

Basta considerar, v.g., o caso em que o arguido é o único recorrente e vê, como pediu, anulado em recurso o julgamento da 1.ª instância.
O novo julgamento abrange os restantes co-arguidos não recorrentes?
E a sentença subsequente pode aplicar penas mais graves do que a infligidas no seguimento do julgamento anulado?

Esta questão já foi objecto da atenção da doutrina[1] e da jurisprudência desencontrada do Supremo Tribunal de Justiça[2], do que dá conta, com cópia de informação, um artigo publicado na MaiaJurídica[3].
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[1] Cfr.Damião da Cunha, O Caso Julgado Parcial.
[2] Como exemplo, transcreve-se o seguinte sumário de um acórdão relatado por mim.
1 - Decorre do princípio da proibição da reformatio in pejus que, se em recurso só trazido pelo arguido, for ordenada a devolução do processo, não poderá a instância vir a condenar o recorrente em pena mais grave do que a infligida anteriormente.
2 - Tal compreensão daquele princípio integra o processo justo, o processo equitativo, tributário da estrutura acusatória do processo, consagrada constitucionalmente e do princípio da acusação, que impõe que nos casos em que a acusação se conforma com uma decisão e o recurso é interposto apenas pelo arguido, ou no seu interesse exclusivo, fiquem limitados os parâmetros da decisão e condicionado no processo o poder de decisão à não alteração em desfavor do arguido.
3 - O recurso estabelece, assim, um limite à actividade jurisdicional, constituído pelos termos e pela medida da condenação do arguido (único) recorrente, mesmo se o arguido tenha pedido no recurso a anulação do julgamento ou o reenvio para outro tribunal, por se postularem as mesmas razões, sendo que a solução contrária se traduziria em atribuir ao tribunal do reenvio (ou do novo julgamento ou da devolução) poderes que não estavam cometidos ao tribunal de recurso.
4 - Se o Supremo Tribunal de Justiça, depois de alterar em recurso a qualificação jurídica efectuada nas instâncias, reenvia o processo para a determinação da medida concreta da pena, por admitir como possível a aplicação da pena de substituição de suspensão da execução, a nova decisão a proferir não só não poderá agravar a medida da pena, como só poderá manter a pena inicial fazendo a demonstração cabal de que tal se impõe no caso.
5 - Mas terá de respeitar as considerações em que se fundou o STJ para alterar a qualificação jurídica, quer na ponderação dos graus de culpa e ilicitude, quer na ponderação das circunstâncias que levaram aquele tribunal a reenviar para determinação da nova pena e a não a fixar de imediato.
AcSTJ de 08/07/2003, proc. n.º 2616/03-5
[3] De Jorge Dias Duarte, Ano I, n.º 2, pág. 205.

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