Como disse, comentarei os artigos que a Unidade de Missão se propõe alterar e outros. Um dos que não poderia faltar é o artigo 16º, n.º 3 que diz «3 - Compete ainda ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos no artigo 14.º, n.º 2, alínea b), mesmo em caso de concurso de infracções, quando o Ministério Público, na acusação, ou, em requerimento, quando seja superveniente o conhecimento do concurso, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a cinco anos». Tenho a consciência que o Tribunal Constitucional viabilizou um tal preceito. Mas sempre me pareceu a tradução de uma intromissão intolerável do MP no âmbito do poder judicial esta possibilidade de o MP «escolher» qual o tribunal competente - optando pelo juiz singular em detrimento do tribunal colectivo que seria o naturalmente competente - sem que o tribunal escolhido possa rejeitar essa «nomeação». E não se diga que o arguido beneficia, pois é contemplado com uma pena mais benigna, pois as garantias que podem resultar de um julgamento por colectivo não são de desconsiderar. E, a agravar a situação, o preceito traduz a ideia de que é o MP quem se antecipa ao poder judicial na escolha das penas aplicáveis, isto numa escolha concreta mau grado aquilo que decorre da previsão abstracta da lei. É que a situação é esta: ante uma lei que prevê para certo crime pena superior a cinco anos e julgamento por colectivo, o MP manda que não se aplicará pena superior a tal limite, ordena o julgamento por tribunal singular e o todos obedecem.
1 comentário:
A não ser um mecanismo de racionalização processual como é o art. 16.º/3 do CPP, passaríamos a ter Tribunais Colectivos a julgar o caso da arguida que deu um estalo na vizinha do andar de cima e um bofetão na vizinha do andar de baixo (2 crimes de ofensas, art. 143.º n.º 1 do CP, 6 anos de prisão = Tribunal Colectivo). Ou o caso do arguido que em dois dias diferentes furtou de um hipermercado dois objectos de valor reduzido (dois furtos = 6 anos de prisão).
Estas e muitas outras situações são - estou convencido - a enorme maioria dos casos de uso do art. 16.º/3.
E mais do que justificam tal faculdade, em obediência aos objectivos do processo penal moderno, ou seja, um processo célere, simples e, sempre que possível, consensual (e aqui se integram outros procedimentos processuais de maior celeridade e simplicidade como o processo sumaríssimo ou a suspensão do processo... ou são estas também entendidas como o "quero, posso e mando"?) .
O controlo interno de tal faculdade está previsto (comunicação obrigatória do despacho à hierarquia do MP, conforme Circular da PGR).
Já quanto a um controlo externo, o mesmo seria perfeitamente possível e mesmo desejável (exemplo: possibilidade do arguido ou assistente se oporem, ou mesmo do Tribunal, caso considerasse provável que ao caso coubesse aplicar pena superior a 5 anos de prisão).Contudo, e do que leio, tais possibilidades já haviam sido estudadas no projecto original (1987) e então não vingaram.
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