Habeas corpus - Fundamentos - Cidadão estrangeiro indocumentado - Permanência irregular em território nacional - Motivação imprópria - Excesso de prazo - Detenção
1 – O habeas corpus, tal como o configura a lei (art. 222.º do CPP), é uma providência extraordinária e expedita destinada a assegurar de forma especial o direito à liberdade constitucionalmente garantido, que tem, em sede de direito ordinário, como fundamentos, que se reconduzem todos à ilegalidade da prisão (art. 222.º do CPP):
– incompetência da entidade donde partiu a prisão [al. a)];
– motivação imprópria [al. b)]; e
– excesso de prazos [al. c)].
2 – Se um cidadão estrangeiro indocumentado, não comunitário, que entrou e permanece irregularmente em território português, é detido, em quase flagrante delito, pela prática, em co-autoria, de um crime de furto simples e é apresentado ao Juiz de Instrução Criminal nas 24 horas seguinte, verificando-se perigo de fuga e perigo de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas sendo então decretada a sua prisão preventiva por 60 dias (art. 177.º do DL n.º 34/2003 de 25/2) e feita a comunicação ao Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, não se pode falar em prisão impropriamente motivada: por facto que a lei não consente.
3 – O prazo de 48 horas de apresentação do detido ao Juiz, destina-se à apreciação da detenção e não visa a prisão preventiva decretada exactamente na sequência dessa apresentação.
Ac. do STJ de 22.06.2006, proc. n.º 2330/06-5, Relator: Cons. Simas Santos.
Recurso interlocutório - Interesse na sua apreciação - Ilegalidade das escutas telefónicas - Recorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça - Interesse em agir - Declarações de co-arguido - Exame crítico das provas - Tráfico de menor gravidade
1 – Do n.º 5 do art. 412º do CPP, introduzido pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto, resulta tão só a necessidade de especificar na motivação do recurso que faz subir o recurso interlocutório retido, o interesse na sua apreciação exactamente por que se tratar frequentemente de processos volumosos recheados de incidentes e recursos interlocutórios, que o desenvolvimento posterior vem a despir de relevância e não de retomar a motivação oportunamente apresentada.
2 – Tratando-se um recurso interlocutório sobre a legalidade das escutas, falece interesse em agir aos arguidos se a 1.ª Instância não valorou o resultado das escutas para formar a sua convicção
3 – Pois que para que o recorrente tenha interesse em agir é necessário que vise qualquer efeito útil que não possa alcançar sem lançar mão do recurso e da solução a seu favor daquela questão nenhum efeito útil retiraria.
4 – Tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça que é irrecorrível o acórdão da Relação que, em recurso que, meramente intercalar, “não pôs termo à causa”, o julga improcedente ou não toma dele conhecimento.
5 – É a posição interessado do arguido, a par de outros intervenientes citados no art. 133.º do CPP, que dita o seu impedimento para depor como testemunha, o que significa que nada obsta a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade, o que acarreta que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.
6 – O art. 125°, do CPP estabelece o princípio da admissibilidade de quaisquer provas no processo penal, e do elenco das provas proibidas estabelecido no art. 126° do CPP não consta o caso das declarações dos co-arguidos, que são perfeitamente possíveis como meios de prova do ponto de vista da sua legalidade, como o são as declarações do assistente, das partes civis, etc.
7 – Assim, o art. 133º do CPP apenas proíbe que os arguidos sejam ouvidos como testemunhas uns dos outros, ou seja, que lhes seja tomado depoimento sob juramento, mas não impede que os arguidos de uma mesma infracção possam prestar declarações no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo, nada impedindo que o arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova, ou seja, tanto sobre factos que só ele digam directamente respeito, como sobre factos que respeitem a outros arguidos.
8 – O art. 344º, n.º 3 do CPP não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova, resultante das declarações do arguido.
9 – Tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça que a proibição constante do art.º 133.º do CPP, tem um objectivo muito próprio: o de garantir ao arguido o seu direito de defesa, que facilmente se mostraria incompatível com o dever de responder, e com verdade, ao que lhe fosse perguntado, com as sanções inerentes à recusa de resposta ou à resposta falsa, mas, apesar do seu regime específico, as declarações de um co-arguido não deixam de ser um meio de prova, cujas limitações o não privam da virtualidade de influenciarem relevantemente, ou até fundamental ou exclusivamente, a convicção dos julgadores.
10 – A exigência do exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal relaciona-se com a questão do duplo grau de jurisdição em matéria de facto e deve ser entendida não no sentido de se traduzir num detalhado exame crítico do conteúdo da prova produzida, mas antes no exame crítico dos próprios meios de prova, designadamente da sua razão de ciência e credibilidade, por forma a explicitar o processo de formação da convicção, assim se garantindo que se não tratou de uma ponderação arbitrária das provas ao atribuir ao seu conteúdo em especial força na formação da convicção do Tribunal.
11 – Vem repetindo o Supremo Tribunal de Justiça que o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª Instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª Instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes se deve afirmar que os recursos, mesmo em matéria de facto, são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.
12 – O privilegiamento do crime - tráfico de menor gravidade - dá-se, não em função da considerável diminuição da culpa, mas em homenagem à considerável diminuição da ilicitude da conduta, que se pode espelhar, designadamente:
– Nos meios utilizados;
– Na modalidade ou nas circunstâncias da acção;
– Na qualidade ou na quantidade das plantas, substâncias ou preparações.
13 – Não se verifica uma considerável diminuição da ilicitude da conduta em apreciação que justifique a desgraduação da qualificação jurídica, se:
– se tratar de tráfico de droga dura (heroína) e que se prolongou por um período significativo de tempo, envolvendo necessariamente quantidades em meda de ½ Kg;
– se o arguido vendia a outros traficantes.
Ac. do STJ de 22.06.2006, proc. n.º 1426/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
1 – O habeas corpus, tal como o configura a lei (art. 222.º do CPP), é uma providência extraordinária e expedita destinada a assegurar de forma especial o direito à liberdade constitucionalmente garantido, que tem, em sede de direito ordinário, como fundamentos, que se reconduzem todos à ilegalidade da prisão (art. 222.º do CPP):
– incompetência da entidade donde partiu a prisão [al. a)];
– motivação imprópria [al. b)]; e
– excesso de prazos [al. c)].
2 – Se um cidadão estrangeiro indocumentado, não comunitário, que entrou e permanece irregularmente em território português, é detido, em quase flagrante delito, pela prática, em co-autoria, de um crime de furto simples e é apresentado ao Juiz de Instrução Criminal nas 24 horas seguinte, verificando-se perigo de fuga e perigo de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas sendo então decretada a sua prisão preventiva por 60 dias (art. 177.º do DL n.º 34/2003 de 25/2) e feita a comunicação ao Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, não se pode falar em prisão impropriamente motivada: por facto que a lei não consente.
3 – O prazo de 48 horas de apresentação do detido ao Juiz, destina-se à apreciação da detenção e não visa a prisão preventiva decretada exactamente na sequência dessa apresentação.
Ac. do STJ de 22.06.2006, proc. n.º 2330/06-5, Relator: Cons. Simas Santos.
Recurso interlocutório - Interesse na sua apreciação - Ilegalidade das escutas telefónicas - Recorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça - Interesse em agir - Declarações de co-arguido - Exame crítico das provas - Tráfico de menor gravidade
1 – Do n.º 5 do art. 412º do CPP, introduzido pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto, resulta tão só a necessidade de especificar na motivação do recurso que faz subir o recurso interlocutório retido, o interesse na sua apreciação exactamente por que se tratar frequentemente de processos volumosos recheados de incidentes e recursos interlocutórios, que o desenvolvimento posterior vem a despir de relevância e não de retomar a motivação oportunamente apresentada.
2 – Tratando-se um recurso interlocutório sobre a legalidade das escutas, falece interesse em agir aos arguidos se a 1.ª Instância não valorou o resultado das escutas para formar a sua convicção
3 – Pois que para que o recorrente tenha interesse em agir é necessário que vise qualquer efeito útil que não possa alcançar sem lançar mão do recurso e da solução a seu favor daquela questão nenhum efeito útil retiraria.
4 – Tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça que é irrecorrível o acórdão da Relação que, em recurso que, meramente intercalar, “não pôs termo à causa”, o julga improcedente ou não toma dele conhecimento.
5 – É a posição interessado do arguido, a par de outros intervenientes citados no art. 133.º do CPP, que dita o seu impedimento para depor como testemunha, o que significa que nada obsta a que preste declarações, nomeadamente para se desonerar ou atenuar a sua responsabilidade, o que acarreta que, não sendo meio proibido de prova, as declarações do co-arguido podem e devem ser valoradas no processo, não esquecendo o tribunal a posição que ocupa quem as prestou e as razões que ditaram o impedimento deste artigo.
6 – O art. 125°, do CPP estabelece o princípio da admissibilidade de quaisquer provas no processo penal, e do elenco das provas proibidas estabelecido no art. 126° do CPP não consta o caso das declarações dos co-arguidos, que são perfeitamente possíveis como meios de prova do ponto de vista da sua legalidade, como o são as declarações do assistente, das partes civis, etc.
7 – Assim, o art. 133º do CPP apenas proíbe que os arguidos sejam ouvidos como testemunhas uns dos outros, ou seja, que lhes seja tomado depoimento sob juramento, mas não impede que os arguidos de uma mesma infracção possam prestar declarações no exercício do direito, que lhes assiste, de o fazerem em qualquer momento do processo, nada impedindo que o arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova, ou seja, tanto sobre factos que só ele digam directamente respeito, como sobre factos que respeitem a outros arguidos.
8 – O art. 344º, n.º 3 do CPP não prevê qualquer limitação ao exercício do direito de livre apreciação da prova, resultante das declarações do arguido.
9 – Tem entendido o Supremo Tribunal de Justiça que a proibição constante do art.º 133.º do CPP, tem um objectivo muito próprio: o de garantir ao arguido o seu direito de defesa, que facilmente se mostraria incompatível com o dever de responder, e com verdade, ao que lhe fosse perguntado, com as sanções inerentes à recusa de resposta ou à resposta falsa, mas, apesar do seu regime específico, as declarações de um co-arguido não deixam de ser um meio de prova, cujas limitações o não privam da virtualidade de influenciarem relevantemente, ou até fundamental ou exclusivamente, a convicção dos julgadores.
10 – A exigência do exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal relaciona-se com a questão do duplo grau de jurisdição em matéria de facto e deve ser entendida não no sentido de se traduzir num detalhado exame crítico do conteúdo da prova produzida, mas antes no exame crítico dos próprios meios de prova, designadamente da sua razão de ciência e credibilidade, por forma a explicitar o processo de formação da convicção, assim se garantindo que se não tratou de uma ponderação arbitrária das provas ao atribuir ao seu conteúdo em especial força na formação da convicção do Tribunal.
11 – Vem repetindo o Supremo Tribunal de Justiça que o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª Instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª Instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes se deve afirmar que os recursos, mesmo em matéria de facto, são remédios jurídicos destinados a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.
12 – O privilegiamento do crime - tráfico de menor gravidade - dá-se, não em função da considerável diminuição da culpa, mas em homenagem à considerável diminuição da ilicitude da conduta, que se pode espelhar, designadamente:
– Nos meios utilizados;
– Na modalidade ou nas circunstâncias da acção;
– Na qualidade ou na quantidade das plantas, substâncias ou preparações.
13 – Não se verifica uma considerável diminuição da ilicitude da conduta em apreciação que justifique a desgraduação da qualificação jurídica, se:
– se tratar de tráfico de droga dura (heroína) e que se prolongou por um período significativo de tempo, envolvendo necessariamente quantidades em meda de ½ Kg;
– se o arguido vendia a outros traficantes.
Ac. do STJ de 22.06.2006, proc. n.º 1426/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
Conflito negativo de competência - Conflito negativo de competência - Acusação
Elementos constantes dos autos
1 – Tem vindo o Supremo Tribunal de Justiça a entender maioritariamente que. em regra, é aos factos descritos na acusação e imputados ao acusado que deve atender-se para definir a competência do tribunal, incluindo a territorial.
2 – Mas se dos autos constam já antes dessa peça elementos que permitem precisar o local da prática do crime, são estes atendíveis para determina a competência territorial para o julgamento do crime em causa.
3 – Nomeadamente quando tais elementos já serviram para determinar a competência do Ministério Público em conflito negativo de competência ocorrido na fase do inquérito.
Ac. do STJ de 22.06.2006 , proc. n.º 1950/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
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