Paulo Marcelo
Tornou-se um
lugar-comum dizer que a Justiça está mal. A doença é tão grave que já não
bastam paliativos, é urgente uma profunda reforma de um sistema que é rápido
numa execução fiscal, mas demora décadas a prender corruptos ou pedófilos.
Espalha-se um sentimento de impunidade que contamina a sociedade e asfixia o
próprio Estado de direito.
Paula Teixeira da Cruz
recebeu um ministério falido e os tribunais numa situação de ruptura. Apesar
dos sucessivos planos de “descongestionamento” dos tribunais, de que foi
pródigo o anterior governo, as pendências continuam a subir: 1.712.000, no
final de 2011. A situação tende a piorar com a crise que aumenta as
insolvências e a litigiosidade em geral.
É neste cenário sombrio
que temos de olhar para a reforma judiciária aprovada no último Conselho de
ministros. As intenções do Governo passam por racionalizar e simplificar o
sistema. Vejamos como.
O novo mapa judiciário,
além da extiguir tribunais com menos de 250 processos por ano – enfurecendo os
autarcas em ano das eleições – agrega os actuais 231 tribunais em apenas 23
comarcas, com sede nas capitais de distrito. A lógica é optimizar os recursos,
num único orçamento, secretaria e mapa de pessoal.
Cria-se uma nova
estrutura de gestão (juizpresidente, procurador e administrador judiciário) com
objectivos anuais fixados e avaliados segundo critérios de eficiência; os
desvios terão de ser justificados. Há uma aposta na especialização dos
magistrados, dentro de cada comarca, e são reforçados os poderes do juiz na
gestão do processo e na luta contra expedientes dilatórios.
Mas a este reforço de
poder deve corresponder uma maior exigência. Os magistrados perdem algumas das
habituais desculpas sobre a rigidez burocrática da lei. Terão de prestar
contas, não só perante os seus pares (CSM), como até aqui, mas sobretudo
perante os cidadãos que desesperam por uma Justiça mais rápida.
O novo processo civil,
apesar de apostar na desformalização, poderia ter ido mais longe na oralidade e
no modelo de sentença simplificada. São positivas a limitação de testemunhas
(10) e a obrigatoriedade de uma audiência prévia para fixação do objecto do
litígio, provas, testemunhas e datas de julgamento, evitando-se os sucessivos
adiamentos que infernizam a vida das pessoas.
Percebem-se as
intenções, louva-se a coragem, mas conseguirá a ministra mudar alguma coisa
fazendo com que as palavras simplicidade e produtividade entrem finalmente no
mundo fechado da Justiça?
As resistências serão
muitas. Mais do que mudar as leis, o difícil é mudar mentalidades, envolvendo
os magistrados, advogados e funcionários numa nova cultura judiciária, menos
pesada e formal. Apesar de se poder ter ido mais longe na reforma dos tribunais
superiores, se o Governo aprovar esta reorganização judiciária sem ceder a
interesses locais ou corporativos, será uma revolução nos tribunais
colocando-os mais aptos a servir os cidadãos e a economia.
Conseguirá a Paula
Teixeira da Cruz mudar alguma coisa fazendo com que as palavras simplicidade e
produtividade entrem finalmente no mundo fechado da Justiça?
Diário Económico,
27 Novembro 2012
Sem comentários:
Enviar um comentário