terça-feira, 12 de julho de 2011

Penhoras ilegais

Bancos fazem penhoras ilegais a pedido do Fisco
No ano passado, o Provedor de Justiça recebeu 116 queixas relacionadas com execuções fiscais.
Os bancos continuam a penhorar os saldos de contas bancárias dos clientes, à margem da lei. A denúncia é, uma vez mais, reafirmada pelo Provedoria de Justiça, no âmbito das penhoras ordenadas pelo fisco e Segurança Social. O alerta consta do relatório desta instituição referente em 2010, onde dá conta que a lista das preocupações dos contribuintes é liderada por problemas relacionados com execuções fiscais, tema que levou a 116 queixas no ano passado, à semelhança de outras tantas relativas a problemas relacionados com a tributação em IRS. O Provedor, Alfredo José de Sousa, pede a intervenção do Governo e do regulador nas penhoras ilegais realizadas pelos bancos.
“No que diz respeito aos problemas relacionados com execuções fiscais, o mais recorrente é, sem dúvida, o da violação de limites de impenhorabilidade, seja por algumas deficiências na emissão de ordens de penhora, seja – na esmagadora maioria – por graves deficiências na execução dessas mesmas ordens”, aponta o relatório da Provedoria de Justiça referente a 2010 que, em matéria de fiscalidade, revela a existência de 462 queixas. O tema não é novo e já em 2006 um estudo da Provedoria da Justiça aos serviços das Finanças concluiu, por exemplo, que não são respeitados os limites legais das penhoras e que existem deficiências nos sistemas de execuções fiscais. Já há três anos o ex-Provedor da Justiça, Nascimento Rodrigues, denunciou no Parlamento, os abusos da banca devido a penhoras, no âmbito de pagamento de impostos em atraso, que são executadas por ordem da DGCI. Com o novo Provedor da Justiça, Alfredo José de Sousa, as queixas continuaram também no que toca a penhoras executadas pela Segurança Social. Na mira está a actuação irregular de algumas instituições bancárias, que penhoram para além dos limites permitidos por lei. O montante que não pode ser alvo de penhora é o correspondente ao salário mínimo nacional (485 euros). Ilegalidades fiscais que levaram já à discussão do tema no Parlamento, em 2007, depois da conclusão de inspecções aos serviços de Finanças que o anterior Provedor mandou realizar e que concluíram: nem a DGCI nem os bancos têm pleno conhecimento da situação do executado.
A gravidade das queixas leva mesmo a que o Provedor, após a abertura de dezenas de processos para análise da regularidade de penhoras de saldos de contas bancários, aconselhe que “em 2011 se pondere a intervenção genérica na matéria”.
Isto porque, Alfredo de Sousa considera de resolução “complexa” o problema da “deficiente” execução de ordens de penhora correctamente emitidas. Desde logo, explica, porque os destinatários das ordens de penhoras de saldos de contas bancárias são as instituições de crédito junto das quais os depósitos foram constituídos, “sendo que a sua larga maioria tem natureza privada, encontrando-se, por isso, fora do âmbito de actuação do provedor de Justiça”.
O Provedor recorda as várias tentativas datadas de anos anteriores, no sentido de envolver o Banco de Portugal na resolução deste problema e que, diz, revelaram-se “pouco eficazes”.
Provedoria quer mudança da lei de rendimentos de anos anteriores
O Provedor lança duras críticas quanto ao mecanismo de reporte de rendimentos em sede de IRS. Depois de sucessivas recomendações para a alteração às regras actualmente em vigor têm vindo a revelar que, em muitos casos, para além do prejuízo causado pelo atraso no recebimento de rendimentos produzidos em anos anteriores, os contribuintes são também prejudicados em consequência da progressividade do imposto, pela alteração de escalão em que normalmente se integrariam.
Tratam-se das alterações às regras do sistema de reporte de rendimentos que já vigorou na ordem jurídica portuguesa e que foram introduzidas em 2008, tendo desde então Alfredo José de Sousa reiterado recomendações ao Ministério das Finanças para repor a transparência e equidade do sistema fiscal nesta matéria.
“Não obstante se tivesse retomado e procurado pôr termo em 2010, a um problema que, em sede de IRS, o Provedor de Justiça acompanha há já algum tempo, tal desiderato não foi, lamentavelmente alcançado”, salienta Alfredo José de Sousa no relatório. Em causa está o problema de tributação – no ano de recebimento e conjuntamente com o rendimento auferido nesse ano devencimentos pensões ou reformas referentes a anos anteriores (retroactivos), um dos temas que ocupa os lugares cimeiros na tabela dos assuntos objecto de queixas de IRS.
Diário Económico, 12 de Julho de 2011
Lígia Simões


Alerta laranja na Justiça

É preciso defender a Constituição da República
Alerta laranja na Justiça
Na área da Justiça, e dando por conhecida, nos seus aspectos essenciais, a grave situação que se vive neste sector – dificuldades no acesso, morosidade, carências de toda a ordem, nomeadamente de profissionais, desmotivação, etc. – o traço principal que caracteriza a ofensiva, política e ideológica, no actual quadro, é o aprofundamento de duas linhas que correm a par mas que convergem para o mesmo objectivo: transformar cada vez mais o poder judicial, que deve ser independente, ao serviço dos cidadãos e do regime democrático, num poder dócil e num instrumento ao serviço dos interesses dos grandes interesses económicos.
Essas duas linhas são, por um lado, a campanha, nova, de responsabilização da Justiça pelos atrasos na economia e, por outro, a continuada degradação e descredibilização da Justiça.
Só para lembrar o último caso, neste aspecto, o episódio, caricato mas muito grave, do «copianço» dos formandos do curso da escola de magistrados, não apenas constituiu mais um rombo na imagem da Justiça, mas, como sintoma grave de degradação, serve às mil maravilhas o objectivo, de que se vem falando, de entregar o CEJ e a formação de magistrados ao sector privado, para melhor a influenciar.
Quanto ao outro aspecto, nos últimos tempos, tem sido repisada a tese de que são os atrasos da Justiça que prejudicam o desenvolvimento económico.
Ainda agora, no discurso do Programa do Governo, Passos Coelho dizia que o mau funcionamento da Justiça era responsável pela paralisia da economia. Não o faz por menos, ou seja (qualquer coisa como) os investidores voltariam as costas a Portugal porque a Justiça funciona mal, e investiriam na Ásia, onde a Justiça funcionaria bem…
A Justiça tem as costas largas!
Em nossa opinião, não é a Justiça que prejudica a economia, é sim a economia desregulada e o capitalismo selvagem que prejudicam a Justiça, e que mais contribuem para afogar e paralisar os nossos tribunais.
É assim na Justiça civil, com os tribunais entupidos com acções executivas, cobrança de dívidas, despejos, etc..
É assim na Justiça laboral – tribunais de trabalho a rebentar pelas costuras, com processos de despedimento e encerramento de empresas, julgamentos marcados a três anos, por falta de juízes e funcionários, em prejuízo dos direitos dos trabalhadores.
É assim, sobretudo, com a corrupção e os elevados níveis de criminalidade económica e financeira, que de há muito minam os alicerces da sociedade, e que têm sido, eles sim, um verdadeiro cancro que corroi o nosso desenvolvimento económico.
Mas disso não falam, obviamente. Ao lermos o memorando da troika, não sendo para nós surpresa, não deixa de ser chocante, mas significativo, como referiu na campanha o Secretário-geral do PCP, que não consigamos encontrar, por muito que procuremos, nem uma medida, ou sequer uma palavra, sobre a corrupção e a criminalidade económica e financeira.
Nesse famigerado documento está tudo. Estão lá todas as medidas para que a Justiça funcione, célere, para os servir. Mas os senhores do poder e da alta finança não estão interessados em que a Justiça funcione quando ela lhes toca. E pouco os preocupa que funcione ou deixe de funcionar para realizar a justiça para os cidadãos.
Não foi por acaso que a troika não quis falar com os órgãos máximos da Justiça, designadamente o Conselho Superior da Magistratura, mas foi pronta a receber o Observatório da Justiça e alguns dos maiores escritórios de advogados.
Políticas de direita para a Justiça
Quanto ao Programa do Governo para a Justiça e à ministra, Paula T. da Cruz – é conhecido que a pessoa tem credibilidade no meio judicial, tem relações próximas com as associações sindicais, tem sido até agora uma voz dissonante, inclusive no PSD, de muitas das políticas de direita para a Justiça.
Está amarrada ao que tem escrito e dito publicamente, designadamente em defesa da autonomia do MP (questão crucial para a independência da Justiça) ou da criminalização do enriquecimento ilícito, e certamente será confrontada com tudo isso e a sua coerência vai ser rapidamente posta à prova.
O Programa vale-se desse factor – boas palavras e boas intenções, também algumas coisas que são positivas, e que o PCP tem defendido, mas muitas formulações vagas e pouco claras.
Boas intenções que são biombo que não consegue esconder sinais, preocupantes, de uma estratégia que já vem de trás – a ideia de tirar o máximo dos tribunais do Estado para a arbitragem e a mediação privada, a empresarialização dos tribunais e a produtividade dos magistrados (o trabalho pago «à peça» na Justiça, celeridade a qualquer preço), maior mobilidade, maior controle do aparelho judicial e dos conselhos superiores, mais intervenção na formação (ou formatação) dos magistrados.
Um Programa onde se detectam lacunas, graves, como a questão dos meios materiais e humanos, as condições de trabalho e a motivação dos profissionais, muito pouca concretização em matéria de reforço da investigação e combate ao crime (nem uma palavra, ou perspectiva, sobre a situação, grave, que vive a Polícia Judiciária).
Não há pois razões, também nesta área, para haver ilusões de que as coisas possam mudar muito e entrar no bom caminho. A ver vamos. Mas, seguramente interesses mais altos falarão mais alto, e desde logo relativamente aos processos judiciais.
O mais provável é que, no quadro que vivemos e com o novo cenário, a nossa troika caseira se entenda para encerrar a página «dessa coisa dos processos», e que redobrem os esforços e as pressões de toda a ordem para que o destino de todos estes processos de grande criminalidade económica – o Face Oculta, a Operação Furacão, o caso Portucale ou os Submarinos seja mesmo «ir tudo ao fundo».
É claro também que isso não será empresa fácil, nem se fará sem consequências. Naturalmente que há quem resista e é na verdade imperioso resistir e lutar. Lutar pela justiça, por uma justiça independente e soberana, contra esta tentativa, avassaladora, de domínio do poder económico, agora também, e mais do que nunca, sobre o Poder Judicial. É isso que o PCP tem feito e vai continuar a fazer, com propostas concretas e muita determinação.
Liquidar o regime democrático
Toda esta ofensiva se insere no objectivo de liquidar de vez o regime democrático, não deixando pedra sobre pedra da democracia de Abril. E aqui cabe mais uma palavra sobre a Constituição da República e a sua defesa.
Ela está, como sempre esteve, debaixo de fogo, até que consigam eliminar tudo aquilo que nela represente Abril e as conquistas alcançadas pelos trabalhadores e pelo povo.
Mas agora é mais grave. Trata-se, como alguém dizia, não apenas de tirar o povo da Constituição, mas de tirar a Constituição ao povo. E a Constituição é uma bandeira de luta.
O que está na forja, como sentimos nos discursos do 10 de Junho, é arrasador. A ir por diante nova revisão constitucional, nada os deterá. Os próprios limites materiais da revisão, que ela prevê e deverão ser respeitados, poderão ser considerados mero anacronismo, a ultrapassar.
É preciso impedir que seja aberto novo processo de revisão. Há forças e há força para lutar. Os perigos que impedem sobre a Lei Fundamental, neste choque (decisivo?) com as imposições das troikas ao nosso País e ao nosso povo justificam plenamente que seja posto em marcha um amplo e muito aberto movimento nacional que envolva organizações e sectores democráticos, em defesa da Constituição da República.
Avante
José Neto

Crime económico


Crime económico
A nova ministra da Justiça prometeu, em entrevista a este jornal, guerra ao crime económico. Não disse ainda como, mas pareceu indiciar uma aposta na especialização e formação da investigação. E deu relevo à criminalização do enriquecimento ilícito, matéria a que o Correio da Manhã deu voz com uma petição assinada por milhares de portugueses.
O crime económico é um problema grave e a sua investigação é um fenómeno recente.
Foi nos últimos anos que se multiplicaram os processos BPN, BCP, Face Oculta, Portucale, Submarinos, Parque Expo, Freeport e Operação Furacão.
Estes processos geraram milhares de notícias, centenas de arguidos, poucos condenados e quase nenhum preso. Como?
As sanções são relativamente brandas e o “trânsito em julgado” parece ser sempre longe demais.
Na investigação, é a força e a carolice de alguns procuradores (como Maria José Morgado e Rosário Teixeira) que movem os processos, mas este crime não se combate sem armas potentes e sofisticadas.
Paula Teixeira da Cruz sabe isso. Vai encomendar esse “armamento”?

Correio da Manhã, 12 de Julho de 2011

Opinião
Pedro S. Guerreiro, Director do Jornal de Negócios

DIÁRIO DA REPÚBLICA N.º 132

Foi hoje publicado o Diário da República n.º 132, Série I de 2011-07-12, e o respectivo suplemento.