Por: Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
Há um
argumento que o Tribunal Constitucional sempre rejeitou em matéria de
igualdade: a chamada "tutela da inveja". Assim, sempre se entendeu
que a circunstância de uma pessoa ter obtido um benefício que outra pessoa, em
condições idênticas, não possui não implica, necessariamente, a extinção desse
benefício em nome do princípio da igualdade.
A igualdade
implica o tratamento igualitário de situações similares e, é claro, o
tratamento diferenciado de situações distintas, na perspetiva do seu
merecimento. Uma discriminação injustificada (por exemplo, uma remuneração
diferente em função do sexo) deve ser corrigida, positivamente, através da
atribuição da regalia que foi denegada às pessoas discriminadas.
Esta ideia
vale em matéria de direitos, liberdades e garantias, mas também quanto aos
direitos económicos, sociais e culturais. Assim, o direito à assistência no
desemprego implica que o subsídio seja atribuído quer a trabalhadores do setor
privado quer a trabalhadores da Função Pública, sendo inadmissível a
discriminação negativa de quaisquer deles.
Precisamente
neste sentido, o Tribunal Constitucional deu por verificado o não cumprimento
da Constituição por ausência de subsídio de desemprego para os trabalhadores da
Função Pública, através do Acórdão nº 474/2002. Antes, só os trabalhadores do
setor privado tinham direito ao subsídio e foi uma iniciativa do Provedor que
suscitou esta decisão.
Por outro
lado, o Tribunal Constitucional sempre teve presente que a igualdade não é
diacrónica, ou seja, não podemos comparar situações verificadas em diferentes
épocas e contextos sociais. Assim, as posições alcançadas pelos reformados num
certo momento histórico, de acordo com a lei e à luz da conceção de segurança
social então vigentes, vinculam o Estado.
Nos dias
que correm, igualdade e inveja são confundidas em benefício da exploração
política. Mas é preciso que a sensibilidade e o bom senso prevaleçam.
Os compromissos assumidos perante os reformados não podem valer menos do
que os vínculos contraídos com credores que cobram juros desproporcionados num
mercado financeiro sem regras ou limites. Quem faça o discurso de honrar os
compromissos não pode sustentar a invalidade retroativa dos compromissos
assumidos perante os cidadãos mais velhos e com menor poder negocial. E os
argumentos "económicos" que consideram natural a colocação de
capitais em offshores não têm nenhuma legitimidade para condenar uma parte da
população a uma existência miserável.