Em oito meses deste ano suicidaram-se nas cadeias portuguesas oito presos. É um número que quadriplica o número de suicídios ocorridos no mesmo período do ano passado. A Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso (APAR) diz que, em parte, a culpa é dos juizes dos tribunais de Execução de Penas, que terão sido responsáveis por atrasos na apreciação dos pedidos de liberdade condicional. Fontes judiciais confirmam que, em alguns tribunais, houve atrasos devido à falta de pessoal.
Na Direcção-Geral dos Serviços Prisioais (DGSP) o número de suicídios deste ano acaba por ser desvalorizado quando comparado com a média verificada no meio livre.
A APAR, por intermédio do seu secretário-geral, Vítor Ilharco, pega no último suicídio verificado numa cadeia portuguesa - no Estabelecimento Prisional de Coimbra, no final de Julho - para responsabilizar os tribunais. "A morte de Virgílio Trindade [apareceu enforcado na cela horas depois de ter regressado de uma saída precária] é um dos exemplos do que de mau pode acontecer face ao mau funcionamento dos tribunais". Segundo o dirigente da APAR, o recluso em causa terá sido afectado pelo facto de um tribunal não especificado não ter procedido ao cúmulo jurídico de uma das penas a que estava condenado, vindo, segundo afirmou, a ser "condenado duas vezes" pelo mesmo delito. Esta versão não foi, no entanto, confirmada por fontes judiciais contactadas pelo PÚBLICO e nem sequer foi admitida como verdadeira pelo próprio director da DGSP, Rui Sá Gomes.
A mesma fonte judicial, que solicitou anonimato, confirmou, no entanto, que se têm verificado ao longo deste ano "alguns atrasos" na apreciação dos pedidos de liberdade condicional. Esses atrasos, que segundo adiantou o mesmo responsável se verificaram em tribunais de Execução de Penas da região Norte, foram uma consequência "da falta de meios humanos". "Actualmente o problema já está solucionado", adiantou outro responsável conhecedor do problema.
Para o director da DGSP, os "eventuais" problemas de falta de pessoal nos tribunais não serão os responsáveis pelo número de suicídios. "A questão [oito suicídios nos primeiros oito meses contra apenas dois em igual período de 2011] não pode resultar numa leitura que aponta para uma eventual degradação das condições do sistema prisional. Recorda que durante todo o ano passado se verificaram 11 suicídios nas cadeias portuguesas, sendo que apenas dois ocorreram no primeiro semestre. Que dizer então em relação ao número de mortes verificadas na segunda metade do ano?"
Rui Sá Gomes lembrou depois que a actual taxa de suicídios no meio prisional é "muito inferior" à taxa de suicídios no meio livre. "O Programa de Prevenção de Suicídios que existe na DGSP inclui psicólogos, psiquiatras, guardas prisionais, enfermeiros, visitas e os próprios reclusos que convivem com aqueles que possam estar mais expostos. Os números dão razão quanto ao êxito do programa. Em anos anteriores o número de suicídios chegava facilmente às duas dezenas, o que ultimamente não acontece. Infelizmente não é possível contabilizar o número de mortes que se evitam devido à intervenção de todos os que estão incluídos no programa".
As patologias e depressões associadas ao meio prisional continuam a ser as principais causas dos suicídios dos reclusos, os quais optam, em 100% dos casos, pelo enforcamento. "Infelizmente não é possível evitar todas as mortes, pelo que ninguém pode garantir que, por muitos melhoramentos que se façam no sistema prisional, alguém venha um dia a garantir que não existirão mais suicídios", acrescentou Rui Sá Gomes, da DGSP.
Público 01-09-2012