sábado, 3 de novembro de 2012

Garantia da "coesão social" é uma das funções "essenciais" do Estado - Laborinho Lúcio

Lisboa, 03 nov - O antigo ministro da Justiça Laborinho Lúcio defendeu hoje que quando se repensa as funções do Estado deve ter-se em conta que uma das dessas funções "essenciais" é garantir a "coesão social", definida pelo limite da "dignidade humana".
Garantia da coesão social é uma das funções essenciais do Estado - Laborinho Lúcio
19:12 - 03 de Novembro de 2012 | Por Ana Clotilde Correia
Lisboa, 03 nov - O antigo ministro da Justiça Laborinho Lúcio defendeu hoje que quando se repensa as funções do Estado deve ter-se em conta que uma das dessas funções "essenciais" é garantir a "coesão social", definida pelo limite da "dignidade humana".
"Independentemente das conjunturas, quando repensamos as funções do Estado, sobretudo quando repensamos as funções do Estado moderno e quando repensamos as funções de um estado moderno europeu, que a despeito de já não estar e bem investido de um pensamento eurocentralista, não perdeu o direito de ser ainda um legítimo defensor de valores essenciais sobre os quais se construiu como Europa", afirmou Laborinho Lúcio.
O magistrado argumentou que, "se assim é, esta ideia de solidariedade pode conduzir e deve conduzir à afirmação de que uma das funções essenciais do Estado é a garantia da coesão social".
"Não estou a falar de estado social, estou a falar da garantia da coesão social. Isto é, para o Estado, até porque a Constituição o impõe logo no seu artigo primeiro, há um limite baixo do qual não pode não pode intervir-se, esse limite é o que é definido pela dignidade humana", sustentou.
"Abaixo da dignidade humana não pode chegar-se e por isso é aí que nós temos que definir o espaço próprio de afirmação da coesão social como função essencial do Estado", afirmou.
Na conferência "Portugal, o país que queremos ser", promovida pela Comissão Nacional de Justiça e Paz, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, Laborinho Lúcio referiu-se igualmente aos "três produtos do pensamento único: estabilidade, previsibilidade e inevitabilidade".
"Claro que a estabilidade é um bem em si mesmo, claro que a estabilidade pode ser um objetivo, agora o que a estabilidade não pode ser é um pressuposto. A estabilidade não é um ponto de partida, será um ponto de chegada", afirmou.
Laborinho ilustrou que "foi rejeitada a possibilidade de referendar o Tratado de Lisboa, exatamente aos mesmos cidadãos a quem hoje se pedem os sacrifícios necessários para salvar a pátria".
"Isto é, quando se tratou de exercer um direito sentiu-se que a estabilidade impunha que se esse direito não fosse exercido", sublinhou.
Por outro lado, "a previsibilidade não é mais do que aquilo que chamamos o politicamente correto, em que cada um diz ao outro o que o outro gosta de ouvir", sendo que "a previsibilidade é a estagnação do pensamento, estagnação da importância da convicção, a estagnação da importância do conflito".
Estabilidade e previsibilidade "levam ao último elemento do pensamento único, a inevitabilidade", que é "a castração da democracia, é a anulação do papel ativo e modificador de uma sociedade civil", defendeu.
"Mais do que isso, é o caminho para a neutralização dos valores e da cultura", disse.
ACL // PGF.

Prova penal

Miranda Vázquez, Carlos de, Probática penal T.1: La prueba de los delitos contra la Administración de Justicia, Editora: La Ley Actualidad, : Madrid 2012, ISBN: 9788490200360

Resumo do livro

En el momento presente la Probática es una disciplina en pleno auge. La cuestión de hecho ya se ha granjeado el interés de los operadores forenses y ha crecido enormemente la demanda de formación en técnica probatoria. La Probática como ciencia ya ha asentado sus bases teóricas y su aplicación práctica en el ámbito jurídico privado ha tenido una acogida muy favorable en el foro. Ahora, la probática aplicada llega a la esfera jurídico penal. La presente obra es la primera entrega de una colección que aborda la problemática de la prueba de distintos tipos penales. Y no sólo tiene interés disponer de un exhaustivo compendio de experiencias acerca de cómo probar tal o cual delito. También interesa contar con algunas sugerencias sobre cómo proceder en su investigación.

En este libro se tratan exclusivamente los principales delitos contra la Administración de Justicia.

— ¿Cómo probar de manera eficiente que una denuncia es falsa?

— ¿Cómo convencer al Juzgador de que un hurto fue inspirado por el ánimo de resarcirse de un derecho subjetivo insatisfecho y no se debió al mero ánimo de lucro?

— ¿Cómo demostrar que un sujeto agredió a otro con el expreso propósito de vengarse por la actuación de la víctima como testigo en un juicio?

— ¿Cómo acreditar que la vulneración de una orden de alejamiento fue dolosa?

El lector encontrará respuesta a estas preguntas y a otras muchas en las páginas de este libro.

Estatuto

Referir qualquer perda de rendimento não será "politicamente correcto", porque perpassa todas as profissões e classes sociais, com os níveis de desemprego conhecidos. Com base no que tenho aprendido, tento explicar a diferença entre o Juiz 'Funcionário Público' e o Juiz tal como a Constituição da República Portuguesa o define.
Em termos salariais, por ora e até ver, a perda de rendimento seria precisamente a mesma, independentemente de estar bem ou mal pago. Existe apenas uma "ligeira diferença". O Juiz 'Funcionário Público' poderá correr o sério risco de perder a independência. O Juiz tal como o prevê a CRP não.
A independência de um poder/dever na função de julgar é a grande garantia posta ao serviço dos cidadãos. Basta imaginar um legítimo pedido de indemnização de um cidadão contra o Estado/Administração a ser julgado por um "funcionário" dessa mesma Administração.
Usando linguagem futebolística, ninguém achará concebível que uma equipa possa ter o poder de escolher e dar ordens ao árbitro.
E, confesso que apenas vejo uma única forma de assegurar esta independência: conferir e manter um Estatuto correspondente à sua concepção constitucional e cuja alteração dependesse de uma maioria alargada.
Alexandra Veiga, Juíza de Direito
Correio da Manhã 3-11-2012

Terão de fazer 50 km para ir ao tribunal

Terão de fazer 50 km para ir ao tribunal

SANTO TIRSO

A CÂMARA de Santo Tirso contestou, ontem, a última proposta de reorganização dos tribunais, argumentando que obrigaria os cidadãos do concelho a percorrer 50 quilómetros para dirimirem alguns conflitos judiciais, e para algumas zonas que não têm transportes públicos.

A terceira versão do mapa judiciário prevê que o Tribunal de Santo Tirso fique apenas com competências genéricas nos foros cível e criminal e uma secção especializada de comércio.

De acordo com esta proposta, a população de Santo Tirso terá de se deslocar à Maia (para tratar de execuções), a Matosinhos (questões de trabalho, família e menores e instrução criminal), a Vila do Conde (grande instância criminal) ou Póvoa de Varzim (grande instância cível).
Jornal de Notícias 3 de Novembro 2012

Domingos Névoa perde recurso

BRAGAPARQUES O Tribunal Constitucional chumbou esta semana um recurso de Domingos Névoa que pretendia declarar ilegais os meios de prova usados pela PJ para o envolver numa alegada tentativa de corrupção ao advogado Ricardo Sá Fernandes. Ainda assim, o dono da Bragaparques não pode ser definitivamente considerado culpado ou inocente, porque o processo que o condenou por corrupção para ato lícito e ao pagamento de 200 mil euros foi entretanto declarado prescrito. "Só recorremos porque não queríamos ganhar na secretaria", esclarece o advogado, Artur Marques. O queixoso do processo, José Sá Fernandes, vereador da Câmara de Lisboa, recorreu da prescrição.
Expresso 3 de Novembro de 2012

Autores do parecer ‘queixam-se’ à PGR "RACIONAMENTOS" NA SAÚDE

O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) vai pedir à Procuradoria-Geral da República (PGR) que se pronuncie sobre a 'ameaça' do bastonário da Ordem dos Médicos (OM) de processar os conselheiros pela autoria de um parecer sobre a utilização das terapêuticas mais caras no SNS. "Na próxima semana, vamos perguntar à PGR se o procedimento do bastonário e do Conselho Nacional Executivo da OM, configura um delito de opinião", adiantou o presidente do CNECV, Miguel Oliveira da Silva. "E no mesmo dia, a OM será informada sobre os pormenores dessa diligência".

O bastonário, José Manuel Silva, recuou na intenção de atuar disciplinarmente contra os elementos do CNECV, alegando que o parecer não teve aplicação prática. Argumento que Miguel Oliveira da Silva contesta: "O assunto teve um grande impacto na sociedade e o ministro da Saúde já enviou o parecer ao Infarmed".
Expresso 3 de Novembro de 2012

Moura Guedes 'perdoa' a José Sócrates

A jornalista "perdoa" ao cidadão José Sócrates, a quem não reconhece estatuto para a difamar. O processo era contra o PM

Manuela Moura Guedes desistiu esta semana da queixa por difamação apresentada ao Supremo Tribunal de Justiça contra o ex-primeiro-ministro. A jornalista justifica a sua desistência porque o processo se destinava ao então chefe do Governo e não ao cidadão, a quem "não reconhece as qualidades necessárias para a difamar".

O processo surgiu em 2009, na sequência de uma entrevista em que o ex-primeiro ministro acusava o "Jornal Nacional" da TVI de ser "uma caça ao homem" e de Moura Guedes fazer "jornalismo travestido". O caso estava em análise no STJ, tendo Sócrates indicado como testemunhas Almeida Santos e Arons de Carvalho. Moura Guedes apresentava em sua defesa Pinto Balsemão e Paulo Portas.

Esta semana, quando as testemunhas do ex-primeiro ministro se preparavam para ser ouvidas, o advogado de Moura Guedes declarou que a jornalista "perdoa ao senhor José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa as afirmações insensatas que o mesmo proferiu". Alegou que o processo deixou de fazer sentido quando "o povo português, na sua secular sabedoria, apontou ao então primeiro-ministro o caminho de saída".

Moura Guedes assume rever-se "na censura do povo português" ao ex-líder socialista e admite que "nunca faria com que os tribunais da sua pátria perdessem tempo a analisar as afirmações" do cidadão Sócrates.
Expresso, 3 de Novembro de 2012

O Orçamento do Estado ficou fechado nos gabinetes e na comissão

Reportagem. Debate agora é na especialidade e agenda de ontem foi curta. No Parlamento de corredores vazios trabalhou-se nos bastidores
MIGUEL MARUJO
Um Parlamento de corredores vazios, sem a agitação habitual das manhãs de sexta. Não houve plenário e a agenda no site da Assembleia de República apenas indicava a reunião da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), pelas 11.00, que deu o pontapé de saída no debate na especialidade do Orçamento do Estado (OE) para 2013. Mas foi mesmo na especialidade: estiveram presentes deputados dos cinco partidos que a integram (o DN contou pouco mais de 20).
Outros dois deputados, um do PSD, outro do PS, falaram aos jornalistas sobre atualidade. Nos gabinetes estiveram mais deputados. Quantos no total, não se sabe.
O PCP confirmou ao DN que estiveram todos – exceto Jerónimo de Sousa, que esteve fora noutras atividades -, em reunião a analisar o OE. Os comunistas receberam ainda diversas entidades. Dos dois deputados de “Os Verdes”, Heloísa Apolónia esteve no seu gabinete e José Luís Ferreira numa reunião na sede do partido. O BE teve cinco dos seus oito deputados. E o CDS uns dez, com os restantes fora em trabalho. Também questionados pelo DN, o PSD e o PS não responderam a tempo.
Ninguém assumiu qualquer “ponte” informal dos deputados, após o feriado de 1 de novembro, celebrado quinta-feira e que para o anoja não se comemora, depois de “eliminado” pelo Código do Trabalho (por cinco anos, como tem insistido a Igreja Católica).
Do gabinete da presidência da Assembleia da República – que ontem também não teve agenda pública, como se vê na sua página da Internet – foi dito ao DN que “foi um dia normal”, ressalvando as características especiais de funcionamento do Parlamento em época de OE.
Os plenários estão suspensos e o registo público de faltas só se faz nessas sessões.
A COFAP acolhe nestes primeiros 15 dias de novembro as audições dos ministros, para discussão do Orçamento, reuniões que ocorrem na sala de plenários para permitir a participação alargada dos deputados interessados.
O calendário aprovado em conferência de líderes estabeleceu para o período de “entre 2 e 15 de novembro” a “discussão na especialidade na COFAP”. Numa primeira versão do calendário, o dia 2 surgia sem nada. Só depois foi marcada a reunião de ontem da COFAP.
Contactados os serviços da comissão, no início da semana, estes esclareceram o DN que o dia estava assim propositadamente para marcar audições com as entidades que o pedissem, no âmbito da discussão do OE. Na agenda de ontem, além de outros assuntos da COFAP, foi ouvida a Associação Sindical dos Juizes Portugueses.
Para a semana, os trabalhos da especialidade arrancam a sério, já na segunda-feira (dia que habitualmente é dedicado a trabalho político junto do eleitorado) . O primeiro a ser ouvido é o ministro da Defesa Nacional, Aguiar-Branco. Na semana passada, o PS ensaiou um encurtamento do calendário de discussão do OE, mas as outras bancadas rejeitaram essa pretensão.
As sessões plenárias regressam no dia 27 com o encerramento e a votação final global do OE. O último plenário realizou-se na quarta-feira passada e ficou marcado pela aceleração dos trabalhos para não coincidir a votação na generalidade com a manifestação prevista para esse dia. Muitos deputados deixaram São Bento, pelas 15.00, depois da polícia ter aberto um corredor permitindo a saída dos seus carros.
Diário Notícias, 3 Novembro 2012

Reportagem Homicídios conjugais aumentam por causa da crise

Quando o amor faz morrer. Número de homicídios conjugais está a aumentar
Especialistas defendem que a crise e o desemprego poderão explicar subida
ROSA RAMOS
Carla e Leonor nunca chegaram, provavelmente, a cruzar-se em vida E tão pouco devem ter imaginado que um dia viriam a partilhar a mesma frase inscrita no final das suas biografias. Morreram com nove dias de diferença, assassinadas a tiro pelos companheiros. Carla tinha 38 anos e o filho ao colo. Foi alvejada pelo namorado no dia 7 de Outubro, em Setúbal, a meio de uma discussão. Leonor, 76 anos, sofria de Alzheimer e foi morta pelo marido às 10 da manhã do dia 16 na pequena vivenda de pedra que partilharam durante décadas nos arredores de Melgaço.
Nos dois casos, os homicidas acabaram por se suicidar logo depois.
Os nomes de Carla e Leonor são os últimos a figurar na base de dados do Observatório de Mulheres Assassinadas – projecto coordenado pela organização não governamental Associação de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) – que, nos últimos anos, se tem dedicado a compilar e estudar as histórias de mulheres assassinadas em contexto conjugal com base em recortes de imprensa.
Este ano, segundo os dados recolhidos pelo observatório, já foram registados, até ao início de Outubro, pelo menos 33 homicídios e 31 tentativas de homicídio.
Ao longo de todo ano passado, ocorreram 27 mortes e 44 tentativas. “As estatísticas parecem mostrar que, de facto, os homicídios conjugais são os que mais têm aumentado”, confirma o antigo inspector da Polícia Judiciária (PJ) António Teixeira, ressalvando, no entanto, que se poderá tratar de um aumento “meramente sazonal”. Cristina Soeiro, a psicóloga da PJ que trabalha com casos de abusos sexuais e homicídios, prefere ser mais cautelosa e avisa que para se poder falar num aumento de um fenómeno em termos de criminalidade é preciso estudá-lo “durante pelo menos dez anos”. Mesmo assim, a especialista admite que este ano se verifica uma subida no número dos homicídios ocorridos em contexto conjugal.
Uma das razões que poderão explicar o aumento tem a ver, acredita António Teixeira, com a subida do desemprego e a própria crise económica. “Os casais passam mais tempo em casa e se já existir, na relação, um historial de violência e de conflito, a proximidade pode agudizar os problemas”, explica o antigo investigador. A questão da proximidade é, aliás, a explicação mais referida para o facto de as estatísticas revelarem que a maioria dos homicídios em contexto conjugal ocorre entre Maio e Novembro, com maior predominância nos meses de Verão – altura em que os casais tiram férias.
UM TERÇO DAS MORTES SÃO ENTRE CASAIS
A psicóloga íris Almeida, que participou num estudo envolvendo uma amostra de 125 casos de homicídios conjugais investigados pela PJ entre 2000 e 2010, também admite que a crise poderá estar relacionada com o aumento destes crimes. Nos últimos 11 anos foram assassinadas 278 mulheres – a maioria nos distritos de Lisboa, Porto e Setúbal. “Os números anuais têm-se mantido mais ou menos estáveis, embora 2008 tenha sido o ano em que se registaram mais casos. Em 2009 e 2010 houve um declínio, mas existe a percepção de que no ano passado e este ano se tem verificado um aumento significativo”, diz.
A psicóloga, responsável pelo estudo “Morrer no feminino”, recusa no entanto que a crise seja a causa directa que conduz a mais homicídios – apesar de admitir que possa ter influência “As relações que apresentam maiores riscos de violência são as mais precárias e aquelas em que quer a vítima quer o homicida estão desempregados”, explica. “O desemprego leva a uma maior convivência entre o casal e se já existir uma história de violência e de ameaças, as discussões poderão culminar mais facilmente no cenário de morte”, acrescenta a investigadora Além disso, conta fonte da PSP, estão a aumentar os casos de violência doméstica na sequência de discussões relacionadas com questões económicas. “A maioria das famílias atravessa problemas financeiros e há muitas situações de divórcio em que os cônjuges continuam a partilhar a mesma casa por falta de alternativas.”
Independentemente das motivações, as estatísticas mostram que um terço dos homicídios registados anualmente ocorrem entre marido e mulher. Um número que o próprio director-nacional adjunto da PJ considera “muito significativo”. Pedro do Carmo defendeu recentemente no seminário “Morrer no feminino: da Prevenção à Intervenção”, promovido pela Escola da Judiciária, que são precisas estratégias preventivas para combater o fenómeno: “Se porventura estivéssemos mais atentos, se os sinais fossem mais rapidamente percebidos, se a actuação fosse mais célere e eficaz talvez estas mortes pudessem ser evitada.” Pedro do Carmo alertou ainda para o facto de existir uma mudança no perfil dos homicidas. “Tenho a percepção de que estes crimes ocorrem em casais com idades cada vez mais jovens. Não é raro termos notícias de homicídios em namoros”, adiantou.
Mesmo assim, no ano passado o grupo etário entre o 36 e os 50 anos foi o que registou mais homicídios. Mais de metade (52%) das mortes foram provocadas com o recurso arma branca, 33% com arma de fogo, 7% com outros objectos comopás e machados -, enquanto que 8% das mulheres foram assassinadas por asfixia e estrangulamento. As estatísticas demonstram, por outro lado, que a residência continua a ser o espaço onde ocorre a maioria dos homicídios (93%).
HOMENS MATAM MAIS 
Quase sempre, os homicídios em contexto conjugal são praticados por homens. Um estudo desenvolvido no Instituto de Medicina Legal do Porto, feito a partir de autópsias, permitiu concluir que a violência conjugal é o crime que mais frequentemente (61%) vitima mulheres, traçando um retrato brutal de destruição que atinge toda a família As investigadoras Ana Rita Pereira e Teresa Magalhães concluíram que em 21% dos crimes havia crianças ou adolescentes a assistir à morte.
De qualquer forma, o psicólogo criminal Carlos Poiares acredita que, nos últimos anos, têm aparecido mais casos de mulheres agressoras e homicidas. “E também se nota que elas usam cada vez mais armas, enquanto que há uns anos, até por uma questão de terem menos força física, optavam por métodos mais suaves”, acrescenta o ex-inspector da Judiciária António Teixeira. “Normalmente, as mulheres usam meios mais insidiosos, vão matando aos bocadinhos. Neste aspecto são mais frias, mais calculistas e são até mais difíceis de interrogar”, garante um outro inspector da Judiciária já reformado. Cristina Soeiro acrescenta que a criminalidade violenta “é sempre mais expressiva nos homens”.
O que se explica não só pela força física, mas também por questões orgânicas e bioquímicas. “Os homens têm, por exemplo, maior probabilidade de desenvolver psicopatias”, explica a psicóloga da PJ.
Elizabete Brasil, directora executiva para a área da violência da UMAR, prefere atribuir a maior prevalência de crimes desta natureza contra mulheres às questões culturais. “Ainda vivemos numa sociedade patriarcal, em que as mulheres são entendidas como sendo o elo mais fraco e como um objecto de posse”, diz.
Por isso, a UMAR defende ser preciso apostar mais em estratégias de prevenção primária para que, a médio-longo prazo, os homicídios conjugais possam diminuir. “Há que educar os jovens e as crianças para que percebam que o estereotipo da mulher enquanto propriedade do homem não é aceitável”, defende a responsável.
As estatísticas revelam que quando matam, as mulheres fazem-no mais frequentemente em casa (57,7% dos casos) que os homens – que optam muitas vezes pelos locais públicos. No entanto, segundo o estudo “Homicídio e doença mental” apresentado na Universidade de Ciências Médicas de Lisboa pelos psicólogos Margarida Oliveira e Rui Abrunhosa Gonçalves, quando eles cometem o crime dentro de portas, escolhem quase sempre a casa da vítima (34,1%).
PERFIL 
A investigação levada a cabo pela psicóloga Íris Almeida permitiu concluir que as vítimas têm, por norma, entre os 17 e os 80 anos e os agressores entre os 20 e os 80. A maioria dos 125 casais estudados (52,8%) tinham uma relação conjugal, 15,2% viviam em união de facto, 10,4 eram ex-companheiros, 6,4% amantes, 5,6% ex-cônjuges, 5,6% ex-namorados e 4% namorados. Quase metade (48,8%) estavam em processo de separação e 16% tinham filhos de relacionamentos anteriores. “Genericamente, podemos falar em quatro perfis distintos de homicidas”, explica a investigadora.
No primeiro grupo enquadram-se os homicidas que se suicidam após cometerem o crime. Muitas vezes, além de matarem a companheira, estes homicidas assassinam também outros membros da família, geralmente os filhos. “É comum que exista um histórico de depressão, consumo de álcool ou medicamentos”, conta íris Almeida Neste perfil encaixam-se os agressores mais velhos, normalmente movidos por perturbações do foro psicológico.
António Teixeira recorda-se de um caso que obrigou os inspectores da PJ dar voltas à cabeça. Num vivenda, foram encontrados três cadáveres deitados no chão: um casal e o filho de ambos. A casa estava remexida e tudo apontava para que se tratasse de um assalto. Mas um pequeno frasco, completamente vazio e sem rótulo, chamou a atenção dos investigadores. Mais tarde, os exames toxicológicos vieram a revelar a presença de um pesticida no corpo do homem. Afinal não se tratava de um triplo homicídio, mas de um duplo homicídio seguido de suicídio. O homem esfaqueou a mulher, sufocou o filho e depois cortou-se com a faca, antes de ingerir o pesticida.
O segundo perfil engloba os homicidas que agem em contexto de relações íntimas. “São indivíduos que já têm um histórico de violência na relação, muitos já têm registo criminal por violência doméstica”, explica a psicóloga. Também aqui se encontra frequentemente associado o consumo de álcool. Nestes casos, os homicídios acontecem muitas vezes no seguimento de discussões e com o recurso a armas brancas que estejam à mão.
Foi precisamente durante uma discussão que um engenheiro da Portucel matou a mulher, em 2002, depois de descobrir que andava a ser enganado.
Quando ela chegou a casa, confrontou-a com as suspeitas e ela não negou. Mais tarde, já no tribunal, o homem viria a confessar como a matou. “Disse-me que tinha estado com ele e eu senti-me… senti-me com inveja, enjoado, revoltado. (…) Disse-me que já tinham tido relações naquela cama. Eu… eu perdi o controlo… Senti o raciocínio perturbado… Nunca tinha ficado naquele estado… E… e… o meu impulso foi fazer… foi parar aquela tortura. Só. quando levantei os olhos e vi o quarto da minha filha através da porta percebi que ela tinha perdido a mãe e o pai naquele instante. Ela já não apresentava sinais de vida”, lê-se no processo a que o i teve acesso.
Neste caso não havia registo de agressões anteriores, mas Cristina Soeiro revela que a análise aos casos investigados pela PJ mostra que, no momento do homicídio, 17% dos agressores já tinham cadastro por violência doméstica e que em 32% das relações que acabaram em morte já havia historial de agressões.
No terceiro grupo-tipo surgem os homicidas movidos por questões relacionadas com separações. “São pessoas que não aceitam o fim de uma relação e que a vítima tente afastar-se”, sublinha íris Almeida É aqui que se encontram os criminosos mais jovens e, normalmente, com empregos precários. “São mortes associadas à noção de poder e de controle”, acrescenta Cristina Soeiro.
“Normalmente, o homicídio não acontece logo a seguir à ruptura, mas tempos depois, geralmente quando a vítima arranja um novo relacionamento. O sentimento de posse e a rejeição são, aliás, as principais motivações dos crimes em contexto conjugal. O amor torna-se num objecto de obsessão e o homicida acredita que se aquela pessoa não é para ele não poderá ser para mais ninguém”, diz António Teixeira. Neste perfil encaixa, por exemplo, a história de um casal de africanos muito jovem da zona de Coimbra, investigada pela PJ há uns anos. Depois da separação, ela saiu de casa. Voltou algum tempo depois, acompanhada por uma amiga, para ir buscar roupa. O ex-marido, convencido de que a tinha perdido para outro homem, baleou-as assim que entraram no apartamento.
Existe ainda um quarto grupo, que engloba os homicidas mais violentos. São homens que antes de cometerem o crime já tinham ameaçado fazê-lo várias vezes. Alguns têm, até, antecedentes por tentativa de homicídio. Apresentam normalmente problemas de transtorno da personalidade, como psicopatias. São os únicos que planeiam minuciosamente o homicídio, recorrendo, por norma, a armas de fogo.
NUNCA É POR amor 
Quaisquer que sejam as motivações dos homicidas, Cristina Soeiro, que lida com casos desde o início da década de 1990, refere que há factores de risco a ter em conta. “Como um historial de psicopatologias, quadros de instabilidade social. São indivíduos com um baixo controlo dos impulsos”, descreve. De qualquer forma, a psicóloga da Judiciária rejeita a ideia de que os homicídios em contexto conjugal sejam motivados por amor. “A razão nunca é o amor, mas sim sentimentos que se desenvolvem a partir do amor o ciúme patológico, a raiva, o sentimento de poder e de domínio em contextos de separação”, refere.
No estudo que desenvolveu, a psicóloga Íris Almeida concluiu que para 38,4% dos homicidas a motivação do crime foi exactamente o sentimento de poder ou controlo (“não és minha, não és de mais ninguém”). Depois, 33,6% mataram por ciúmes, que podiam ser reais ou imaginários, e 16% agrediram durante uma discussão.
Os dados recolhidos a partir de casos investigados pela Polícia Judiciária sugerem ainda que 9,6% dos agressores sofriam de problemas de dependências de substâncias ou problemas de saúde mental e 2,4% tinham outras motivações, como problemas económicos.
i3 Novembro 2012