segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Acção pela Justiça


Opinião
Por: Rui Cardoso, Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
A reacção popular ao anúncio das novas medidas deausteridade, nomeadamente através das manifestações de sábado, deve ensinar a quem apenas sabe economês ou financês que um dos valores mais fortes dentro decada um é o da Justiça e que a sua procura é das maiores forças mobilizadoras das pessoas. Desde sempre, a luta contra a injustiça tem sido a grande impulsionadora de mudança social. A base da sociedade é a Justiça!
Os acontecimentos dos últimos tempos também revelam que pouco interessa ter direitos sem a sua efectivação prática e que esta só existe com tribunais independentes e actuantes. Sem isto, leis são apenas tinta sobre papel, miragens num deserto de descrença. É determinante o papel do MP para a intervenção dos tribunais na concretização dos direitos e para a extensão da lei a todos, incluindo os detentores de poder político ou económico, ou seja, para a existência de Justiça. A vontade, determinação e capacidade para levar o MP a assumir eficazmente todas as suas funções como defensor da Constituição e do Estado de Direito devem ser critérios determinantes na escolha do próximo PGR.
Correio da Manhã 2012-09-17

SegurançaSocial tem 154 técnicos para 37 mil casos de regulação parental


Por GraçaBarbosa Ribeiro
O provedor de Justiça, AlfredoJosé de Sousa, apelou em Julho à implementação de medidas urgentes. O ministroda Solidariedade e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, ainda não respondeu
O Conselho Directivo do Instituto deSegurança Social (ISS) diz que, actualmente, há atrasos médios de oito a 12 meses na resposta aos pedidos dos tribunais de família feitos no âmbito deprocessos de regulação das responsabilidades parentais. Isto deve-se à falta derecursos humanos: existem apenas 154 técnicos para as cerca de 37.000solicitações que, calcula, serão feitas este ano. O provedor de Justiçaconsidera a situação “grave” e “preocupante” e pede medidasurgentes.
O pedido de esclarecimentos ao ISS foi originado pelas queixas que têm chegadoà Provedoria de Justiça – 31 em 2011 e 23 até Agosto deste ano. A situaçãoassumida pela direcção do ISS, em resposta assinada pela presidente do CD,Mariana Ribeiro Ferreira, corresponde àquilo que tem vindo a ser denunciado porvárias entidades, entre as quais a Associação Para a Igualdade Parental (APIP)e a Associação Pais Para Sempre (APPS). Incluindo no que respeita ao facto deos “oito meses a um ano” de atraso corresponder à média e de assituações mais graves se verificarem nos distritos de Lisboa, Setúbal e Braga.
Ao PÚBLICO, os dirigentes da APIP, Ricardo Simões, e o representante da APPS,João Mouta, sublinharam que, além da demora na elaboração dos relatóriossociais, é preocupante a aparente falta de formação dos técnicos que osproduzem. “Já me passaram pelas mãos relatórios incríveis. Em que otécnico ouve apenas um dos progenitores e a criança; em que visita a casa de ume não a do outro; em que faz a entrevista pelo telefone”, relata JoãoMouta.
A organização dirigida por Ricardo Simões está precisamente a coligir dadosfactuais sobre situações do género. “As pessoas terão noção do que istoimplica na vida das pessoas?”, questiona o dirigente da APIP. Aponta comoexemplo o caso de um pai que esperou nove meses e meio para que a SegurançaSocial lhe proporcionasse visitas vigiadas ao filho, tal como o tribunaldeterminara. Nesse período não teve notícias nem viu o bebé.
No ofício em que responde aos pedidos de esclarecimento da provedoria, adirigente do ISS escreve que desde que aquela responsabilidade transitou d Direcção-Geral de Reinserção Social para o instituto, em 2007, que os atrasosse acumulam, por insuficiência de recursos humanos. Para 2012, por exemplo,transitaram 11.229 solicitações, que se somam aos 25 mil pedidos, feitosanualmente, em média. Dos 154 técnicos aos quais cabe dar-lhes resposta, 33trabalham simultaneamente noutras áreas, como a protecção de menores ou aadopção, informa.
Acrescenta que a situação se tem complicado com o aumento dos pedidos deacompanhamento de visitas ou de encontros vigiados entre os progenitores e ascrianças. Apesar de não ultrapassarem um por cento das solicitações,”representam um enorme esforço para as equipas dos centros distritais,sobretudo quando a sua execução é solicitada em horário pós-laboral ou emfim-de-semana, introduzindo complicadas questões de organização interna”,afirma a dirigente.
Nos ofícios enviados a 30 de Julho aos membros do Governo, o provedor deJustiça, Alfredo José de Sousa, alerta para a necessidade de adoptar”medidas urgentes” para resolver o problema, dadas as”consequências nefastas” que dos atrasos podem resultar para ascrianças e para o funcionamento dos tribunais.
O ministro da Solidariedade e da Segurança Social, que tutela o ISS, nãorespondeu até à última sexta-feira. A ministra da Justiça informou o provedor,a 21 de Agosto, de que entretanto propusera “a constituição de um grupo detrabalho, com intervenientes de ambos os ministérios”, para apresentaçãode propostas de solução.
Atrasosfavorecem “alienação parental”
Relatórios de exames psicológicos
O presidente da Associação para aIgualdade Parental, Ricardo Simões, sublinha que o atraso nas respostas doInstituto de Segurança Social é especialmente grave em situações de alienaçãoparental. Este é um termo controverso, mas que designa o comportamento dapessoa que, tendo a guarda física do filho, cria obstáculos ao encontro dacriança com o outro progenitor e procede à sua permanente desqualificação, coma intenção de provocar o corte dos vínculos afectivos que os unem. Entre asexigências da APIP têm estado a resolução dos problemas que resultam no atrasoda intervenção do ISS, precisamente, mas também na elaboração dos relatórios deexames psicológicos e psiquiátricos.
Público de 17-09-2012

Desjudicialização e corrupção


Marinho Pinto - A sofreguidão com que se retiram dos nossos tribunais litígios que durante séculos lá foram tramitados e resolvidos de forma soberana levanta, a qualquer pessoa séria, as maiores suspeitas sobre os verdadeiros fins dessas opções. Parece que, de repente, os órgãos de soberania especificamente criados para administrar a justiça deixaram de ter qualquer utilidade ou capacidade para cumprir essa função constitucional. Tudo parece ser legítimo para fugir dos tribunais ou para impedir as pessoas de os procurarem. Multiplicam-se os julgados de paz, os tribunais arbitrais e os centros privados de mediação de conflitos laborais, familiares e criminais. Tudo serve para fazer justiça exceto os órgãos que o Estado criou exclusivamente para isso; todos podem fazer justiça menos os magistrados.
Argumenta-se que alguns desses meios são mais baratos, mais informais e mais próximos das pessoas, mas ninguém justifica por que é que os tribunais são tão caros, tão formalistas e tão distantes dos cidadãos. Outros tornam-se insuportavelmente escandalosos pela autêntica privatização da justiça a que procedem. Os centros de mediação estão virados para o lucro e querem obrigar as pessoas a fazerem as pazes com base em acordos quase sempre leoninos em favor das partes económica e culturalmente mais fortes. Para isso afastam os advogados, pois estes, seja qual for o processo ou a instância, igualizam as partes perante o julgador, impedindo que as desigualdades sociais, económicas e culturais assumam relevância processual.
É, porém, nos chamados tribunais arbitrais que se levantam as mais sérias apreensões. Não está só em causa o facto de as partes escolherem os juízes, violando, assim, o princípio do juiz natural; não está só em causa o facto de esses tribunais funcionarem num registo de autêntica clandestinidade, já que não existe qualquer publicidade das suas decisões nem da tramitação dos processos; já nem sequer surpreende a promiscuidade resultante de a função dos juízes ser desempenhada, em regra, por advogados e o papel dos advogados ser verdadeiramente desempenhado por quem está no lugar dos juízes. O que está, de facto, em causa são as suspeitas crescentes de que tais tribunais são usados para atingir fins ilícitos, sobretudo quando estão em «confronto» interesses públicos e privados; o que está em causa são as suspeitas de que são usados cada vez mais para legalizarem transferências ilícitas de recursos públicos para bolsos privados.
Não tenho nada contra a arbitragem entre privados, mas tenho tudo contra a sua utilização pelo Estado e outras entidades públicas, em contratos público-privados, com renúncia aos tribunais soberanos e ao direito de recurso, apesar de sistematicamente saírem derrotados na «justiça arbitral». A minha oposição é ainda maior à chamada arbitragem fiscal que, tudo o indica, foi criada propositadamente para legalizar fugas aos impostos de grandes contribuintes e repartir entre privados e decisores públicos parte significativa das suas dívidas fiscais.
O recurso à arbitragem garante que certos negócios público-privados não sejam escrutinados por magistrados independentes, mas sim legitimados por advogados da confiança das partes que, para tal, são metamorfoseados em juízes. A opção pelas arbitragens evita também o risco de se mexer em coisas que possam revelar as generosas comissões que essas negociatas, em regra, propiciam aos decisores públicos corruptos.
Que essas práticas se estejam a generalizar em Portugal, até com o beneplácito público de membros do Governo, já não espanta ninguém. O que espanta já não são sequer os ataques e os insultos que os beneficiários da corrupção dirigem a quem a denuncia, mas sim o silêncio generalizado das pessoas honestas.
NOTA: Estou em Moçambique há cinco dias e, ontem, pela primeira vez nas últimas duas ou três décadas, voltei a sentir orgulho em ser português. O povo do meu país saiu à rua, de norte a sul, para dizer basta a um governo de fanáticos, de incompetentes e de mentirosos que usa o poder para favorecer os amigos e familiares, para perseguir quem o critica e para lançar a maioria da população na miséria.
Marinho Pinto
Jornal de Notícias de 17-09-2012

54 crimes de vandalismo por dia desde o início do ano


A porta e os vidros da seguradora Zurich, na Rua Luís Veiga Leitão, as montras do Montepio Geral, na Rua da Boavista, e da Caixa Geral de Depósitos na zona de Campanhã, Porto, foram apedrejados na madrugada de domingo. A PSP recebeu ontem um pedido para fazer "policiamento" ao escritório da Zurich devido aos "atos de vandalismo", disse fonte policial à Lusa, não os associando, para já, à manifestação anti- troika de sábado.
Os atos de vandalismo em todo o País, contra carros ou prédios, em igrejas e edifícios públicos, ascendem a 54 por dia desde o início de janeiro até junho, somando os dados da PSP e da GNR.
O ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, anunciou a 6 de agosto que vai avançar com legislação própria para combater o vandalismo. Atualmente, os estragos em propriedade particular ou do Estado cabem todos no mesmo "saco" penal: o crime de dano e de dano qualificado.
Quando PSP e GNR contabilizam o crime de dano, juntam os estragos a propriedade particular e a propriedade pública (do Estado ou das autarquias) e a separação dos vários tipos de situação é difícil. Para aumentar a confusão, a Justiça tem interpretações diversas. Nem sempre fazer graffiti em equipamentos ou edifícios públicos é considerado um ato criminoso.
Seja por falha na lei ou na sua interpretação, há casos que têm ficado impunes, como se verifica num acórdão a que o DN teve acesso. Um grupo encheu de graffiti várias carruagens estacionadas numa estação do Metropolitano de Lisboa. A empresa avançou uma ação por dano qualificado em coisa destinada ao uso e utilidade públicos, que é um crime punido com pena de prisão até cinco anos ou com multa até 600 dias. Mas o processo acabou arquivado porque os estragos causados não foram interpretados como crime, nem pelo Ministério Público nem na Relação de Lisboa em sede de recurso do queixoso.
Já num outro acórdão, do tribunal criminal de Lisboa, foi decretada multa contra um arguido punido à revelia, exatamente pelo crime de dano, por ter desenhado uns gatafunhos numa parede (ver caixa).
Interpretações diferentes
Fontes policiais queixaram-se ao DN de que a ação das forças de segurança é dificultada pela "falta de consistência judicial" quanto a este crime. Lembram que têm muitas vezes de pedir aos lesados para apresentar queixa-crime para que haja intervenção. E que a única forma de PSP e GNR excluírem a necessidade de queixa é se o dano for superior a 50 unidades de conta, cerca de 5100 euros. "Passa a ser valor elevado, logo sem necessidade de denúncia", diz fonte policial.
Até agora, o novo diploma sobre vandalismo que o MAI quer levar ao Parlamento pouco avançou. O DN pediu esclarecimentos ao MAI em agosto e setembro mas a resposta foi que "nesta fase" não era possível dar mais informação.
Câmaras de Lisboa e Porto combatem
A autarquia de Lisboa criou um programa de remoção de grafitti e outros registos de "arte de rua" ao mesmo tempo que avançou com a Galeria de Arte Urbana na Calçada da Glória, em 2008, que pretendeu elevar o grafitti a forma reconhecida de arte urbana (distinguindo-o de "garatujas selvagens", como respondeu a Câmara).
No Porto, o presidente da Câmara, Rui Rio, criou, há vários anos, uma equipa de limpeza de grafittis equipada com máquinas para limpar pedra. "Atividade que, em breve, será alargada à pintura de paredes em geral", referiu ao DN o gabinete de Rui Rio.
Existe também um protocolo entre a autarquia e o Ministério Público, para substituir o processo-crime por trabalho à sociedade, obrigando o condenado a limpar o que fez, referiu ainda o gabinete do autarca.
ESTATÍSTICA
Casos recuam no primeiro semestre
Nas áreas da PSP e da GNR as participações pelo crime de dano têm vindo a descer. Passou-se de uma média de 57 atos de vandalismo por dia participados no primeiro semestre de 2011 para 54 no período homólogo deste ano. Desceu de 4484 queixas por dano em geral feitas à PSP e 32 por dano contra o património cultural no primeiro semestre de 2011 contra 4051 e 17, respetivamente, no período homólogo deste ano.
A GNR forneceu só os totais do dano em geral (sem o património cultural): de 5874 queixas no primeiro semestre de 2011 desceu para 5678 em 2012.
'Graffiti' no metro não é crime mas dá indemnização...
Em causa, para os desembargadores da Relação de Lisboa, estava saber se os arguidos, ao fazerem pinturas e desenhos com latas de spray, vulgo graffiti, em várias carruagens estacionadas numa estação do Metropolitano de Lisboa, estariam a cometer o crime de dano qualificado em coisa destinada ao uso e utilidade públicos (punido com prisão até cinco anos ou multa até 600 dias).
No acórdão da Relação, a que o DN teve acesso, os desembargadores dão razão ao Ministério Público, que decidiu arquivar o caso. A"destruição" ou "desfiguração" teria de atingir as características funcionais do Metropolitano, o que não aconteceu. "A atuação dos autores dos graffiti, inserida nos tempos e modas da juventude, é no convencimento de se estar a desenvolver forma de arte e expressão", refere o acórdão da Relação de Lisboa O metro só teria direito a pedir indemnização cível.
... mas também é crime e dá direito a indemnização
A Justiça pode ter dois pesos e duas medidas. O caso de que se dá conta a seguir ilustra isso mesmo. Um cidadão suíço invadiu o resguardo para recolha de material circulante do Metropolitano de Lisboa, nas proximidades da estação Baixa Chiado, e procedeu à pintura de vários metros da parte lateral exterior de uma carruagem do Metropolitano com graffitis. Foi surpreendido em flagrante por uma operadora de linha.
O processo seguiu para julgamento e o 6.° Juízo Criminal de Lisboa condenou o arguido pela autoria material de um crime de dano simples e por um crime de introdução em lugar vedado ao público na multa global de 650 euros, a que corresponde, subsidiariamente, a pena de 86 dias de prisão. Na parte cível, o cidadão suíço foi condenado a pagar ao Metropolitano de Lisboa a quantia de 189,62 euros, com juros de mora. Um tratamento bem diferente do caso anterior.
Dano em património subiu 67% em dois anos na capital
Dados que a Polícia Municipal de Lisboa avançou ao DN indicam que os crimes em património cultural/municipal subiram 67,8% na capital desde 2010. Há dois anos, entre graffiti (15), furtos/danos (sete) e incêndios (seis), os crimes de dano em património cultural totalizavam 28.
Em 2011, os atos de vandalismo com graffiti foram dez em Lisboa, com furtos e danos foram 15 e com incêndios seis, num total de 31 casos contabilizados. Finalmente, este ano e até ao momento, não houve um único caso de vandalismo com graffiti registado pela Polícia Municipal na cidade de Lisboa.
Em contrapartida, houve 38 casos de furtos/danos e nove de incêndios, num total de 47 crimes registados. Contas feitas, isto significa que os atos de vandalismo subiram 67,8% na capital desde 2010.
Rute Coelho
Diário de Notícias de 17-09-2012