O Tribunal Constitucional determinou a inconstitucionalidade do prolongamento do corte dos subsídios para 2013. Passos Coelho veio anunciar que esse corte será mantido, desrespeitando essa decisão. No caso dos funcionários públicos decidiu, porém, fazer uma maquilhagem contabilística. Finge que lhes devolve um subsídio em 12 meses, ao mesmo tempo que eleva a sua contribuição para a CGA na mesma medida. Assim, o Estado mantém exactamente o mesmo corte salarial. Já quanto aos pensionistas, uma vez que não descontam para a CGA e não é possível recorrer à mesma manobra, é mantido exactamente o mesmo corte dos dois subsídios.
A razão para a decisão do TC foi a discriminação entre titulares de rendimentos, tendo o seu presidente sugerido que se procurasse tributar mais os rendimentos de capital. O governo decidiu, no entanto, aumentar ainda a tributação sobre os rendimentos dos trabalhadores privados, ao mesmo tempo que desagrava a dos empresários. E proclama mesmo que “não quer praticar uma igualdade cega que não faça crescer”. Estamos, assim, perante um desrespeito manifesto, em parte encapotado, em parte assumido, pela decisão do TC.
Espera-se que, desta vez, o Presidente da República exerça as suas competências e solicite a fiscalização preventiva da constitucionalidade deste Orçamento. E, se o Tribunal Constitucional deixar passar isto, é melhor que encerre de vez.
Professor da Faculdade de Direito de Lisboa
terça-feira, 11 de setembro de 2012
Por Luís Menezes Leitão, publicado em 11 Set 2012
O papel da linguagem no “ajustamento” político em curso
Por António Cluny, publicado em 11 Set 2012
De repente, a questão do rigor e da verdade das
linguagens política e jurídica parece ter ganho algum relevo social
1. Pouco após ter enviado para publicação o meu último texto, fui
surpreendido por um conjunto de artigos que abordavam o mesmo tema: a actual
reorientação de conceitos políticos e jurídicos no discurso público.
O mais desenvolvido e esclarecedor dos que li é, sem dúvida, o de
“El País” de 1 de Setembro: “La Ocupación del Lenguage”. Nele se procura
desvendar como a usurpação da terminologia dos oponentes políticos desempenha,
no cenário político espanhol, um papel fundamental na legitimação e na
conquista da hegemonia cultural por parte das teses neoliberais.
No âmbito nacional, Betâmio de Almeida disserta, no “Público” de 2
de Setembro, sobre o uso e abuso do termo “regabofe”. Pretende o autor que, não
se identificando o alvo da utilização de tal conceito, a acusação difusa e
ambígua que ele pressupõe, sendo universalizada, pode tornar-se potencialmente
cruel, pois atinge, no essencial, os cidadãos que não são os reais responsáveis
pela crise actual. Dias depois, Vítor Malheiros, no “Público” de 4 de Setembro,
disseca a relevante diferença entre o estrito conceito jurídico de corrupção e
a mais ampla noção que dela tem a sociedade.
No dia seguinte, aqui no i,
Rosa Ramos desenvolve o tema. De repente, a questão do rigor e da verdade das
linguagens política e jurídica parece ter ganho algum relevo social.
2. George Orwell, antevendo embora os objectivos políticos da
manipulação da linguagem num tipo de sociedade diferente, descreveu, no romance
“1984”, os efeitos do condicionamento social alcançados pela introdução gradual
do “duplopensar” e da “novilíngua”.
A concomitância de um tão grande número de artigos sobre o tema,
que aparecem em jornais de diferentes países europeus, devia alertar-nos para
uma condicionante real que arrisca conseguir confundir e redefinir os contornos
do debate político e cívico europeu.
Uma característica comum ressalta: a necessidade sentida pelo
discurso público dominante de, através de conceitos generosos de ideologias que
se querem combater e de outros propositadamente difusos e pouco esclarecedores,
não revelar, afinal, a verdade toda sobre os propósitos genuínos das medidas
políticas que se querem promover.
No fundo, parece temer-se que os cidadãos – agora apresentados
apenas, ora como “contribuintes”, ora como “consumidores”, ora como integrantes
das “famílias”, e nunca como sujeitos próprios e titulares individuais de um
estatuto político e jurídico no seio da comunidade nacional – não aceitem como
boas as ideias de um liberalismo radical que desestrutura e restringe, até à
anulação, o seu estatuto jurídico e constitucional.
É, de facto, um estranho liberalismo o que nega a individualidade
e integralidade política de cada homem e apenas lhe reconhece “qualidades”
sectoriais que nunca quer ver reunidas numa dimensão jurídica constitucional
harmónica. Tal sectorização impede a sua necessária margem de liberdade e
autonomia – a única que lhe possibilita a sua identificação com a “cidadania”
de uma república regida pelo direito.
Desenquadrados da “cidadania”, essas outras “qualidades”
sectoriais são, de facto, inócuas: podem ser escritas e reescritas tantas vezes
e de tantas formas quantas se mostrarem necessárias para o poder e os
interesses económicos prevalecentes.
Era essa “flexibilidade” – esse “duplopensar” – a qualidade
política da “novilíngua” que o Big Brother se propunha explorar para
condicionar a nova sociedade.
Jurista e presidente da MEDEL
Intervenção de Cavaco é reclamada por juízes
Diário Económico | terça-feira, 11 Setembro 2012
Caso as medidas anunciadas se mantenham no OE, ASJP pedirá fiscalização prévia a Cavaco.
Lígia Simões
A Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP) admite pedir a intervenção do Presidente da República caso se mantenha na proposta de Orçamento do Estado para 2013 o aumento das contribuições para a Segurança Social de 11% para 18%, como anunciou o primeiro-ministro. Em causa está uma nova quebra do rendimento disponível dos trabalhadores, ao retirar-se mais de dois subsídios na Função Pública e um montante superior a um salário no sector privado, se não houver alterações nas tabelas e escalões de IRS.
O pedido de fiscalização prévia de constitucionalidade foi avançado ao Diário Económico pelo presidente da ASJP e tem por objectivo evitar que o Tribunal Constitucional (TC) demore seis meses a tomar uma posição já depois da entrada em vigor da Lei do Orçamento, como aconteceu este ano face à fiscalização sucessiva requerida pelo grupo de deputados do PS.
“A manterem-se as medidas agora anunciadas na proposta do Orçamento de Estado, aí a ASJP tenciona, claramente, pedir a intervenção do Presidente da República e suscitar a inconstitucionalidade prévia das normas do Orçamento que venham a contemplar estas medidas”, revela José Mouraz Lopes, voltando a reafirmar que o aumento da Taxa Social Única (TSU) para os trabalhadores é “uma afronta” ao TC.
Salvaguardando que a ASJP não desencadeará qualquer iniciativa até analisar o resultado normativo das medidas que vierem a ser aprovadas no OE, Mouraz Lopes volta a defender a posição sindical de que as novas medidas de austeridade “podem levar a uma colisão de poderes”, entre o TC, a Assembleia da República e o Governo. “Quando insistem nestas medidas não levam em consideração a decisão do TC que foi muito clara quanto aos destinatários directos (Executivo e Parlamento), bem como quanto à necessidade de equidade nos esforços”, diz. E relembra que “não devem ser penalizados apenas os rendimentos do trabalho”.
Recorde-se que Cavaco Silva justificou que não pediu a fiscalização preventiva do OE/12 para não inviabilizar o Orçamento, que é peça central da política económica e financeira do país. Em Julho, em reacção à declaração de inconstitucionalidade dos subsídios dos funcionários públicos e pensionistas, o Chefe de Estado voltou a afirmar que “não é fácil neste momento encontrar espaço para pedir mais sacrifícios aqueles portugueses que já foram sacrificados”. E é, segundo a ASJP, por se tratar de um “assunto demasiado importante para os cidadãos” que o Presidente deverá requerer ao TC a apreciação preventiva da constitucionalidade da subida da TSU, antes que entrem em vigor as novas medidas.
Henriques Gaspar como procurador-geral reúne consenso
Diário Económico | terça-feira, 11 Setembro 2012
O vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça agrada à classe jurídica e ao PSD, CDS e PS. João Correia é outro nome em cima da mesa.
Ana Petronilho
As negociações entre os partidos do Governo para a escolha do próximo Procurador Geral da República (PGR) estão na recta final. Entre os candidatos que têm sido falados entre PSD e CDS, um reúne consenso mais alargado, segundo apurou o Diário Económico: António Henriques Gaspar, 62 anos, vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), desde 2006, e que fez carreira no Ministério Público.
Os procuradores têm exigido que o substituto de Pinto Monteiro, um juiz de carreira, seja uma personalidade que conheça bem o Ministério Público e a própria ministra Paula Teixeira da Cruz já tinha dito que o próximo PGR seria alguém que “ame” o MP. Henriques Gaspar reúne o consenso nos três partidos do arco da governação, incluindo, portanto, o PS, e agrada à classe jurídica.
Feita a escolha e tomada a decisão final, o nome terá, contudo, que ter o aval do Presidente da República, a quem cabe nomear e exonerar um Procurador Geral. Depois de terem chegado à imprensa vários nomes como António Cluny, Cândida Almeida, Francisca Van Dunem ou Eduardo Vera-Cruz Pinto, entre outros, é o nome de Henriques Gaspar que começa a ganhar mais apoios para suceder a Pinto Monteiro a partir de 9 de Outubro. Recorde-se que Henriques Gaspar já tinha estado na calha para o cargo há seis anos, quando Pinto Monteiro assumiu funções como chefe máximo do MP. Na altura, o Presidente da República tinha manifestado agrado pelo nome, mas o então primeiro-ministro, José Sócrates forçou a escolha de Pinto Monteiro, que viveu um mandato muito polémico (ver texto ao lado).
O presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Fernando Negrão, considera o vice-presidente do STJ como sendo “uma pessoa que está muito bem no Supremo e que pode estar muito bem em outros lugares”, disse ao Diário Económico. Também o deputado do PS, Ricardo Rodrigues, diz que Henriques Gaspar é “um magistrado de alta competência e seria um bom nome” para liderar o MP nos próximos seis anos.
Os procuradores, que viveram nos últimos anos em pé-de-guerra com Pinto Monteiro, preferem manter-se cautelosos e não comentar nomes. Ao Diário Económico, Rui Cardoso, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), diz, contudo, que espera que o novo PGR corresponda “ao perfil que em tempos o sindicato divulgou”. Isto é, que conheça a fundo o Ministério Público e que lute pela sua autonomia e dignificação. Certo é que Henriques Gaspar fez toda a sua carreira no MP, estrutura que conhece bem. Rui Cardoso acrescenta que o próximo PGR deve ter “uma grande verticalidade e deve ser independente de qualquer grupo de interesses, partidos ou grupos secretos”.
Contactado pelo Diário Económico, o Ministério da Justiça diz que este é um “assunto que está no foro privado” da ministra. Paula Teixeira da Cruz tem dedicado grande parte das últimas semanas a este assunto – que está também nas mãos de Passos e Portas – e o nome deve ser anunciado até ao final do mês.
Henriques Gaspar é um nome que agrada também aos advogados. Para Marinho Pinto, bastonário da Ordem, o juiz conselheiro do Supremo é um “homem honesto, profundamente inteligente e muito dedicado à sua função”.
João Correia é outro dos nomes fortes apontados para PGR
João Correia, ex-secretário de Estado da Justiça de José Sócrates, foi outro dos nomes que chegou a ser ponderado, apurou o Diário Económico. No entanto, a ministra sabe que este seria um nome mais difícil de obter amplo consenso.
Recorde-se que João Correia esteve envolvido na polémica do alegado pagamento de 72 mil euros a Maria Correia Fernandes, mulher do ex-ministro da Justiça Alberto Martins, por acumulação de funções em dois serviços do MP. Terá sido João Correia a assinar os despachos que terão beneficiado a procuradora. Processo que foi arquivado há três dias.
Contactado pelo Económico, João Correia negou qualquer convite. Disse que não “recebeu qualquer pedido”, que está “em branco” e elogiou Henriques Gaspar: “É um brilhante magistrado e jurista, se for ele, é uma excelente escolha”. Depois de seis anos polémicos do mandato de Pinto Monteiro, o seu sucessor terá um longo caderno de encargos. O principal, para já, será apaziguar a classe, que viveu de costas voltadas com o actual PGR, e arrumar a casa. Terá ainda que se bater pelo reforço da autonomia do MP, pela revisão dos estatutos, pela clarificação das relações com a Judiciária. com I.D.B.
PERFIL
O magistrado que zelou pelos Direitos do Homem
António Henriques Gaspar, 62 anos, foi nomeado para o Supremo Tribunal de Justiça a 20 de Março de 2003. Nasceu em 1949, na Pampilhosa da Serra e foi delegado do Procurador da República em Benavente, Montemor-o-Velho, Condeixa-a-Nova, Lousã, Pombal e Coimbra.
Entre 1987 e 2003 foi Procurador-Geral Adjunto no Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República e entre 1992 e 2003 também foi Agente de Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. É actualmente Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, tendo sido eleito Vice-Presidente em Março de 2006 e reeleito em 2009.
NOMES APONTADOS
Henriques Gaspar – Vice-presidente do Supremo António Henriques Gaspar reúne consenso nos três partidos do arco da governação para substituir Pinto Monteiro, a partir de 9 de Outubro.
João Correia – Ex-secretárlo Estado Justiça O ex-secretário de Estado da Justiça é outro dos nomes apontados mas a ministra sabe que este seria um nome mais difícil de obter amplo consenso.
ANÁLISE JUSTIÇA
RUI RANGEL – Juiz Desembargador
A nomeação do próximo Procurador-Geral da República está à porta. No tabuleiro da investigação criminal e das competências do Ministério Público (MP) na acção penal joga-se, actualmente, a boa ou má imagem e a credibilidade da justiça penal.
No combate à criminalidade económica financeira organizada, à corrupção, ao tráfico de influências a investigação criminal colapsou e muito devido à falta de eficácia das investigações criminais conduzidas pelo MP. Estão a ser investigados processos importantes, cuja verdade material apurada poderá levar à eventual queda do regime político. Gente poderosa foi “convidada” a falar com a justiça, mas nada acontece. O silêncio é ensurdecedor e os resultados nenhuma eficácia apresentam.
Parece que existe uma estranha e escondida cumplicidade. Parece que a justiça deixou-se amarrar pelos interesses da política suja. Tudo se faz, sem pudor e sem medo e nada acontece.
É, por isso, que a escolha do próximo Procurador é, direi, a escolha que não pode falhar. Tem que ser alguém de elevada craveira intelectual e jurídica, não permeável a influências externas, de reconhecida honestidade, dignidade e respeito pelos seus concidadãos. Alguém que não esteja próximo do Poder Político, que não tenha estado ao serviço de comissões de escolha política. Que o não tenha servido.
Alguém blindado que saiba dizer não, que saiba dar um murro na mesa e que investigue tudo o que houver para investigar dou a quem doer!
Alguém que renove o DCIAP e que faça auditorias ao trabalho aí prestado e as divulgue publicamente. Alguém que saiba prestar contas e não deixe que pessoas importantes sejam queimadas, muitas vezes, na praça pública, sem motivo. Alguém que não deixe que as investigações andem, por vezes, ao ritmo dos actos eleitorais.
Alguém que não se intimide com o Sindicato e saiba por na ordem o Ministério Público. Que saiba comunicar e tenha uma estratégia de comunicação com os média.
Que não seja a Rainha de Inglaterra. Para tudo isto não precisa de ser magistrado, mas tem que conhecer bem o sistema de justiça.
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