quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Provedor de Justiça analisa corte nos pagamentos do pessoal na mobilidade

RAQUEL MARTINS 
Público - 07/02/2013 - 00:00
Alfredo José de Sousa recebeu 30 queixas a contestar o corte de 50% no valor das licenças extraordinárias. Medida está inscrita no Orçamento do Estado para 2013 e começou a ser aplicada em Janeiro
Os funcionários públicos que estão em licença extraordinária foram surpreendidos no final de Janeiro com a redução da prestação que recebiam do Estado e três dezenas já pediram a intervenção do provedor de Justiça.
Fonte oficial do organismo dirigido por Alfredo José de Sousa confirmou ao PÚBLICO que foram recebidas 30 queixas relacionadas com os cortes previstos no Orçamento do Estado (OE) para 2013 e já foi aberto um processo para as analisar. A estas queixas deverá juntar-se uma outra do Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas (ligado à Frente Comum), que contesta os efeitos destes cortes nos orçamentos dos funcionários menos qualificados e que tinham salários mais baixos.
A possibilidade de os funcionários públicos pedirem uma licença extraordinária e saírem temporariamente do Estado existe desde 2007, quando entrou em vigor a lei da mobilidade, uma espécie de quadro de excedentes onde são colocados os trabalhadores que não têm lugar nos serviços reestruturados.
A lei prevê que os funcionários em mobilidade podem pedir uma licença que lhes permite acumular um trabalho no sector privado ou por conta própria com uma subvenção paga pelo Estado, que corresponde, nos primeiros anos, a um valor entre 70% a 75% do que recebiam se continuassem no quadro de excedentes. Perto de 990 trabalhadores optaram por esta solução.
No Orçamento do Estado para 2013, o Governo decidiu cortar para metade esta percentagem, reduzindo a subvenção de forma significativa. Foi esta medida que levou alguns funcionários a recorrer à Provedoria de Justiça.
O secretário de Estado da Administração Pública, Hélder Rosalino, lembra que, em 2012, o Governo já tinha reduzido as prestações pagas aos funcionários em mobilidade especial, mas tinha deixado intactas as que eram pagas aos trabalhadores em licença extraordinária. Agora, argumenta, esta redução "visa compatibilizar os valores pagos nas situações de mobilidade especial e de licença extraordinária" e lembra que, até aqui, "o valor auferido nesta situação era superior ao presumido na situação de mobilidade especial, em que o trabalhador não tem o mesmo grau de liberdade profissional".
De todas as formas, lembra Hélder Rosalino, "continua a ser possível ao trabalhador fazer cessar a sua situação de licença extraordinária e reiniciar funções na administração pública". Por isso, conclui, "a situação só se mantém se o trabalhador quiser".
Luís Pesca, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas, lembra que estas reduções, tanto a de 2012 como a de 2013, vêm pôr em causa "as condições que levaram as pessoas a optar pela licença extraordinária" e recorda que a colocação em mobilidade especial foi muito contestada, principalmente no Ministério da Agricultura. "Não é igual receberem 400 euros ou 200 euros", realça, acrescentando que há pessoas que, em Janeiro, receberam menos de 200 euros. Por isso, tem aconselhado os funcionários que sentem maiores dificuldades a pedirem para regressar à mobilidade especial, onde ficarão a receber um pouco mais.
Mais cortes na calha
O Governo já anunciou que, durante este ano, o regime da mobilidade especial sofrerá alterações, com o argumento de que o Estado não pode dar-se ao luxo de pagar a funcionários que não estão a trabalhar. As medidas a tomar ainda não estão definidas, mas a última avaliação do memorando da troika prevê a redução progressiva da remuneração paga a quem está nesta situação e o seu alargamento da mobilidade aos profissionais de saúde e aos professores.
O relatório do Fundo Monetário Internacional sobre a redução da despesa pública recomenda ainda a existência de um limite de permanência neste regime de dois anos. Passado este tempo, os funcionários seriam recolocados nos serviços ou dispensados. Desde o início do ano, está também em vigor um diploma que facilita as rescisões amigáveis dos funcionários em mobilidade.
Desde 2007, passaram pela mobilidade especial 3860 funcionários, a maioria vinda do Ministério da Agricultura. Perto de 1555 saíram por aposentação (a maior parte) ou por terem reiniciado funções nos serviços públicos, mas 2305 continuam na mobilidade à espera de colocação, têm a situação suspensa ou estão de licença.

Monteiro Diniz denuncia em livro "maniqueísmo" de Jardim

TOLENTINO DE NÓBREGA 
Público - 07/02/2013 - 00:00
Último ministro da República critica também o "mimetismo" da oposição em texto sobre o sistema autonómico
No livro Evolução ou Continuidade? Reflexões sobre o Sistema Autonómico da Madeira, ainda sem data de lançamento, Antero Monteiro Diniz considera indispensável dar dignidade ao cargo que desempenhou durante 14 anos, primeiro sob a designação de ministro da República e, por fim, com competências limitadas à regulação das leis regionais, como representante da República.
Numa rememoração dos acontecimentos em que participou, Monteiro Diniz escreve que a sociedade madeirense está "marcada pelas tensões, forças e impulsos contraditórios que a dominam interna e externamente", umas "herança do seu processo histórico", outras "fruto da implantação com o sistema autonómico de um partido e de um líder absolutos".
No livro, de 304 páginas, Diniz Monteiro aborda, no primeiro de quatro capítulos sobre as autonomias insulares, a questão da representação da República na Madeira à luz da sua própria vivência entre 1997 e 2011, destacando as "difíceis condições de um cargo desde há muito contestado pelo poder regional". E, a propósito, destaca que o "cordial acolhimento" concedido pelos titulares dos órgãos de governo próprio da região ao seu sucessor, quando contraposto com a hostilização que sentiu na sua recepção por parte das mesmas entidades - sobretudo de Jardim, cuja posição, como escreve Almeida Santos no prefácio, "evoluiu da hostilidade à cordialidade" -, é bem revelador das "profundas contradições e paradoxos que inquinam os princípios e a prática da política madeirense".
O juiz jubilado do Tribunal Constitucional é também muito crítico relativamente à sociedade madeirense, que, "influenciada pelas cargas históricas de dependência aos diversos poderes que, ao longo dos séculos, sempre a condicionaram - os representantes das forças políticas do reino, da I República e do Estado Novo, os senhorios detentores dos contratos de colónia, as famílias de emigrantes estrangeiros que foram consolidando uma forte predominância na vida económica do arquipélago e a própria Igreja -, não revela uma especial capacidade de intervenção pública na avaliação e julgamento do poder político, acomodando-se", numa "postura de indiferença, ou de passiva e silenciosa aceitação desse poder", ao qual sempre concedeu maiorias absolutas.
Perante esta sociedade "marcada por séculos de dependência, com acentuadas desigualdades sociais, elevada taxa de analfabetismo, geradora de uma maciça emigração como válvula de escape da pobreza e da completa ausência de capilaridade social", o PSD de Jardim apresenta-se como "o partido criador do sistema autonómico, o defensor e executante das aquisições civilizacionais alcançadas pela autonomia", por contraponto a todos os demais partidos "acusados de comprometimento com o "colonialismo" de Lisboa".
Segundo Diniz, este "maniqueísmo da acção política assim projectado pelo partido do poder e mimetizado", depois, pela oposição "é facilmente perceptível nos comportamentos de uns e de outros, quer nas críticas e contracríticas radicais que, por via de regra, revestem muitas das intervenções parlamentares, como também na violência verbal quase sempre presente nos comícios e nas campanhas eleitorais". Da sua reflexão, conclui que "não basta criar um cargo [de representante da República] e atribuir-lhe um dado suporte constitucional". É importante, adverte, conceder-lhe também "condições mínimas que assegurem ao respectivo titular a dignidade institucional indispensável ao seu efectivo exercício, sob pena de os condicionamentos e limitações que o cerceiam o tornarem a médio prazo insustentável".

Dados dos tribunais nas mãos de privados


Amadeu Araújo

A gestão dos servidores informáticos dos tribunais, que contém informação processual e em sigilo, vai ser entregue a privados. A decisão motivou já a demissão de alguns dos elementos da equipa que gere a plataforma informática das secretarias judiciais e dos magistrados, que foram convidados a dar formação a uma empresa privada.

A maioria destes elementos, sobretudo oficiais de justiça que estavam em comissão de serviço, apresentou a demissão. A decisão de entregar a empresas privadas a informática do Ministério da justiça consta de um estudo do Governo que defende que as bases de dados, de toda administração pública, sejam centralizadas e guardadas por uma entidade privada, numa nuvem tecnológica.

Entre essas bases de dados constam as plataformas dos tribunais que permitem o tratamento informático dos processos judiciais em todas as suas fases, desde a petição inicial até ao arquivo. Mas a hipótese do estudo passou a realidade.

A entrada dos privados na gestão das bases de dados dos tribunais foi confirmada pelos oficiais de justiça que estão em comissão de serviço na equipa que gere o sistema habilus e citius. Ao que 'O Crime' apurou estes funcionários; que transitaram da Direcção-Geral da Administração da Justiça, onde, integrados no sector informático, haviam participado na criação do Citius, o percussor da informatização dos tribunais; foram convidados pelo IGFEJ (Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça) a dar formação aos elementos da empresa privada que vai gerir o sistema informático dos tribunais.

Estes elementos, que dependem do IGFEJ e têm estatuto de funcionários públicos estando por isso obrigados ao segredo, recusaram o convite mas assumiram o compromisso de se manterem em funções até 1 de março deste ano. Mas no primeiro dia de fevereiro os funcionários foram notificados da cessação imediata da comissão de serviço e receberam indicações para se apresentarem na Direcção-Geral da Administração da Justiça, que tutela os oficiais de justiça em pleno exercício de funções nos tribunais.

E de seguida foram remetidos para os tribunais onde estavam colocados. Logo nessa sexta-feira surgiram os primeiros problemas informáticos, detetados ainda por esses elementos, sem que os mesmos pudessem intervir e sem que lhes fosse dado conhecimento de quem passou a gerir os problemas informáticos que ocorrem diariamente nos tribunais (ver caixa).

Já anteriormente esta equipa de oficiais de justiça foi impedida de desenvolver uma nova aplicação piloto para o sistema informático dos tribunais, onde são tratados os processos judiciais.

Foi há 3 anos quando o Ministério da Justiça pagou um milhão de euros a uma empresa privada para tomar mais eficiente e seguro o sistema informático utilizado pelos juízes na gestão dos processos.

Posteriormente seguiu-se uma auditoria a toda a informática dos tribunais e constatouse que existe a possibilidade de aceder, alterar ou remover gravações de audiências em tribunais sem controlo de acesso. Também qualquer utilizador no interior da rede da justiça pode alterar ficheiros de forma maliciosa ou subverter dados no envio de peças processuais na aplicação utilizada pelos advogados.

O conhecimento da entrada de privados nas bases de dados dos tribunais confirma a intenção do governo de entregar a gestão de dados sensíveis a empresas. Em novembro o governo fez saber que estava a desenvolver um estudo, no qual admitia que bases de dados com informações classificadas pudessem ser centralizadas e guardadas por uma entidade privada. A intenção seria reduzir despesas num plano gizado pelo Grupo de Projecto para as Tecnologias de Informação e Comunicação, tutelado pelo ministro Miguel Relvas, que tem a responsabilidade da gestão da rede informática do Governo.

Na altura a decisão mereceu críticas da Comissão Nacional de Protecção de Dados CNPD e dos partidos da oposição. O PCP entregou mesmo um requerimento no Parlamento onde alertou para o risco de estas bases de dados ficarem acessíveis a empresas privadas que "não dão garantias de proteger informação sensível".

Duvidas que levam oficiais de justiça, procuradores e juízes a confiarem pouco na informática dos tribunais. "Algo que é criado por alguém está na disponibilidade do seu criador". E poderá estar também acessível a todos aqueles que sabem como funciona o sistema.

'O Crime' pediu, sem sucesso, esclarecimentos ao Ministério da Justiça.

Sucedem-se os problemas na informática dos tribunais

"O sistema informático está diariamente bloqueado entre as 9 e as 10 horas. É de ficar com os cabelos em pé". O desabafo é de um funcionário do Tribunal de Viseu mas podia ser de outro qualquer tribunal. Os problemas sucedem-se e os atrasos nos processos também.

Os mais de 300 tribunais existentes no país estão ligados, por conectores de fibra óptica, a servidores colocados na região da Grande Lisboa que permitem aceder a toda a tramitação processual a partir de vários nós de comunicações. "Um sistema caduco, cheio de fragilidades, dificuldades e constrangimentos", desabafam vários oficiais de justiça e funcionários das conservatórias e notariados. Julgamentos adiados, impossibilidade de lavrar despachos, ou dar andamento aos processos são situações habituais nos tribunais quando o acesso ao sistema informático não está disponível.

"A gravação das audiências é digital, o que exige o funcionamento do sistema informático; os certificados do registo criminal, essenciais para a escolha e determinação da medida concreta da pena, são transmitidos aos tribunais por via electrónica", explicam os operadores judiciários que lembram que o problema não é dos programas mas "dos servidores ultrapassados e computadores obsoletos".

As dificuldades na informática perturbam ainda a Polícia Judiciária, os estabelecimentos prisionais e as delegações do Instituto de Reinserção Social porque "todos os processos estão informatizados e é preciso lançar diariamente informações".

Problemas que antes se resolviam "com os funcionários do Ministério da Justiça e que agora terão que ser resolvidos com empresas privadas de programação que não ganham dinheiro com a elaboração do programa mas com a manutenção". É que, referem vários oficiais de justiça, "até aqui havia uma estrutura de suporte capaz de resolver os problemas mas quando recorremos a privados, que desenvolvem os programas, vamos ter problemas porque é fácil conceber uma aplicação que de tempos a tempos, porque foi programado para isso, avaria e só pode ser reparada pela empresa que o concebeu. O negócio dos privados está aí".
O Crime, 07-02-2013

Equipa técnica que geria aplicação informática dos tribunais demitiu-se


Justiça

Mariana Oliveira

Sindicatos dizem-se preocupados com a situação e temem dificuldades na resposta aos problemas com o Citius

Os dez elementos da equipa do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça que geria a aplicação informática utilizada por todos os tribunais, o Citius/Habilus, demitiuse na segunda-feira passada, o que está a obrigar o Ministério da Justiça (MJ) a reunir um novo grupo.

Os funcionários queixam-se do esvaziamento das suas funções e denunciam interesses empresariais na entrega do desenvolvimento de uma nova aplicação a privados. Tanto o Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) como o Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ) mostram-se preocupados com a demissão, temendo que os tribunais sofram com as eventuais dificuldades na resposta aos problemas de manutenção da aplicação.

O Ministério da Justiça desvaloriza as demissões e realça, numa resposta escrita enviada ao PÚBLICO, que "a equipa compreendia recursos externos, que asseguravam o essencial da programação informática, que não se demitiram". E acrescenta:

"Está a ser instituída uma equipa, com recursos já existentes no MJ, para responder às mesmas solicitações. A instituição desta equipa implica que sejam elaborados novos procedimentos, quer de contacto com a equipa, quer de aprovação dos desenvolvimentos".

O MJ garante que "não existe qualquer risco de colapso, estando em curso uma redefinição de prioridades junto dos recursos humanos existentes". Relativamente à participação de privados nesta área, o MJ garante que não pretende entregar a privados a gestão da futura aplicação que será usada nos tribunais, admitindo que tal pode vir a acontecer com o desenvolvimento da mesma. A decisão será tomada com base em três factores: prazo para colocar a aplicação no terreno; recursos disponíveis (humanos e financeiros) e a prioridade dos projectos. "Só após essa avaliação será possível definir se será, ou não, necessária a contratação externa para reforçar as equipas internas do Ministério da Justiça", adianta a nota. E enfatiza que se demitiram 10 pessoas numa equipa de 102.

Carlos Almeida, presidente do SOJ, explica os números de outra forma. "A maioria, 86 pessoas, está distribuída pelos tribunais dando apoio aos funcionários e magistrados sempre que há problemas. Outros 16 trabalham na gestão e desenvolvimento das aplicações da Justiça, sendo estes 10 responsáveis pelo Citius".

O dirigente sindical diz que está preocupado com esta situação e pediu, na própria segunda-feira, alguns esclarecimentos à Secretaria de Estado da Administração Patrimonial e Equipamentos do MJ. "Disseramnos que esta semana e para a próxima vão decorrer reuniões e que serão acautelados eventuais constrangimentos", diz Carlos Almeida. E defende que seria "desejável que estas pessoas voltassem a participar no desenvolvimento do Citius. "São pessoas válidas, que deram o melhor de si em prol do funcionamento da Justiça", argumenta.

O presidente do SFJ, Fernando Jorge, partilha a preocupação do colega. "Tememos que as consequências possam ser graves", diz, lembrando que, pelo menos todas as semanas, há necessidade de intervir no Citius/ Habilus. "Se nos tribunais surgir um problema, os funcionários dirigemse a quem? Ao gabinete da ministra? À Critical Software?", pergunta. E sublinha que esta equipa de oficiais de justiça, alguns com formação académica em Informática, estão há mais de 10 anos ligados ao desenvolvimento das aplicações usadas nos tribunais.

O dirigente lamenta que a equipa tenha sido quase esquecida pelos responsáveis que assumiram esta pasta no MJ. "Houve uma atitude de evidente desconsideração. Não discuto as opções do ministério do ponto de vista técnico, mas houve um processo mal conduzido", lamenta.
Público, 07-02-2013

Juízes dizem: Menezes e Seara não se podem recandidatar


Autárquicas. Juízes prevêem que autarcas percam mandatos

Rui Rangel e Eurico Reis defendem que lei de limitação de mandatos é clara e impede candidaturas dos autarcas com mais de três mandatos

PEDRO RAINHO

Os juízes Rui Rangel e Eurico Reis defendem que os presidentes de câmara que já cumpriram três mandatos não podem candidatar-se a outra autarquia. Candidaturas como a de Fernando Seara, em Lisboa, Luís Filipe Menezes, no Porto, ou Fernando Costa, em Loures, podem ser travadas pelos tribunais no entender destes magistrados.

A interpretação que Eurico Reis faz da lei leva-o a defender que "a solução mais acertada é aquela que diz que são três mandatos e ponto". Para o juiz-desembargador do tribunal da Relação de Lisboa, se "o legislador não distinguir as situações o intérprete não pode fazê-lo". Também o juiz Rui Rangel afirma que "a lei é clara". "O legislador pretende que haja uma incapacidade absoluta de alguém migrar para outra câmara", assegura.

Se os partidos insistirem em apresentar candidatos que violem este princípio, Rui Rangel, presidente da Associação de Juízes pela Cidadania, acredita que haverá nomes "sufragados pelos partidos para ir a votos e uma decisão [dos tribunais] a dizer que [determinado candidato] não pode ir", porque "o legislador quis que as pessoas não se perpetuassem no cargo". A questão pode ter sérias implicações em Outubro, quando os eleitores forem às urnas para escolher os seus representantes locais.

Em causa está a lei da limitação de mandatos, publicada em Agosto de 2005, que prevê que "o presidente de câmara municipal e o presidente de junta de freguesia só podem ser eleitos para três mandatos consecutivos". A lei não esclarece se essa limitação se aplica aos autarcas que se candidatam a outra câmara e, para desfazer esse equívoco, o PSD pretendia avançar com uma proposta para clarificar o diploma, mas não chegou a fazê-lo.

Nem entre os sociais-democratas - o partido que mais candidatos tem nesta situação - a questão é consensual. Paulo Rangel, um dos autores do diploma, já tinha defendido que a violação à lei levaria a perdas de mandato. "Acho que isso é um risco que pode acontecer e não só eu", disse o eurodeputado do PSD.

Em sentido contrário, Pedro Santana Lopes, que também contribuiu na preparação do texto, disse ontem ter "a certeza absoluta" de que "a lei foi feita para proibir mais do que três mandatos na câmara em questão", deixando a porta aberta a candidaturas em outras autarquias.

Posições políticas à parte, Rui Rangel lamenta que sejam "os tribunais a resolver um problema de bom-senso, quando deviam ser os partidos a resolver" a questão. "Não venham depois dizer" comoaconteceu com os pedidos de fiscalização sucessiva da constitucionalidade do Orçamento do Estado - "que é a Justiça a politizar" o assunto, sublinha o juiz.

Jurisprudência

A lei autárquica define que serão os juizes que recebem as listas a aceitar ou não as candidaturas e, em caso de dúvidas, o assunto poderá ir parar ao Tribunal Constitucional. Eurico Reis acredita que a decisão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) sobre o processo que envolve Macário Correia criou uma espécie de jurisprudência.

Ao decidir que o autarca de Faro perdia o mandato por ilegalidades cometidas quando era ainda presidente da câmara de Tavira, o STA definiu que "a territorialidade é irrelevante", e "os tribunais comuns não podem ignorar a interpretação" feita por uma instância superior, entende Eurico Reis.

A grande questão agora prende-se com a interpretação do espírito de uma lei cuja letra final "tem uma redacção equívoca", como admite o próprio Santana Lopes. A Comissão Nacional de Eleições já publicou mesmo uma deliberação em que defende que a limitação "é restrita ao exercício consecutivo de mandato como presidente de órgão executivo da mesma autarquia".

O PSD apoia-se no parecer da CNE para justificar o facto de ter desistido de fazer uma clarificação à actual legislação. Eurico Reis sublinha, porém, que a posição da CNE "não tem poder vinculativo" e que "o princípio republicano de que as pessoas não podem eternizar-se nos cargos tem de prevalecer, porque a carne é fraca e o poder corrompe".

Casos

Luís F. Menezes - CANDIDATO AO PORTO

O autarca de Gaia, desde 1997, diz que "esse é um problema de quem tem medo de ir a votos" e rejeita que a lei impeça os presidentes de câmara com três mandatos de se candidatarem a uma autarquia vizinha.

Fernando Seara - CANDIDATO A LISBOA

O ainda presidente da Câmara de Sintra defende que o objectivo de impedir a "criação de clientelas" é "cabalmente conseguido" se a limitação de mandatos se aplicar apenas a cada autarquia isoladamente.

Fernando Costa - CANDIDATO A LOURES

É presidente de câmara há 27 anos e se não fosse a actual lei tencionava recandidatar-se nas Caldas da Rainha. É contra a limitação de mandatos e aceitou o desafio do PCP para se candidatar em Loures.
I, 07-02-2013

Rui Medeiros reviu estatuto da OA a pedido de Marinho


Rui Medeiros, sócio da Sérvulo & Associados, foi o jurista que elaborou a recente proposta de revisão do Estatuto da Ordem dos Advogados (OA). Segundo um comunicado daquela sociedade, o trabalho foi solicitado por Marinho e Pinto e elaborado com base em directrizes "informalmente comunicadas e um conjunto de alterações vertidas em anterior anteprojecto" da própria Ordem.

A Sérvulo foi entretanto apontada, em algumas notícias, como a "mentora" do polémico projecto, o que no comunicado referido é repudiado pela sociedade, que também lamenta o facto de ter sido envolvida "em conflitos internos da Ordem dos Advogados".
Jornal de Negócios, 07-02-2013