sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Constitucional vai dar prioridade à fiscalização do Orçamento do Estado

Constitucional vai dar prioridade à fiscalização do Orçamento do Estado
O pedido de prioridade tinha sido apresentado apenas pelos partidos políticos que apresentaram pedidos de fiscalização
Os juízes do TC decidiram dar prioridade ao processo de fiscalização sucessiva da constitucionalidade de várias normas do Orçamento do Estado (OE) 2013, disse ao Negócios fonte oficial do Palácio Ratton.
O pedido de prioridade tinha sido apresentado apenas pelos partidos políticos que apresentaram pedidos de fiscalização (PS, PCP e BE) e, ouvida a Assembleia da República, que não se opôs, o decidiu deferir o pedido.
“De qualquer modo, independentemente deste pedido, o TC sempre faria uma ponderação autónoma quanto ao grau de celeridade na apreciação e decisão deste processo” sublinha a mesma fonte. Assim, a celeridade será a que o TC entender dar-lhe.
Canal de Negócios | Quinta Feira, 17 Janeiro 2013

O direito a dizer coisas mal ditas

Público - 18/01/2013 - 00:00
As imagens causaram grande emoção no nosso país no ano passado. Duas jovens, de 16 e 15 anos, agrediam violentamente uma colega de 13 anos, caída no chão, enquanto a cena era filmada por outro jovem.
O juiz do tribunal de instrução criminal não foi brando na medida de coacção que aplicou à jovem de 16 anos: prisão preventiva. A medida mais gravosa aplicável no nosso sistema penal antes do julgamento e do apuramento efectivo de responsabilidades.
Uma medida polémica, seja pela sua gravidade, seja pela idade da arguida, seja pelo crime em causa. Houve quem concordasse e quem discordasse, o que é absolutamente natural.
A favor de tal medida, pode-se alegar que, às vezes, um choque violento com a realidade e o mundo das responsabilidades dos adultos permite a um jovem perceber o seu erro e não voltar a praticá-lo.
Contra tal medida, pode-se alegar que a introdução de uma jovem de 16 anos no meio prisional poderá causar-lhe males irreversíveis.
O bastonário da Ordem dos Advogados (OA) não esteve com meias-palavras e disse, forte e feio, o que pensava do assunto, numa entrevista televisiva: "(...) Eu acho que é manifestamente desproporcionada a prisão preventiva, essa medida de coacção, relativamente quer à gravidade dos factos quer à intensidade da culpa. Isto, o crime em si, não devia, não admite na nossa lei, prisão preventiva (...)". "(...) Obviamente, reflexo de uma justiça, de um funcionamento justiceiro próprio dos tempos da Inquisição, isto é, (...) o juiz faz o que lhe apetece, decide, não tem limites na lei, ele torce a lei, adapta a lei aos seus preconceitos, aos seus medos, aos seus complexos, à sua idiossincrasia (...). Em Portugal, as prisões são escolas superiores de criminalidade, as pessoas saem mais criminosas do que entraram, portanto, atirar com uma miúda de dezasseis anos e com um jovem de dezasseis anos para a prisão, isto é terrível". "(...) Aliás, qual foi o crime do jovem? Foi ter filmado? (...)". E, ainda: "(...) Por amor de Deus, isto é terrorismo de Estado! (...)".
O juiz do tribunal central de instrução criminal que decretara a medida de coacção não gostou das palavras do bastonário e queixou-se criminalmente, acusando-o da prática de um crime de difamação, isto é, de ter sido ofendido na sua honra e consideração. Um juiz de instrução concordou com o juiz queixoso e decidiu levar o bastonário a julgamento.
Embora afirmando que "a liberdade de expressão constitui um direito inalienável e é um pilar fundamental de um Estado de direito e de uma sociedade democrática" e que "a crítica das decisões judiciais é um direito legítimo de qualquer pessoa, mormente de quem exerce a função de bastonário da Ordem dos Advogados", não resistiu este juiz de instrução a introduzir no seu raciocínio o princípio, nunca assumido, do "viva o respeitinho", ao acrescentar que, "contudo, tal liberdade, como qualquer outra, tem de ser exercida com ponderação, rigor, objectividade e com respeito pelos demais direitos".
O que não é verdade. A opinião pode ser expressa de forma imponderada, com falta de rigor, cheia de subjectividade e com pouco respeitinho. É esta a garantia da existência de uma efectiva liberdade de expressão numa sociedade democrática. Por muito que nos custe ou incomode.
Certo é que o bastonário recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa e, no passado dia 12 de Dezembro, os juízes desembargadores Margarida Bacelar e Agostinho Torres foram lapidares ao ordenar o arquivamento do processo. Não porque concordassem com as palavras do bastonário. Muito pelo contrário, consideraram-nas mesmo um exercício do "direito a dizer coisas mal ditas". Para os desembargadores, as palavras do bastonário eram uma "tomada de posição ideológica ou emocional", parcial, (...) com uma argumentação algo rudimentar, sem motivação racional e coerente...".
Mas, ainda assim, entenderam que não estava indiciada a prática de qualquer crime de difamação: havia um evidente interesse público na discussão da questão e aquilo que o bastonário dissera mais não era do que uma opinião, atacando a decisão judicial e o próprio sistema de justiça que permitia que os juízes procedessem daquela forma; mas, mesmo que se entendesse que se tratava de uma crítica directamente dirigida à actuação do juiz queixoso, era evidente que ela se situava na área do seu comportamento estritamente profissional e não atingia o núcleo da sua dignidade pessoal, pelo que não fazia sentido criminalizar a actuação do bastonário da OA.
Uma decisão sábia que reforça o entendimento democrático da liberdade de expressão nos nossos tribunais, por oposição ao entendimento autoritário do qual a decisão do juiz de instrução que ordenava o julgamento do bastonário era um exemplo. Uma boa notícia a marcar o fim do ano de 2012 nos nossos tribunais.
Advogado. Escreve à sexta-feira ftmota@netcabo.pt