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Público | 09-07-2012
A simplificação da reforma do processo
civil vai passar por manter apenas uma forma de processo nas acções
civis comuns, contra as três sumaríssima,sumária e ordinária queexistem
actualmente, cada uma com regras próprias. O limite do número de
testemunhas e os prazos para exercer os direitos de defesa vão, por
isso, ser uniformizados independentemente do valor da causa. A novidade é
avançada pelo Ministério da Justiça numa altura em que o gabinete de
Paula Teixeira da Cruz analisa os vários pareceres dos parceiros e
actualiza as propostas de alterações ao Código de Processo Civil, tendo
por base o documento apresentado em Dezembro pela Comissão de Revisão do
Processo Civil.
O atraso na reforma já obrigou à sua
recalendarização. Em Dezembro, o ministério previa que o projecto de
alteração estivesse concluído em Junho, para ser submetido ao
Parlamento, em Setembro, o que afinal só deverá ocorrer em Novembro. "No
âmbito das reuniões mantidas com a troika durante o mês de Maio, ficou
acordado que o Ministério da Justiça iria elaborar um novo Código de
Processo Civil, que deverá ser submetido, pelo Governo, ao Parlamento em
Novembro de 2012", explica o gabinete de Paula Teixeira da Cruz.
O
ex-secretário de Estado da Justiça João Correia, que coordenou o papel
da comissão, diz que neste momento a bola está do lado do ministério,
mas adianta que a ministra lhe pediu para analisar as novidades com
Paulo Pimenta, outro dos membros do grupo. Em cima da mesa está a
renumeração de todo o código, face à revogação de muitos artigos ao
longo dos anos e à existência de várias normas com o mesmo número,
completadas com A, B ou C. Num documento de balanço de um ano de
Governo, o ministério volta a insistir numa medida que consta do seu
programa - a criação de sentenças simplificadas que possam ser
elaboradas a partir de minutas próprias e adequadas -, uma novidade que
poderá ser integrada no projecto de revisão. A proposta da comissão era
omissa quanto a este aspecto e quanto às formas de processo sugeria
apenas a extinção do processo sumaríssimo.
Nos pareceres, houve
entidades, nomeadamente a Associação Sindical de Juízes Portugueses,
que defenderam que "a reforma podia e devia ir mais longe". Quanto a uma
das principais novidades da reforma aextinção das acções de cobrança de
dívidas se não forem identificados e localizados bens penhoráveis no
prazo de três meses -, os juízes notam no seu parecer que ela não
resolve o problema da acção executiva. "Trata-se de uma medida positiva,
sem dúvida, porque o processo não deve prosseguir se não servir para
coisa nenhuma. Os processos vão desaparecer, mas com eles não desaparece
a descrença na justiça", considera-se. E sublinha-se: "Tem-se incorrido
frequentemente no erro de pedir ao processo e aos tribunais que dêem
soluções a problemas que não lhes cabe solucionar."
Advogados criticam
Já
os advogados criticam a criação da audiência preliminar que passa por
um debate oral entre as partes com vista a delimitar o objecto do
litígio e a suprir eventuais insuficiências ou imprecisões. "Quanto ao
novo figurino da audiência preliminar, existem as mais diversas reservas
e diversos são os seus fundamentos, desde logo quanto à proliferação de
conceitos vagos e indeterminados, que fazem adquirir incerteza e alguma
arbitrariedade nesta fase intermédia e saneadora do processo", lê-se no
parecer do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados.
O
reforço do poder de direcção do processo pelo juiz, que passa sempre a
agir sozinho, é também contestado pelos advogados. "Concentram-se
demasiados poderes na pessoa do juiz, não permitindo em muitos casos a
fiscalização da sua actuação pela inadmissibilidade de recurso das suas
decisões, não se permitindo a mais elementar defesa dos princípios de
igualdade e contraditório", diz o mesmo parecer. Entres outras novidades
está a possibilidade de as partes prestarem declarações em audiência, o
fim dos pedidos de aclaração das decisões judiciais e a obrigação de um
mesmo juiz acompanhar todo o processo.
Três mudanças essenciais no novo código
Extinguir a cobrança de dívidas
As
acções de cobrança de dívidas, que em 2010 representavam mais de 70% da
totalidade de processos pendentes nos tribunais de primeira instância,
vão ser extintas se não forem identificados e localizados bens
penhoráveis no prazo de três meses a contar da notificação do agente de
execução. Esta é uma das principais propostas de alteração ao código e
permitirá acabar quase de forma automática com centenas de milhares de
processos. Será possível renovar a execução caso sejam identificados
bens, mas tal implicará o pagamento de mais taxas.
Penhoras bancárias mais fáceis
São
várias as alterações que pretendem facilitar a penhora de saldos
bancários. Primeiro, prevê-se que deixe de ser necessária autorização de
um juiz para se fazer estas penhoras, que passariam a poder ser
realizadas por contacto pessoal entre o agente de execução e o dirigente
da filial ou agência, sem ser necessária uma intervenção dos serviços
centrais de determinada instituição bancária. Propõese ainda o
encurtamento para dois dias úteis do prazo para os bancos informarem os
agentes de execução sobre a existência de saldos nas respectivas
instituições.
Menos audiências canceladas
O projecto
consagra o princípio da inadiabilidade da audiência final, que não deve
deixar de se realizar salvo se houver impedimento do tribunal, faltar
algum advogado que não tenha acordado previamente a presença ou ocorrer
motivo que constitua justo impedimento. Apesar das excepções, na
exposição da reforma lê-se que "é praticamente seguro que a audiência
agendada se realizará efectivamente, evitando a frustração das
deslocações dos advogados, das partes e testemunhas à sede do tribunal e
permitindo uma gestão racional e segura da agenda por parte do juiz e
do advogado".