domingo, 10 de julho de 2005

Juízes e estatística

Parece que um tribunal-piloto no norte do país já está informatizado ao nível de permitir o acesso directo aos operadores judiciários à informação sobre o andamento dos processos. Ora esta é a questão fulcral: a responsabilização por cada um dos atrasos de forma a permitir que os mesmos deixem de existir. Responsabilização que não é necessariamente disciplinar, como é evidente, mas que não se pode diluir em exclusivas culpas do "sistema". No livro Courtroom 302, em que um jornalista relata o dia-a-dia de um tribunal e de um juiz norte-americano, ao longo de um ano, também esta questão de os cidadãos poderem saber dos atrasos nos processos se põe. Mas aí o problema não é sequer disciplinar, é eleitoral: o juiz do Tribunal 302 é eleito pelos cidadãos de Chicago e, antes da eleição, são divulgados pela Chicago Crime Commission os "números" do juiz Locallo. Para além de se poder saber os processos por ano que estão pendentes, assim se detectando os processos que se começam a atrasar, podemos saber o tipo de soluções dadas aos processos e a sua frequência. Quantas vezes o juiz conseguiu terminar o processo sem chegar a julgamento? De que forma? Através da "confissão negociada", o plea bargaining (...)? Ora, no nosso país, em que não temos eleições dos magistrados judiciais nem parece que tais eleições sejam uma exigência do momento, podemos, no entanto, institucionalizar uma forma de controlo público do andamento dos processos. Parece ser um direito inequívoco das partes, mas também dos cidadãos em geral, saber do andamento dos processos judiciais, por sua natureza, públicos. Embora possa haver processos judiciais sobre os quais pode haver restrição no acesso ao conteúdo dos mesmos, tal restrição não abrangerá, certamente, o mero acompanhar do desenrolar temporal do processo, sem acesso ao conteúdo das peças processuais. (...) Poder saber-se em cada secção e em cada juízo de todos os tribunais do nosso país quantos processos se encontram pendentes, por ano de entrada, é essencial para se poder detectar e resolver os problemas/estrangulamentos do sistema judicial.

Francisco Teixeira da Mota, Público, 10Jul05

Casa da Suplicação XLVII

Habeas corpus — trânsito em julgado da sentença — recurso da sentença por co-arguidos — trânsito parcial — prisão preventiva — cumprimento da pena

1 - A medida coactiva de prisão preventiva extingue-se, entre outros casos, com o trânsito em julgado da sentença condenatória (art.º 214.º, n.º 1, al. e), do CPP), sendo que, como dispõe o artigo 677.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do art.º 4.º do CPP, a decisão se considera passada ou transitada em julgado, logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação nos termos dos artigos 668.º e 669.º.

2 - Assim, para o requerente, a decisão condenatória transitou em julgado, pois dela não interpôs recurso ordinário nem deduziu qualquer reclamação.

3 - Desde que o interessado não recorra da sentença, esta adquire a força de caso julgado parcial (em relação a ele), sem prejuízo de se vir a verificar uma condição resolutiva por procedência de recurso interposto por comparticipante e, ainda aí, sem violação da proibição de reformatio in pejus (cfr. art.º 409.º do CPP).

4 - O requerente está, assim, em cumprimento de pena e não em prisão preventiva.

Ac. de 07.07.2005 do STJ, proc. n.º 2546/05-5, Relator: Cons. Santos Carvalho

Acção cível conexa com a acção penal – legitimidade activa — contrato de comissão

I- Tendo sido a demandada (e arguida) condenada pela autoria de um crime de burla, por astuciosamente ter determinado a demandante a entregar-lhe objectos em ouro que dissipou em proveito próprio, os quais a demandante recebia de outrem com a finalidade de os vender mediante ganho de uma comissão ou para os restituir caso não os vendesse, e tendo a mesma demandada alegado que a legitimidade para o pedido pertencia à dona dos objectos e não à demandante, não se está perante uma questão de ilegitimidade, mas de eventual improcedência do pedido.

II- Na verdade, a legitimidade processual, que se não confunde com a denominada legitimidade substantiva, requisito da procedência do pedido, afere-se pelo pedido e causa de pedir, tal como os apresenta o autor, independentemente da prova dos factos que integram a última. Assim, a parte é legítima quando, admitindo-se que existe a relação material controvertida, ela for efectivamente seu titular. Por isso, de acordo com a petição formulada nos autos, a demandante é a titular activa da relação jurídica que aí vem configurada e, portanto, parte legítima.

III- Mas, por outro lado, o pedido não é improcedente, pois o contrato celebrado entre a demandante e a dona dos objectos é um contrato de comissão, já que “Dá-se contrato de comissão quando o mandatário executa o mandato mercantil, sem menção ou alusão alguma ao mandante, contratando por si e em seu nome, como principal e único contraente” (art.º 266.º do C. Comercial).

IV- E neste contrato “O comissário fica directamente obrigado com as pessoas com quem contrata, como se o negócio fosse seu, não tendo estas acção contra o comitente, nem este contra elas…” (art.º 268.º do mesmo diploma, com sublinhado nosso), pelo que a comitente (dona dos objectos) não podia ter acção contra a arguida, mas apenas a demandante na qualidade de comissária.

Ac. de 07.07.2005 do STJ, proc. n.º 2422/05-5, Relator: Cons. Santos Carvalho

Trânsito em julgado — despacho do relator — conclusões do recurso — limites de cognição do tribunal de recurso

I- O despacho proferido pelo relator do Tribunal da Relação não “transitou” em julgado em sentido técnico-jurídico, pois a Relação é um tribunal colegial e as suas decisões são os acórdãos e não os despachos do relator. Destes cabe reclamação (e não recurso) para a conferência e esta é que decide por acórdão (recorrível).

II- O tribunal de recurso está limitado pelas conclusões do recurso, no sentido em que são essas as questões que tem de conhecer obrigatoriamente, o que não impede que possa e deva conhecer oficiosamente de todas as questões de direito que tiver por oportunas.

III- O trânsito em julgado de uma sentença condenatória não está dependente de um despacho declarativo, pois ocorre por força da própria lei,

Ac. de 07.07.2005 do STJ, proc. n.º 1310/05-5, Relator: Cons. Santos Carvalho

As corporações e a república


Infelizmente, foi preciso o problema do défice orçamental ter atingido a gravidade que se conhece para situações inadmissíveis numa república e num país como o nosso surgirem à luz do dia. E não sei se o actual Governo terá a fortaleza e a perseverança suficientes para levar até ao fim a sua correcção. Como quer que seja, deve ser louvado por anunciar reformas que sucessivos governos, ao longo dos anos, não quiseram ou não puderam empreender.

Não menos chocantes do que muitas situações viriam a ser, porém, as reacções corporativas logo desencadeadas - ora disfarçadas sob a forma de reivindicações sindicais, ora invocando pretensos direitos adquiridos, ora intentando manter insustentáveis regimes especiais ou excepcionais. Causa espanto que se manifestem tantos egoísmos corporativos e tanta falta de solidariedade nacional!
Paradigmáticos são, entre vários casos que poderiam ser referidos, os casos dos professores sindicalistas do ensino básico e secundário, de alguns juízes, de presidentes de câmara municipal e de deputados. Paradigmáticos e difíceis de entender, em face do lugar eminente que ocupam na sociedade e do magistério cívico que lhes deveria estar associado.
(...)
Outro caso: a reacção de alguns juízes perante certas medidas anunciadas pelo Governo. Os juízes, os magistrados do Ministério Público e quantos trabalham nos tribunais (não raro em condições precárias) merecem todo o respeito. No entanto, justamente por isso, eles devem dar-se ao respeito, não fazendo declarações, movimentações e ameaças de greve que contrariam o seu estatuto constitucional de titulares de órgãos de soberania. Então os órgãos de soberania podem fazer greve? Admiti-lo, admitir as formas de luta que alguns juízes reclamam, equivaleria a pôr em causa o próprio Estado.
(A este propósito, vale a pena perguntar se, em vez da redução das férias judiciais, outra providência legislativa não deveria ser adoptada: a proibição absoluta de qualquer juiz ou qualquer magistrado do Ministério Público desempenhar funções estranhas aos tribunais. E isso não tanto por causa da multiplicação de processos quanto por imperativo de dignidade das respectivas funções. Como conceber um juiz - que deve ser isento politicamente e independente - a assumir cargos políticos ou de confiança política? Não representa tal o contrário da atitude que os deve marcar? E como conceber que depois voltem à carreira e até, por vezes, venham a ser promovidos?
(...)
Mais do que o respeito do princípio republicano como princípio jurídico, está aqui em causa a ética republicana como ética de responsabilidade, de exigência cívica e de desprendimento ao serviço do interesse geral. Esperamos que ela venha a prevalecer!

Jorge Miranda, Público, 09Jul05

Um curso de história do Direito

Em LE PONT - Science et Droit, um site de Jean-Pierre Baud, Professor em Paris X Nanterre, pode seguir-se um curso de história do direito, intitulado Fondements historique du droit.

Nova versão do site web do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

La Cour européenne des Droits de l’Homme lance le 5 juillet 2005 son nouveau site Internet (http://www.echr.coe.int/). Ce site Internet a été créé par Actweb, une agence strasbourgeoise de design, et mis en œuvre par la division informatique de la Cour. Le site de la Cour a été totalement refait afin d’améliorer l’accès à une plus grande variété d’informations touchant à l’organisation de la Cour, ses activités ainsi que sa jurisprudence. Il comporte des nouveautés : des pages spéciales pour différentes catégories d’utilisateurs, une foire aux questions et des informations plus complètes sur la Cour et le greffe. Le site sera mis à jour régulièrement et certains éléments seront ajoutés ou développés au cours des prochains mois.

Luzius Wildhaber, président de la Cour européenne, a déclaré : « Compte tenu de l’intérêt considérable que suscitent les travaux de la Cour, Internet doit être le point central de ses activités en matière d’information. La sensibilité aux droits de l’homme s’accroît constamment et a en soi un effet préventif important. En facilitant l’accès à la jurisprudence de la Cour, non seulement pour les spécialistes – juges, avocats et universitaires –, mais aussi pour le grand public, nous contribuons à renforcer les normes en matière de droits de l’homme dans tous les pays où la Convention européenne des Droits de l’Homme s’applique et même au-delà. »

Le site Internet de la Cour a reçu plus de 57 millions de visites en 2004 – chiffre qui devrait être encore plus élevé en 2005.