Tive o prazer de apresentar no 1.º Congresso Português de Criminologia,sob o título O Saber Criminológico, da Noção à Intervenção, o Papel do
criminólogo, organizado pela Associação Portuguesa de Criminologia, em Vila Nova
de Gaia de 18 a 19 de Outubro de 2012, uma intervenção sobre o Apoio Judicial, tema que me fora atribuído e que aqui divulgo.
Apoio
à Tomada de Decisão Judicial[1] - 1
I
Agradeço
o convite para participar neste 1.º Congresso Português de Criminologia,
organizado pela Associação Portuguesa de Criminologia, que assim dá uma
importante prova pública da sua vitalidade e da sua condição de garante da nova
afirmação, entre nós, da Criminologia e dos criminólogos.
Com
efeito, é de saudar a existência de uma Associação de Criminologia que congregue
os criminólogos (ou criminologistas) e que procura contribuir para a afirmação
deste ofício no sistema legal e na sociedade civil, de maneira a que a sua
formação multi, intra e transdisciplinar possa ser (melhor) aproveitada para a
maior compreensão, prevenção e intervenção sobre o crime.
Embora
o tema mencione a decisão judicial, impõe-se que se aborde não só estas
decisões, mas igualmente as decisões dos magistrados do Ministério Público que
desempenham um relevantíssimo papel no sistema de Justiça Penal, um campo de
estudo e acção essencial à Criminologia. Falaremos, pois e nesta lógica, sobre o
Apoio à Tomada de Decisão Judiciária
e não só judicial, de forma a abranger não só as decisões dos juízes, mas também
do Ministério Público.
II
2.1.
Pode-se
começar por falar, a este propósito, em Sistemas de informação na Justiça[2],
assim introduzindo a utilização das Tecnologias do Informação e Comunicação
(TIC)[3]
na gestão e uso de sistemas de informação na área da Justiça.[4]
O
estudo sistemático dos Sistemas de
informação na Justiça permite:
–
percepcionar o táctico e o estratégico na gestão da informação numa organização
que se preocupa com a aplicação da Justiça;
–
sumariar e avaliar as limitações e o potencial dar TIC neste âmbito,
nomeadamente no que concerne às bases de dados, bases de conhecimento, sistemas
de informação geográfico, assim como a uma miríade de formas de comunicação, de
obter informação, capacidade de investigação e conhecimento através da resolução
de problemas[5];
de descrever e sumariar as alterações que se têm vindo a notar na prática de
crimes, assim como o advento de novos tipos de crime; de colocar o papel da
tecnologia e da gestão da informação num mais amplo contexto, através do exame
histórico, teórico e desenvolvimentos práticos das TIC na aplicação da
Justiça.
Nesta
oportunidade não é possível, ir além de um apontamento sobre as algumas dos mais
importantes meios de apoio à decisão e, finalmente, estabelecer alguma relação
com a criminologia.
2.2.
As
bases de dados informatizadas da
lei, doutrina e jurisprudência destacam-se como elementos muito importantes, no
acesso à justiça e no apoio à decisão.
O
Estado tem o dever não só de publicar a lei no jornal oficial, mas de a divulgar
ao ponto de se tornar acessível ao cidadão em geral e ao jurista em particular.
Por isso a própria Lei de formulário dos actos legislativos[6]
impõe hoje a republicação das leis, pela lei de alteração, sempre que a
alteração atinge determinado alcance.
Mesmo
os juristas têm dificuldade em conhecer (mesmo só) as leis essenciais que regem
o país.[7]
Daí
que a Imprensa Nacional-Casa da Moeda ponha à disposição, através da Internet[8],
o acesso a todos os diários publicados na 1.ª Série do Diário da República (DR)
desde 1960. Desde 1 de Julho de 2006, a edição electrónica do DR faz fé plena e
a publicação dos actos através dela realizada vale para todos os efeitos
legais.
O Digesto[9]
disponibiliza ferramentas de pesquisa e tratamento de informação sobre a
vigência e produção de efeitos de todos os actos publicados na 1.ª Série do D.R.
desde 1 de Janeiro de 1979, bem como de diversos documentos de décadas
anteriores, sendo acessível aos magistrados gratuitamente através da rede do
Ministério da Justiça.
A
Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa disponibiliza, igualmente na Internet, o
acesso gratuito à principal legislação nacional, actualizada e tratada[10].
Mas
o n.º 2 do art. 20.º da Constituição da República confere a todos os cidadãos
também o direito à informação (e consulta) jurídicas, sendo que, todavia, a
jurisprudência normalmente só chega aos "iniciados", e justifica-se o
fornecimento dessa informação tanto para a lei como para as decisões
jurisprudenciais que a interpretam[11].
Na
verdade, o Estado tem o dever da divulgar o direito junto do jurista e do
cidadão, incluindo a jurisprudência dos tribunais. A decisão jurisprudencial
traduz-se essencialmente na resposta à questão ou questões concretas colocadas
ao tribunal, assumindo particular relevo a sua motivação ou justificação. Mesmo
num sistema como o português, em que é restrito o valor do precedente judicial,
é importante, à luz da igualdade na aplicação da lei e da desejável
previsibilidade das decisões judiciais, o conhecimento e ponderação pelas
autoridades judiciárias das anteriores decisões sobre a mesma
matéria.
No
sítio http://www.dgsi.pt/ estão sediadas as Bases
Jurídico-Documentais em que participou o Ministério da Justiça, através do ITIJ
– Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça[12].
São 16 as Bases Jurídicas com 259.048 documentos, provenientes dos Tribunais
Superiores, da Procuradoria-Geral da República e dos Julgados de Paz[13].
Existem
várias outras Bases de Dados Jurídicas públicas[14],
gratuitas e privadas, destacando-se entre aquelas as oferecidas pela
Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, referentes ao Supremo Tribunal de
Justiça, Tribunal Constitucional e Tribunal da Relação de
Lisboa.
A
verdadeira acessibilidade da informação respeitante à jurisprudência implica
face opacidade decorrente do uso de vocabulário técnico e à polissemia interna e
externa do discurso jurídico, impõe o tratamento prévio à sua informatização,
que não cabe aqui detalhar[15].
O
mesmo sítio do ITIJ disponibiliza 19 Bases
de Dados Documentais[16]
públicas e gratuitas, com 320.493 documentos, no essencial, monografias e
revistas periódicas. Mas está igualmente disponível gratuitamente um catálogo
colectivo das bibliotecas portuguesas com mais de 2.500.000 registos
bibliográficos[17].
[continua...]
Simas Santos
__________________________________________
[1] Intervenção na
5.ª Mesa de Conferências do 1.º Congresso Português de Criminologia, sob o
título O Saber Criminológico, da Noção à Intervenção, o Papel do criminólogo,
organizado pela Associação Portuguesa de Criminologia, em Vila Nova de Gaia de
18 a 19 de Outubro de 2012.
[2] Expressão
tomada, aliás, como designação de uma unidade curricular do Mestrado em
Administração da Justiça, da Escola de Escola de Economia e Gestão da
Universidade do Minho.
[3] Stuart Russel.
Peter Norvig, ‘Artificial
lntetligence A Modern Approach’, 2ª Ed., Prentice lnternational. Inc.
2003.
[4] Tendo
presentes: (i) os condicionalismos e
os impactos que têm em tais sistemas; (ii) a existência e a possibilidade no
acesso aos mais recentes avanços tecnológicos no domínio das TIC, por
especialistas da área; (iii) as
tendências e o uso deste tipo de tecnologia, em termos do seu impacto, na acção
policial, investigação criminal, resposta a incidentes, assim como na gestão e
manipulação de dados pessoais, em termos de Direito; (iv) e o confronto com a necessidade de
responder a novos desafios que, cada vez com mais premência, lhe são colocados
por um novo meio ambiente, informático, digital e
tecnológico.
[5] De expressar,
interpretar e avaliar os impactos de natureza ética e social que decorrem da
utilização de sistemas de informação na aplicação da
Justiça.
[6] Publicação,
Identificação e Formulário dos Diplomas, Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro,
alterada pelas Leis n.ºs 2/2005, de 24 de Janeiro n.º 26/2006, 30 de Junho e n.º
42/2007, de 24 de Agosto.
[7] Embora se
possa dizer que não aproveitar da ignorância da lei não é sinónimo de obrigação
do conhecimento efectivo da lei, torna-se de meridiana evidência que aquele
adágio tende a ser ultrapassado, sob pena de flagrante
hipocrisia.
[8]
Diário da República Electrónico, http://www.dre.pt/.
[9] O DIGESTO, Sistema Integrado para o Tratamento da
Informação Jurídica, visa o tratamento da informação legislativa, regulamentar e
doutrinária do ordenamento jurídico português, destinado a apoiar o Governo bem
como a comunidade jurídica do sector público e privado, podendo ser subscrito
pelos utilizadores particulares.
[10] www.pgdlisboa.pt, onde se disponibiliza
igualmente informação sobre a actualidade,
jurisprudência
e um fórum.
[11] Implicitamente
doutrina dos pensadores do direito.
[12] Podem ser
encontradas Instruções para a Utilização da Base de Dados do STA, comuns às
restantes bases em http://www.stadministrativo.pt/manual/index.htm,
bem como seguinte apoio do ITIJ: Helpdesk Telefone 707 200 004
(dias úteis, das 8 às 20), Email: Dificuldades técnicas: helpdesk@itij.mj.pt, outras
questões: correio@itij.mj.pt
[13] Supremo
Tribunal de Justiça (52975 doc.), Presidente do Supremo Tribunal de Justiça,
Tribunal Constitucional (até 1998) (6107 doc.), Supremo Tribunal Administrativo
(69401 doc.), Tribunal dos Conflitos (500 doc.), Procuradoria Geral da República
(9122 doc.), Relação do Porto (45467 doc.), Relação de Lisboa (39878 doc.),
Relação de Coimbra (7490 doc.), Relação de Guimarães (3081 doc.), Relação de
Évora (4143 doc.), Tribunal Central Administrativo Sul (11091 doc.), Tribunal
Central Administrativo Norte (5470 doc.), Ministério Publico - Tribunal Central
Administrativo Sul (3794 doc.)(316 doc.), Registo de Cláusulas Contratuais
Abusivas julgadas pelos tribunais (213 doc.) e Jurisprudência dos Julgados de
Paz (3293 doc.).
[14] Como as
constantes das páginas do Tribunal Constitucional, www.tribunalconstitucional.pt, e
de várias Relações.
[15] Pode-se porém
referir algumas regras essenciais:
3. A linguagem
de direito apresenta muitas vezes opacidade para o cidadão comum, decorrente do
uso da um vocabulário técnico,
4. É inevitável
a polissemia interna e externa do discurso jurídico, a qual tem de ser
recenseada e classificada antas da transposição das decisões para o
computador.
5. Também a
identificação e tratamento das relações de sinonímia, antonímia,
generalidade/especialidade e vizinhança, têm de preceder a informatização como
forma da viabilizar a pertinência das futuras pesquisas.
6. É preciso
definir se a aplicação deve ser desenvolvida como sistema de descritores, texto
completo, ou misto.
6.1 No caso de
texto completo qualquer palavra (com exclusão das "palavras vazias") podará
servir para indexar o documento.
6.2 No caso dos
sistemas de descritores só estes são considerados "palavras-chave" para
recuperação da informação do documento, que poderá contar uma parte
textual.
6.3 No caso dos
sistemas mistos a recuperação poderá ser efectuada como se referiu em 6.1 a
6.2.
7. A designação
informática ”texto completo" tem um significado diferente da texto integral
(total) do documento. ”Texto completo" está associado à técnica informática que
permite pesquisar um texto por qualquer palavra. A aplicação em ”texto completo"
pode incidir sobre a totalidade do documento ou não.
7.1 A opção de
introduzir todo o texto no computador depende das áreas a
informatizar.
7.2 No caso da
legislação parece inevitável para o bom sucesso da mesma que toda a informação
contida no documento seja introduzida.
No caso da
jurisprudência várias alternativas podem ser adoptadas.
8. Em qualquer
das alternativas seguidas a indexação dos documentos por intermédio de
descritores mostra-se sempre de grande utilidade, mesmo no sistema de texto
completo.
8.1 Estes
descritores podem estar ou não constituídos em Thesaurus.
As dificuldades
em constituir uma equipa que reúna juristas, linguistas e informáticos para
elaborarem o "Thesaurus” ou "Thasauri", associada à inexistência de um
"software" capaz de o gerir automaticamente, bem como ser controversa a sua
necessidade, podem levar à sua omissão.
8.2 No
Ministério da Justiça ultrapassou-se a inexistência do Thesaurus, através da
criação, extremamente cuidada, dos descritoras e as questões inerentes à
polissemia, poderão considerar-se em parte resolvidas pela existência de áreas
temáticas associadas a cada documento.
8.3 As questões
levantadas pela sinonímia, que o Thesaurus resolve, podem também ser
solucionadas no sistema que, está implantado embora, até ao momento, não tenha
sido tomada uma decisão nesse sentido.
9 Sempre que a
aplicação implique análise jurídica prévia o analista deve ter acesso à
globalidade do documento que vai servir de fonte à criação das bases de dados
informáticas.
10 É
indispensável a existência de uma lista de "palavras vazias" com o duplo
objectivo de evitar o "ruído" durante a pesquisa e de diminuir o espaço em
memória magnética que é ocupado pelos índices remissivos para o
documento.
11 Se a base da
dados contiver "campos" específicos reservados a informação especial (tais como
legislação invocada, legislação comunitária invocada, jurisprudência
internacional invocada, etc.) esta deve obedecer a critérios de normalização no
modo de ser explicitada, ainda que no texto do documento apareça tal como o
autor a escreveu.
12 Devam ser
implementados mecanismos de segurança para o acesso às bases de dados em termos
de impedir o seu acesso e a sua alteração, por utilizadores não autorizados e
entre os autorizados inibir a visualização de alguns documentos ou parte dos
documentos, se isso se mostrar relevante.
12.1
Simultaneamente devem ser implementados processos para o utilizador seleccionar
só a parte dos documentos que pretende receber, evitando-lhe assim dispêndio de
tampo no seu estudo e encargos com a transmissão de dados.
13 Para além da
auscultação dos utilizadores das bases da dados para avaliar a sua qualidade,
torna-se necessário criar procedimentos internos de avaliação contínua para
determinar a ”performance” do sistema, no que diz respeito a tempos de resposta,
factores da ruído, eficácia do sistema, etc.
14 Embora a
utilização de uma linguagem de pesquisa próxima da linguagem natural com auxílio
de operadores e símbolos semelhantes aos usados em matemática seja o processo
mais adequado para a exploração de bases de dados deste tipo, são de incentivar
todas as metodologias que venham a simplificar o processo de
pesquisa.
15 Contudo,
mais importante do que o referido no número anterior será a uniformização das
linguagens de interrogação quando um utilizador acede a diversas bases de dados,
produzidas por diferentes organismos.
15.1 Na
impossibilidade de todos os construtores aderirem aos mesmos "softwares” da
desenvolvimento, a alternativa seria a existência da um único centro difusor da
informação a que todos os utilizadores se ligassem, o qual por sua vez,
estabeleceria a comunicação com os equipamentos onde estivessem sediadas as
bases de dados ou, por intermédio de contratos a estabelecer, lhe fosse
permitido possuir cópias dessas bases de dados.
Tal centro
difusor teria, entre outras, a incumbências da normalização da linguagem de
pesquisa.
[16] Bibliotecas do
Supremo Tribunal de Justiça (10107 doc.), do Supremo Tribunal Administrativo
(14396 doc.), da Procuradoria-Geral da República (189310 doc.), do Conselho
Superior da Magistratura (1579 doc.), da Relação do Porto (2245 doc.), da
Relação de Lisboa (4580 doc.), da Relação de Coimbra (1352 doc.), do Tribunal
Central Administrativo Sul (1273 doc.), do Tribunal Central Administrativo Norte
(12097 doc.), do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (1743 doc.), do
Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal (969 doc.), do Centro de Estudos
Judiciários (16750 doc.), do Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça
(15329 doc.), do Centro de Documentação da Polícia Judiciária (20491 doc.), da
Direcção Geral da Política de Justiça (5074 doc.), da Direcção-Geral de
Reinserção Social (17383 doc.), da Secretaria Geral do Ministério da Justiça
(3737 doc.), da Inspecção-Geral dos Serviços de Justiça (938 doc.), do Instituto
Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna (PSP/MAI) (4778
doc.)
[17] Nos sítios http://www.porbase.org/ e http://porbase.bnportugal.pt
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