Recurso extraordinário de revisão – Dupla sentença condenatória – Ne bis in idem
1 – A segurança é seguramente um dos fins do processo penal, não é seguramente o único e nem sequer o prevalente, que se encontra antes na justiça, inscrevendo-se o recurso de revisão nas garantias constitucionais de defesa (n.º 6 do art. 29.º da Constituição).
2 – Foi, assim, escolhida uma solução de compromisso entre o interesse de dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, e que se traduz na possibilidade limitada de revisão das sentenças penais, com fundamento em:
― Falsidade dos meios de prova: falsidade reconhecidos por sentença transitada, de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão a rever (art. 449.º, n.º 1, al. a)];
― Sentença injusta: crime cometido por juiz ou jurado, reconhecido em sentença transitada relacionado com o exercício de funções no processo [art. 449.º, n.º 1, al. b)];
― Inconciabilidade de decisões: inconciabilidade entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. c)];
― Descoberta de novos factos ou meios de prova: descoberta de novos factos ou meios de prova que, confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. d)].
3 – Em caso de violação do princípio "non bis in idem", igualmente com consagração constitucional (artº 29º, nº 5 da Constituição), traduzida no facto de o arguido ser julgado por factos pelos quais já havia sido julgado com transito, deve, por aplicação do art. 675º, nº 1 do CPC, cumprir-se, tão só, a decisão transitada em primeiro lugar, pois também aqui está presente a contradição exigida, referida, não ao sentido das decisões, mas à contradição formal (contradição por coincidência, em função da regra ne bis in idem).
4 – Por outro lado, não está em causa a descoberta de factos novos ou novos meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Também não está em causa a al. c) do mesmo n.º 1, na medida em que os factos que serviram de fundamento à condenação proferida na sentença revidenda não são inconciliáveis com os dados que fundamentaram a condenação na sentença anterior proferida noutro processo.
Ac. do STJ de 06.07.2006, proc. n.º 2424/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
Decisão proferida contra jurisprudência fixada – Recurso extraordinário – Prazo de interposição do recurso
Só depois do trânsito em julgado de decisão do Tribunal da Relação ou do STJ contrária a jurisprudência fixada, é que pode ter lugar o recurso previsto no art. 446.º do CPP.
Ac, do STJ de 06.0702006, proc. n.º 1615/06-5, Relator: Cons. Simas Santos, com voto de vencido do Relator, quanto a esse prazo.
Contra-ordenação – Eleições autárquicas – Tratamento igual das candidaturas – Proibição de tratamento jornalístico discriminatório – Televisão – Debates – Candidaturas “com representação na Assembleia Municipal” – Infracção continuada
1 – Se um arguido num processo de contra-ordenação não invocou, na sua defesa perante a Comissão Nacional de Eleições, que não é ele o proprietário de uma “publicação informativa”, já não pode fazê-lo no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, pois que os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas não apreciadas pela entidade recorrida, mas sim para apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso
2 – Interpretar, em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva. É fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja determinar o seu sentido e alcance decisivo, pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei.
3 – Os art.ºs 49.º e 212.º da LEOAL (Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto) dirigem-se a todos os órgãos de comunicação social e publicações informativas, e não só à imprensa escrita, o que inclui as televisões a quem se impõe igualmente o dever de dar um tratamento jornalístico não discriminatório às diversas candidaturas em presença, na decorrência dos princípios gerais de direito eleitoral consagrados na Constituição, nomeadamente do princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas, prescrita na al. b) do n.º 3 do seu art. 113.º, que a LEOAL, enquanto legislação eleitoral, reafirmou e desenvolveu, vinculando todas as entidades públicas e privadas.
4 – Pretendeu a lei impedir que os órgãos de informação, pela sua importância no esclarecimento do eleitorado, bloqueiem a comunicação entre as acções das candidaturas e os eleitores ou que realizem um tratamento jornalístico que, de alguma maneira, gere uma deturpação daquelas mesmas acções junto dos eleitores.
5 – O que não é contrariado pela liberdade de expressão e criação dos jornalistas, que não tem um carácter absoluto, uma vez que tem de ser conjugado, no caso, com o falado dever de igualdade de tratamento das candidaturas aos órgãos de poder local.
6 – A exclusão de candidaturas de debates públicos, com convites dirigidos só a candidaturas “com assento na assembleia municipal” viola esse dever de tratamento igual e não discriminatório, pois que actividade dos órgãos de comunicação social, que façam a cobertura da campanha eleitoral, deve ser norteada por critérios que cumpram os requisites de igualdade entre todas as forças concorrentes às eleições; por preocupações de equilíbrio e abrangência, não podem adoptar condutas que conduzam à omissão de qualquer uma das candidaturas presentes.
7 – Sendo a estação de televisão a marcar unilateralmente e sem fundamentar a duração do debate e não determinando em concreto se o número de candidaturas impedia tecnicamente esse debate, nunca poderia invocar sequer a necessidade de um critério limitativo.
8 – E tendo a CNE tomado anteriormente deliberações a relação à mesma estação de repúdio do critério que norteara o adoptado: «candidaturas com representação parlamentar», não pode esta invocar um pretenso erro sobre o elemento normativo do tipo.
9 – É pressuposto essencial da continuação criminosa a existência de uma relação que, de fora, e de modo considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito, o que se não verifica quando o que facilitou a repetição da sua actividade foi o seu próprio entendimento que esteve subjacente àquela repetição
Ac. do STJ de 06.07.2006, proc. n.º 1383/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
1 – A segurança é seguramente um dos fins do processo penal, não é seguramente o único e nem sequer o prevalente, que se encontra antes na justiça, inscrevendo-se o recurso de revisão nas garantias constitucionais de defesa (n.º 6 do art. 29.º da Constituição).
2 – Foi, assim, escolhida uma solução de compromisso entre o interesse de dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça, e que se traduz na possibilidade limitada de revisão das sentenças penais, com fundamento em:
― Falsidade dos meios de prova: falsidade reconhecidos por sentença transitada, de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão a rever (art. 449.º, n.º 1, al. a)];
― Sentença injusta: crime cometido por juiz ou jurado, reconhecido em sentença transitada relacionado com o exercício de funções no processo [art. 449.º, n.º 1, al. b)];
― Inconciabilidade de decisões: inconciabilidade entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. c)];
― Descoberta de novos factos ou meios de prova: descoberta de novos factos ou meios de prova que, confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação [art. 449.º, n.º 1, al. d)].
3 – Em caso de violação do princípio "non bis in idem", igualmente com consagração constitucional (artº 29º, nº 5 da Constituição), traduzida no facto de o arguido ser julgado por factos pelos quais já havia sido julgado com transito, deve, por aplicação do art. 675º, nº 1 do CPC, cumprir-se, tão só, a decisão transitada em primeiro lugar, pois também aqui está presente a contradição exigida, referida, não ao sentido das decisões, mas à contradição formal (contradição por coincidência, em função da regra ne bis in idem).
4 – Por outro lado, não está em causa a descoberta de factos novos ou novos meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Também não está em causa a al. c) do mesmo n.º 1, na medida em que os factos que serviram de fundamento à condenação proferida na sentença revidenda não são inconciliáveis com os dados que fundamentaram a condenação na sentença anterior proferida noutro processo.
Ac. do STJ de 06.07.2006, proc. n.º 2424/06-5, Relator: Cons. Simas Santos
Decisão proferida contra jurisprudência fixada – Recurso extraordinário – Prazo de interposição do recurso
Só depois do trânsito em julgado de decisão do Tribunal da Relação ou do STJ contrária a jurisprudência fixada, é que pode ter lugar o recurso previsto no art. 446.º do CPP.
Ac, do STJ de 06.0702006, proc. n.º 1615/06-5, Relator: Cons. Simas Santos, com voto de vencido do Relator, quanto a esse prazo.
Contra-ordenação – Eleições autárquicas – Tratamento igual das candidaturas – Proibição de tratamento jornalístico discriminatório – Televisão – Debates – Candidaturas “com representação na Assembleia Municipal” – Infracção continuada
1 – Se um arguido num processo de contra-ordenação não invocou, na sua defesa perante a Comissão Nacional de Eleições, que não é ele o proprietário de uma “publicação informativa”, já não pode fazê-lo no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, pois que os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas não apreciadas pela entidade recorrida, mas sim para apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso
2 – Interpretar, em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva. É fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja determinar o seu sentido e alcance decisivo, pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei.
3 – Os art.ºs 49.º e 212.º da LEOAL (Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto) dirigem-se a todos os órgãos de comunicação social e publicações informativas, e não só à imprensa escrita, o que inclui as televisões a quem se impõe igualmente o dever de dar um tratamento jornalístico não discriminatório às diversas candidaturas em presença, na decorrência dos princípios gerais de direito eleitoral consagrados na Constituição, nomeadamente do princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas, prescrita na al. b) do n.º 3 do seu art. 113.º, que a LEOAL, enquanto legislação eleitoral, reafirmou e desenvolveu, vinculando todas as entidades públicas e privadas.
4 – Pretendeu a lei impedir que os órgãos de informação, pela sua importância no esclarecimento do eleitorado, bloqueiem a comunicação entre as acções das candidaturas e os eleitores ou que realizem um tratamento jornalístico que, de alguma maneira, gere uma deturpação daquelas mesmas acções junto dos eleitores.
5 – O que não é contrariado pela liberdade de expressão e criação dos jornalistas, que não tem um carácter absoluto, uma vez que tem de ser conjugado, no caso, com o falado dever de igualdade de tratamento das candidaturas aos órgãos de poder local.
6 – A exclusão de candidaturas de debates públicos, com convites dirigidos só a candidaturas “com assento na assembleia municipal” viola esse dever de tratamento igual e não discriminatório, pois que actividade dos órgãos de comunicação social, que façam a cobertura da campanha eleitoral, deve ser norteada por critérios que cumpram os requisites de igualdade entre todas as forças concorrentes às eleições; por preocupações de equilíbrio e abrangência, não podem adoptar condutas que conduzam à omissão de qualquer uma das candidaturas presentes.
7 – Sendo a estação de televisão a marcar unilateralmente e sem fundamentar a duração do debate e não determinando em concreto se o número de candidaturas impedia tecnicamente esse debate, nunca poderia invocar sequer a necessidade de um critério limitativo.
8 – E tendo a CNE tomado anteriormente deliberações a relação à mesma estação de repúdio do critério que norteara o adoptado: «candidaturas com representação parlamentar», não pode esta invocar um pretenso erro sobre o elemento normativo do tipo.
9 – É pressuposto essencial da continuação criminosa a existência de uma relação que, de fora, e de modo considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente, isto é, de acordo com o direito, o que se não verifica quando o que facilitou a repetição da sua actividade foi o seu próprio entendimento que esteve subjacente àquela repetição
Ac. do STJ de 06.07.2006, proc. n.º 1383/06-5, Relator: Cons. Simas Santos