Debate – Relações laborais
Glória Rebelo
Em junho de 2008, no Acordo Tripartido para um Novo Sistema de Regulação das Relações Laborais, das Políticas de Emprego e da Proteção Social em Portugal, os parceiros sociais confirmaram a necessidade de reforçar os instrumentos de inspeção das condições de trabalho.
Deste acordo resultou o entendimento que devia ser consagrado à Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) um conjunto de meios de ação nas suas áreas de competência, designadamente reforçando o quadro de sanções acessórias, simplificando a tramitação administrativa do procedimento contraordenacional e alargando o quadro de inspetores, com vista a atingir um total de 400 inspetores, num aumento médio anual de 50 efetivos entre 2009 e 2011.
Contudo, a promoção de uma maior efetividade legal na área laboral tem sido um caminho longo e, no atual momento de aumento de desemprego com o Eurostat a estimar uma taxa de desemprego de 17,8% em abril último, o desafio de tornar efetiva a legislação laboral torna-se ainda mais complexo.
Perante este cenário, adensa a dúvida sobre qual a eficácia da ação inspetiva pública. Neste difícil contexto – tanto mais que cresce a perceção de um “maior incumprimento laboral” – os poderes públicos deverão assumir um papel decisivo no garante de níveis razoáveis de cidadania social, pugnando por um claro e imprescindível reforço da dimensão ética na esfera laboral.
Desde logo, porque se a cidadania social constitui um dos fundamentos mais marcantes do moderno Estado social e das políticas públicas, ante o aumento do desemprego, de formas de contratação não permanente, de uma menor propensão para o investimento na formação profissional, ou de práticas de distorção da concorrência entre empresas e sectores (vide empresas que laboram em situação legal e suportam maiores encargos sociais), torna-se fulcral reforçar a fiscalização das condições de trabalho.
Acresce que, num momento de difícil conjuntura económica e social, urge que se entenda que a atividade laboral tende a ser acompanhada de um perigoso sentimento de banalização e de impunidade, tornando-se necessário que não só no plano da sociedade civil os cidadãos sejam sensibilizados os seus efeitos nocivos como no plano político (e da definição de políticas públicas) se avalie a dimensão do fenómeno e se encoraje a realização de estudos que permitam uma compreensão global do fenómeno, abrangente e multidisciplinar, que permitam identificar ao nível sectorial e de empresa a efetividade legal.
Como ainda no plano das políticas públicas – e porque a recessão económica tende a amplificar a economia informal e o trabalho clandestino – importa prosseguir uma articulação eficaz entre os serviços públicos de tutelas distintas (mormente, a ACT, a Inspeção Tributária e a Inspeção da Segurança Social) que reforce uma ação interventiva conjunta.
Desde o final do século XIX – com o aparecimento da consciência da necessidade da intervenção do Estado na fiscalização das condições de execução do trabalho – que um dos desafios ao funcionamento das Inspeções de Trabalho (em prol da afirmação de uma cidadania social) tem sido o de elevar os níveis de efetividade legal laboral. Mas este intento não dependerá só da ação do Estado – mediante um fortalecimento da intervenção da ACT, a quem incumbe controlar as condições de trabalho e fazer cumprir a legislação laboral – mas também da interação de empregadores e trabalhadores, que seguindo a lei devem assegurar boas condições de trabalho. Professora universitária e investigadora