quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Casa da Suplicação

Habeas corpus - prisão preventiva - pressupostos - despacho de pronúncia - efeitos - qualificação juridica
I – A providência excepcional de habeas corpus não se substitui nem pode substituir-se aos recursos ordinários, ou seja, não é nem pode ser meio adequado de pôr termo a todas as situações de ilegalidade da prisão. Está reservada, quanto mais não fosse por implicar uma decisão verdadeiramente célere – mais precisamente «nos oito dias subsequentes» ut art.º 223.º, n.º 2, do Código de Processo Penal – aos casos de ilegalidade grosseira, porque manifesta, indiscutível, sem margem para dúvidas, como o são os casos de prisão «ordenada por entidade incompetente», «mantida para além dos prazos fixados na lei ou decisão judicial», e como o tem de ser o «facto pela qual a lei a não permite».
II – Não se esgotando no expediente de excepção os procedimentos processuais disponíveis contra a ilegalidade da prisão e a correspondente ofensa ilegítima à liberdade individual, o lançar mão daquele expediente só em casos contados deverá interferir com o normal regime dos recursos ordinários: justamente, os casos indiscutíveis ou de flagrante ilegalidade, que, por serem-no, permitem e impõem uma decisão tomada com imposta celeridade. Sob pena de, a não ser assim, haver o real perigo de tal decisão, apressada por imperativo legal, se volver, ela mesma, em fonte de ilegalidades grosseiras, porventura de sinal contrário, com a agravante de serem portadoras da chancela do Mais Alto Tribunal, e, por isso, sem remédio.III – Em consequência desta específica circunstância processual do habeas corpus, a matéria de facto sobre que há-de assentar a decisão tem forçosamente de ser certa, ou, pelo menos, estabilizada, sem prejuízo de o Supremo Tribunal de Justiça poder ordenar algumas diligências de última hora – art.º 223.º, n.º 4, b), do Código de Processo Penal – mas sempre sem poder substituir-se à instância de julgamento da matéria de facto, e apenas como complemento esclarecedor de eventuais lacunas de informação do quadro de facto porventura subsistentes, com vista à decisão, ou seja, na terminologia legal, cingidas a esclarecer «as condições de legalidade da prisão».
IV – A natureza sumária e expedita da decisão de habeas corpus não permite que, não estando ainda firmes os factos, e o aspecto jurídico da questão se apresente problemático, o Supremo Tribunal de Justiça se substitua, de ânimo leve, às instâncias, ou mesmo à sua própria eventual futura intervenção de fundo no caso, por via de recurso ordinário, e, sumariamente, possa, ainda que de forma implícita, censurar aquelas por haverem levado a cabo alguma ilegalidade, que, para o efeito, importa que seja indiscutível. Até porque, não estabilizados [ainda] os factos e permanecendo discutível e não consensual a solução da questão jurídica, dificilmente se pode imputar, fundadamente, à decisão impugnada, qualquer que ela seja, mas sempre emanada de uma instância judicial, numa apreciação pouco menos que perfunctória, o labéu de ilegalidade, grosseira ou não.
V – Havendo os factos imputados ao arguido sido objecto de despacho de pronúncia ainda não transitado em julgado por ser objecto de recurso ainda pendente mas com efeito meramente devolutivo, que teve por indiciada a prática, em autoria material e em concurso real, de «um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158.º, n.º 2, alíneas a) e c), do Código Penal, e um crime de subtracção de menor, previsto e punido pelo artigo 249.º, n.º 1, alínea c), do mesmo diploma legal», tal significa que, até trânsito em julgado da decisão final que sobre o recurso do despacho de pronúncia ou sobre o mérito da acusação houver de ser proferida, mantém-se de pé, para efeitos processuais, a força atribuída aos indícios coligidos naquele despacho do juiz de instrução e respectiva qualificação jurídica, para mais não posta em causa naquele recurso, até porque não podia sê-lo.
VI – Não é necessário, para efeito de fundar a prisão preventiva, que haja a certeza de o arguido haver cometido um crime a que corresponda prisão preventiva. Basta, segundo o disposto no artigo 202.º, n.º 1, a), do Código de Processo Penal, (e descurando agora os demais pressupostos da prisão preventiva que não vêm ao caso), a existência de «fortes indícios» da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos».
VII – A este pressuposto dá corpo o despacho judicial de pronúncia, até que a decisão do recurso ordinário pendente sobre a legalidade da prisão preventiva ou o futuro trânsito em julgado da decisão do recurso intercalar da pronúncia ou o da decisão final sobre a verificação ou não, do crime, por ora ainda inexistentes, processualmente se lhe sobreponham, conforme o caso.
AcSTJ de 1.2.2007, proc. n.º 353/07-5, Relator: Cons. Pareira Madeira
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Habeas Corpus - Providência excepcional - Recurso ordinário - Aplicação da lei no tempo - Tráfico de estupefacientes - Especial complexidade do processo - Declaração judicial
1 – Tem entendido o STJ que o habeas corpus, tal como o configura o CPP, é uma providência extraordinária e expedita destinada a assegurar de forma especial o direito à liberdade constitucionalmente garantido, que não um recurso; um remédio excepcional, a ser utilizado quando falham as demais garantias defensivas do direito de liberdade, para estancar casos de detenção ou de prisão ilegais.
2 – Por isso que a medida não pode ser utilizada para impugnar outras irregularidades ou para conhecer da bondade de decisões judiciais, que têm o recurso como sede própria para a sua reapreciação, tendo como fundamentos, que se reconduzem todos à ilegalidade da prisão, actual à data da apreciação do respectivo pedido: incompetência da entidade donde partiu a prisão [art. 222.º, al. a)], motivação imprópria [al. b)] e excesso de prazos [al. c)].
Mas a entender-se que não obsta à apreciação do pedido de habeas corpus a circunstância de poder ser, ou mesmo ter sido, interposto recurso da decisão que aplicou a medida de prisão preventiva, deve ser-se especialmente exigente na análise do pedido de habeas corpus.
3 – Assim não pode fundar o pedido de habeas corpus a invocação de uma questão de aplicação da lei no tempo: aplicação ou não ao caso sujeito do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 2/04, que afirma a desnecessidade de verificação e declaração judicial da excepcional complexidade do procedimento que se reporta a um dos crimes referidos no n.º 1 do art. 54.º do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, proferido e publicado depois de decretada a prisão preventiva, mas muito antes de ser chegado o momento de tal exame e declaração.
AcSTJ de 01.02.2007. Proc. n.º 350/07-5, Relator: Cons. Simas Santos

HABEAS CORPUS INDEFERIDO

O Supremo Tribunal de Justiça apreciou hoje o pedido de habeas corpus de Luís Manuel Matos Gomes.
Indeferiu-o, por maioria, por entender que não se constata o fundamento invocado: Erro grosseiro de qualificação jurídica do tipo de crime imputado - sequestro, por forma a poder afirmar inequivocamente a ilegalidade da prisão.

Texto integral aqui.

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Lá como cá


Vinheta do El País de hoje

Global Corruption Report 2006


Abertura do Ano Judicial 2007 - Impressões

A cerimónia solene de abertura do ano judicial usava ser um momento de reflexão e de balanço, o momento escolhido para perspectivar soluções e corrigir rumos, oportunidade para dirigir mensagens mais ou menos claras para dentro e para fora do sistema de administração da justiça.
Quem não se lembra de alguns discursos, lúcidos e empenhados, do então Presidente Jorge Sampaio com contributos importantes para abrir alguns caminhos no sentido das alterações legislativas que se seguiram?
O que fica da cerimónia de abertura do presente ano judicial é diferente: é a afirmação, a uma voz, de uma visão unânime de optimismo incontido no funcionamento das instituições, de confiança na justiça, com atribuição a outros de culpas que, por vezes, também são próprias na criação da imagem de uma Justiça em crise.
Mesmo quem seja adepto de consensos para resolver alguns problemas mais difíceis não pode deixar de reconhecer que as expectativas em torno das soluções que resultem da concordância dos dois maiores partidos no âmbito do acordo por eles celebrado para a área da Justiça e, aparentemente, sem a contribuição activa das várias classes profissionais, marcaram, condicionando-os, os discursos cautelosos e descomprometidos.

Suponho que estas mensagens para o exterior do sistema de administração da justiça tenham a sua utilidade.
Suponho que o conjunto dos cidadãos portugueses ficará mais confiante na Justiça que é administrada em seu nome quando o Sr. Procurador da República nos diz que os serviços do Ministério Público estão a cumprir com eficiência a sua missão e quando o Sr. Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal da Justiça nos reafirma que em termos de celeridade somos muito melhores do que os Tribunais de muitos países europeus mais desenvolvidos.
Quero crer que nada disto significa que não existe vontade de aperfeiçoar a administração da justiça.
Quero crer que magistrados, advogados e funcionários judiciais não se sentarão à espera do que o “Pacto da Justiça” lhes traga todas as soluções (e sempre as melhores soluções…) e que continuarão a defender e a procurar melhorar os parâmetros de qualidade do exercício da sua profissão.
Foi esse apelo ao investimento na qualidade, desde a formação de magistrados, advogados a funcionários judiciais à necessária reorganização judiciária e vigilância sobre a globalidade do sistema, o que extraí de útil no discurso do Sr. Presidente da República.
Preocupante, porém, ainda que não inteiramente surpreendente, é o voto de apoio incondicional a soluções que não são conhecidas.
Porque o “Pacto da Justiça” é só um princípio cujo desenvolvimento, nas suas várias vertentes, permanece uma incógnita…