25/01/2013 - 00:00
Juízes dizem que os contratos deviam ter sido submetidos à
fiscalização prévia do Tribunal de Contas e que o Comando da Logística não
poderia ter contratado directamente o fornecimento de combustível
O Exército assinou, em 2010
e 2011, quase um milhão de euros em contratos ilegais de fornecimento de
combustível rodoviário. A denúncia é do Tribunal de Contas (TC), que num
relatório recente ao qual o PÚBLICO teve acesso aponta ilegalidades cometidas
pelo Exército através do Comando de Logística. O TC decidiu remeter o processo
para o Ministério Público com a identificação de dois responsáveis militares. Entre
eles, o quartel-mestre-general, tenente-general Joaquim Formeiro Monteiro, à
data comandante da Logística do Exército e o coronel tirocinado João Manuel
Lopes Nunes dos Reis, que chefiava a Direcção de Aquisições.
O valor de quase um milhão
de euros, referente ao montante global contratual, não representou despesa para
o Estado - constitui o valor contratual global, incluindo a prorrogação dos
contratos -, mas o TC sublinha as ilegalidades. Segundo o relatório, o valor
efectivamente facturado no âmbito dos dois contratos foi de 182 mil euros. Em
causa, estão dois contratos estabelecidos com a BP Portugal. O primeiro, em 17
de Dezembro de 2010, que previa a emissão de 754 cartões de abastecimento de
gasolina e gasóleo à frota militar e que tinha um valor atribuído pelo Exército
de 28 mil euros, vigorando até ao final de Dezembro de 2010. Uma vez que o
valor não ultrapassava os 350 mil euros - limite imposto por lei -, o contrato
não necessitou de ser submetido à fiscalização prévia do TC. Contudo, o tribunal
considera que a "entidade adjudicante não calculou o preço contratual com
a possível prorrogação do contrato". Dessa forma, o contrato ascenderia a
mais de 517 mil euros, o que obrigaria a um visto prévio do TC. "A
execução de contratos que não tenham sido submetidos à fiscalização prévia do
TC, quando a isso estavam obrigados, constitui infracção financeira",
dizem os magistrados.
Segundo o TC, a contratação
surgiu na sequência de um procedimento levado a cabo pela Unidade Ministerial
de Compras do Ministério da Defesa Nacional (UMC-MDN) "mediante despacho
de Agosto de 2010, do então secretário de Estado da Defesa Nacional e dos
Assuntos do Mar em substituição do ministro Santos Silva.
O contrato foi ainda
renovado em Junho de 2011, irregularmente, pelo Governo quando já se encontrava
caducado. "Não é possível conferir eficácia retroactiva a um contrato que
já tinha caducado. Em consequência, a aquisição de combustíveis rodoviários e
respectiva despesa efectuada no período decorrido entre Janeiro e Março de 2011
careceu de suporte legal", diz o TC, apontando para uma "infracção
financeira" e uma "violação das normas da assunção, autorização ou
pagamento de despesas públicas ou compromissos" prevista na Lei de
Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC).
Num segundo contrato, de
Março de 2011, as ilegalidades voltaram a verificar-se. De acordo com o TC, o
valor contratual - mais de 158 mil euros - foi mal calculado. Os juízes
conselheiros consideram que, também neste caso, o valor contratual deveria ter
sido calculado incluindo a possível prorrogação do contrato, o que faria
ascender o preço global para quase 475 mil euros. O TC considerou ainda que
"não era possível ao Comando da Logística do Exército contratar
directamente com a BP o fornecimento dos bens em apreço (...) uma vez que é uma
entidade compradora vinculada e a aquisição de combustíveis rodoviários foi
objecto de um acordo quadro celebrado pela Agência Nacional de Compras
Públicas". Os magistrados não têm dúvidas que existiu "violação das
normas de contratação pública e das normas reguladoras da execução orçamental e
da administração financeira do Estado".
Em sua defesa, os
responsáveis militares apontados pelo TC responderam aos juízes que "nunca
foi intenção do Exército prorrogar o contrato outorgado em Dezembro de 2010,
tanto mais que nessa data ainda não era possível saber se haveria cobertura
orçamental para a respectiva despesa em 2011 e que a inclusão da cláusula
relativa à prorrogação contratual é da exclusiva responsabilidade da UMC-MDN
que redigiu a minuta e a impôs ao Exército". E sobre a despesa efectuada
quando o contrato já tinha caducado, os oficiais dizem que a prorrogação se
efectuou "aquando da primeira aquisição de combustível realizada em 2011
pelo Exército" de forma "descentralizada pelas várias unidades",
sem que o "director de aquisições tenha dado qualquer ordem". Para
além disso, os militares afirmaram que agiram de "boa-fé" e que se
encontravam perante uma necessidade premente de manter abastecidas as
viaturas". O MDN não respondeu às questões do PÚBLICO até ao final desta
edição.
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