Há em Portugal uma base de dados para reunir perfis de ADN recolhidos em
locais de crime ou em criminosos. Não há nas suas entranhas de silicone
praticamente nenhumas amostras de ADN. Mas há a base de dados. E enquanto ela
não cumpre o fim a que se destina, todo aquele aparato vai servindo para
revelar o perfil de um outro ADN, o de Portugal, país procrastinador, onde se
fazem investimentos que, mal vêm ao mundo, são abandonados à sua sorte.
Esta base de dados de ADN - é sobre ela que escrevemos agora - nasceu no
papel há meia dezena de anos (a 12 de fevereiro de 2008) e foi formalmente
inaugurada há três (a 12 de fevereiro de 2010). E, desde aí... nada.
A falta de uma lei orgânica e de vontade tem deixado este sistema no mesmo
limbo onde vegetam outros investimentos, também eles anunciados a seu tempo com
orgulho, como o banco público de células estaminais ou a futurista rede de
carregamento de carros elétricos. Ambos anunciados, criados e abandonados tão
depressa que nem tivemos tempo para nos apercebermos de que tinham vindo ao
mundo. Hoje, sumidos, é como se não tivessem vindo.
O que está a emperrar a base de dados é a falta de estratégia e de
capacidade de concretização. Há cinco anos nasceu o projeto, há três ele abriu
as portas e, desde então, não se conseguiu produzir uma lei nem criar o hábito
de encaminhar para lá as amostras que era suposto lá estarem. Por isso, não
funciona.
Assim, mais uma vez, o que aqueles maquinismos revelam é a dupla hélice da
portugalidade. Como diz o verso redigido por um conhecido cantor: "Lembra
um sonho lindo, quase acabado."
Nós e a 'troika'
António José Seguro disse-o sempre: Portugal precisa de mais tempo para ser
bem sucedido no seu programa de ajustamento. O líder socialista só nunca se
tinha comprometido politicamente com a ideia de revisão/renegociação do
memorando assinado com a troika.
Agora, estando Seguro a meio de um processo eleitoral interno que há de,
tudo o indica, legitimá-lo como candidato do PS a primeiro-ministro, começa a
falar mais grosso aos credores. Nas cartas que enviou aos responsáveis
políticos máximos do FMI, BCE e CE, o líder do PS exige que os técnicos da
troika sejam substituídos por gente com mandato político para tomar decisões.
Tem razão Seguro quando diz que o que está em causa na sexta avaliação com o
corte de 4 mil milhões é política e não tecnocracia. Do que se trata é de saber
se o ajustamento se faz mais depressa, isto é, com mais dor ou mais devagar,
isto é, com menos violência para os cidadãos. E esta decisão é, obviamente,
política.
Passos Coelho já disse que o Governo não vai partir a corda que está
esticada. Mas o que a troika tem de perceber é que esta já se partiu para
muitas famílias e para o gigantesco exército de desempregados que a receita de
austeridade já fez pelo caminho. E por isso é que, em nome do interesse
nacional, Lagarde, Draghi e Barroso têm de ser "obrigados" a vir a
jogo.
Diário de Norícias, 18-02-2013
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