domingo, 20 de janeiro de 2013

Muito barulho mas pouco efeito


Qualquer pessoa pode criar uma petição online e é quase impossível verificar a veracidade das assinaturas. Em Portugal ainda são encaradas com desconfiança, mas plataformas como a Avaaz começam a ter muita força no mundo anglo-saxónico - e a dar resultados
Quando o abate do cão Zico foi suspenso, muitas pessoas pensaram que a petição online a favor do animal tinha resultado. Mas não é bem assim. O animal envolvido na morte de uma criança de 18 meses não foi abatido porque a Associação Animal - uma das promotoras da petição - interpôs uma providência cautelar no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja.
A petição apenas recebeu mais atenção mediática do que muitas outras porque, em Portugal, estas ferramentas não têm tanta influência como noutros países. "É uma forma de pressão e como tal funciona, impõe uma agenda", diz Rodrigo Moita de Deus, diretor-geral da agência de comunicação Next
power e um dos autores do blog 31 da Armada. "Mas os anglo-saxónicos usam mais essas ferramentas do que os latinos, devido às próprias características dos povos." Moita de Deus reconhece que os resultados podem ser falsificados, mas conclui que "é o pior mecanismo... à exceção de todos os outros". Mas para o diretor da Nextpower é diferente falar de um "acordar da sociedade civil" e de "protestos" da mesma.
"A sociedade civil não acordou, protesta. As pessoas não querem participar na solução, querem que o problema seja resolvido."
O surto de petições online e no Facebook deve-se a esta conjunção: uma vontade de protestar com a facilidade de o fazer. Não necessariamente com resultados. "O problema é que muitas vezes a petição online não tem credibilidade suficiente para ser consequente", alerta Alexandre Guerra, especialista em relações-públicas. "O que não significa que as entidades visadas nessa petição não devam estar atentas ao que está a acontecer online, seja ao nível de uma petição, do Facebook ou de outra plataforma", considera.
Mas há uma distinção importante entre as petições online e as clássicas, em especial as recolhidas em papel. "A petição clássica implica uma vontade e um trabalho que ao nível das plataformas online não existe", sublinha Alexandre Guerra.
"Uma coisa é fazer 'gosto' no Facebook, outra é levantar o rabo do sofá e ir à manifestação. A petição clássica tem um lado cívico e pessoal que implica compromisso."
Tem também a consagração legal na Constituição, visto que a partir de mil signatários, com assinaturas verificadas, a audição está garantida.
"Quando se faz uma petição clássica há um objetivo concreto, para resultar numa medida ou alteração de lei. No caso das petições online a ideia é diferente: é criar buzz, uma corrente mediática que depois se transforme numa forma de influência e pressão sobre uma entidade", conclui o especialista em relações-públicas.
Anthony Zacharzewski, presidente da organização não partidária Demsoc, arrasa as petições online.
"São a comida de plástico da democracia", diz, citado pelo Guardian. No entanto, plataformas internacionais como a Change.org, com 2? milhões d€ utilizadores, ou a Avaaz.com, com 17 milhões, estão a ganhar uma força sem precedentes e a provocar o debate: serão as campanhas e petições online capazes de reinventar a política e o equilíbrio de forças na sociedade? A Change.org, por exemplo, conseguiu forçar o Parlamento da África do Sul a tomar medidas contra a violação "corretiva" de lésbicas no país. Na Avaaz, uma petição com quase 400 mil assinaturas pediu que o milionário Rupert Murdoch fosse impedido de comprar a BSkyB, depois do escândalo de escutas do News of the World. Pressionado, Murdoch retirou a proposta no último momento.
Ana Rita Guerra
Diário Notícias /Dinheiro Vivo, 19-01-2013

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