Cortes na despesa do Estado
As mexidas nas pensões
desenhadas pelo Governo vão tirar 1,44 mil milhões de euros aos pensionistas só
em 2014, mais do triplo da austeridade que estão a suportar este ano
ELISABETE MIRANDA
elisabetemiranda@negocios.pt
Para quem já está reformado,
uma nova taxa. Para quem se venha a reformar, uma maior penalização por viver
mais tempo. Para os futuros reformados do Estado, novas regras de cálculo que
trazem menos dinheiro. Estas são as três principais vias pelas quais o Governo
pretende cortar nas despesas com pensões. Ao todo, é tirado ao bolso dos
pensionistas l,44mil milhões de euros em 2014, um valor que representa mais do
triplo da austeridade que estão a suportar este ano.
Nova taxa substitui CES, mas
fundos privados escapam
Quem já está reformado enfrenta
uma nova taxa a partir de Janeiro. Passos Coelho confirmou que o Governo está a
estudar esta solução de modo a pôr os pensionistas a darem uma contribuição
para a sustentabilidade dos sistemas de pensões. Trata-se, como o Negócios já
tinha avançado, de uma espécie de “taxa social única” a incidir agora sobre um
terceiro grupo. Por afectar as pensões em pagamento esta é uma medida
melindrosa do ponto de vista constitucional, mas interpretações mais optimistas
do Acórdão apontam no sentido que, ao viabilizar a CES, os juizes aceitaram que
o sistema previdencial possa recorrer a outras fontes de financiamento além das
empresas e trabalhadores. Passos Coelho anunciou que os cortes seriam indexados
ao andamento da economia, o que poderá também ajudar a convencer os juizes.
Apesar de pretender substituir a CES (em termos orçamentais elas valem
sensivelmente o mesmo, 430 milhões de euros), há contudo diferenças. Desde
logo, a taxa só abrangerá os reformados da Segurança Social e da Caixa Geral de
Aposentações, o que deixará de fora quem recebe pensões através de fundos de
pensões privados, onde estão algumas das pensões mais altas do País.
A taxa e o limiar mínimo das
pensões que ficarão excluídas dos cortes não foram divulgados. Viver mais tempo
custará mais caro aos futuros reformados Aos futuros reformados espera-os um
encarecimento do preço por viverem mais tempo. Este “preço” é expresso através
do chamado “factor de sustentabilidade”, que desde 2007é calculado a partir da
divisão entre a esperança de vida aos 65 anos registada em 2006 (de 17,94 anos)
e a esperança de vida no ano anterior ao da reforma. Segundo informações
apuradas pelo Negócios, o plano do Governo é abandonar o ano de 2006 como
indexante base e usar um ano mais recuado, o que dará cortes mais expressivos.
Adicionalmente, o Governo pretende também fazer as pensões dependerem da massa
salarial, o que significa que em anos em que os descontos dos trabalhadores
para a Segurança Social caiam, como em tempos de crise, as pensões levam cortes
maiores.
Para escapar a estes cortes há
a alternativa (pelo menos teórica) de trabalhar mais tempo, para lá dos 65 anos
de idade legal. Este ano, a idade de acesso à pensão sem qualquer penalização é
de 65,5 anos, sendo o objectivo do Governo que ela passe para os 66 anos com a
revisão da fórmula de cálculo. Segundo as contas do Negócios, tal poderá
implicar cortes nas pensões em tomo dos 10% em 2014 (contra 4,78% este ano).
Futuras pensões do Estado
emagrecem
Para os futuros pensionistas do
Estado, a medida mais esperada vai concretizar-se: o ritmo de convergência da
fórmula de cálculo das pensões será acelerado. Passos Coelho não disse qual a
velocidade dessa convergência, nem a forma como será feita, mas a magnitude da
poupança aponta para um processo de grande alcance: serão poupados 740 milhões
de euros só em 2014, o que sugere uma harmonização imediata de regras. Todas
estas intenções estão sujeitas a negociação, diz o Governo.
IDEIAS-CHAVE
PENSÕES SOFREM POR DIVERSAS
VIAS
1 TAXA PROPORCIONAL SOBRE AS
PENSÕES EM PAGAMENTO
Uma taxa universal e única a
incidir sobre as pensões pagas pela Caixa Geral de Aposentações e Segurança
Social: esta é a solução para substituir a CES de Janeiro de 2014 em diante.
Passos Coelho diz, contudo, que quer usar esta medida com a maior parcimónia
possível. Ela será indexada ao PIB, pelo que será pró-ciclica: mais
penalizadora em tempos de recessão e mais ligeira quando a economia cresce.
2 FACTOR DE SUSTENTABILIDADE
ROUBA NO VALOR DA PENSÃO
O factor de sustentabilidade
continuará a roubar no valor da pensão da reforma, só que mais do que estava
previsto. Esperava-se que quem se reformasse em 2014 sofresse um corte de 5%,
aproximadamente, mas o Governo quer alterar a fórmula de cálculo e, com isso,
agravar esta taxa. O agravamento surge por duas vias: a alteração do ano de
2006 como âncora em relação ao qual se mede a evolução da esperança de vida e a
incorporação da massa salarial na fórmula, o que significa que em anos de
grande desemprego, a penalização é maior. A alternativa é trabalhar mais tempo
para compensar os cortes, sendo que o Governo quer que este “mais tempo” seja
até aos 66 anos (agora está nos 65 anos e cinco meses). Esta penalização
acumula com a anterior.
3 FUTUROS REFORMADOS DO ESTADO
PERDEM A TRIPLICAR
Quem entrou no Estado antes de
1993 e se reforme agora tem a pensão calculada com base em duas regras. Pelo
tempo de trabalho até fim de 2005, contará o salário de 2005. A segunda parte
da pensão é calculada com base na média dos salários entre Janeiro de 2006 e a
data da aposentação. Estas regras são mais favoráveis do que no regime geral de
Segurança Social. Aqui, quem se reforme agora tem a pensão calculada com base
em duas parcelas: os melhores dez dos últimos 15 anos terminados em 2007 e uma
segunda parcela com a média de todos anos para o resto do tempo. A ideia é
aproximar a Função Pública desta última, embora uma harmonização total seja
difícil pelo facto de o Estado não ter registos de descontos anteriores a 1993.
Quem se reformar do Estado em
2014 sofre este efeito, mais o dos pontos anteriores.
Jornal Negócios, 6-5-2013
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