terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

PGR culpa juízes de insucesso no combate ao crime económico


Acusação. Procurador-geral da República e procuradora-geral de Lisboa entendem que só não há mais condenações porque os magistrados judiciais exigem provas em julgamento para além do razoável devido à falta de formação
O procurador-geral da República (PGR) responsabiliza os juizes pelas poucas condenações nos processos de corrupção e de crime económico-financeiro.
Em relatório apresentado ao Parlamento sobre a execução da política criminal para 2009-2011, a que o DN teve acesso, Fernando Pinto Monteiro defendeu que na fase de julgamento é dado “relevo a dúvidas muito para além do razoável”. Opinião partilhada pela procuradora-geral distrital de Lisboa (PGDL), Francisca Van Dunem, para quem a falta de formação dos magistrados judiciais neste tipo de crimes os leva a “retrair-se na apreciação das provas”. Os juizes ouvidos pelo DN dizem que apenas aplicam a lei de acordo com as regras processuais. A “guerra” entre as magistraturas foi aberta por Pinto Monteiro no relatório enviado ao Parlamento na passada quarta-feira, em que avalia a execução das prioridades da investigação criminal. O PGR considera que as absolvições, no âmbito do crime económico e da corrupção, “além de resultarem da dinâmica do próprio sistema processual (por exemplo, as declarações dos autos não podem, em regra, ser utilizadas no julgamento), fundam-se igualmente numa valoração da prova que, salvo melhor opinião, é permissiva, dando relevo a dúvidas muito para além do razoável”. O magistrado defende também que os juizes “não aplicam adequadamente os critérios de prova indireta, indiciaria ou por presunção”, sendo esta uma das causas do insucesso do combate ao crime económico.
Mas também Francisca Van Dunem, responsável pela PGDL, por onde passa mais de um terço da criminalidade em Portugal, aponta o dedo aos magistrados judiciais. Em relatório sobre a atividade da PGDL em 2011, a magistrada indica pelo menos nove processos de crime económico que o Ministério Público investigou e acusou, mas que se encontram parados nos tribunais à espera de julgamento.
Em declarações ao DN, a magistrada, na linha do PGR, aponta a falta de formação dos juizes como a principal causa para o insucesso no combate ao crime económico-financeiro. “Há uma retração na avaliação da prova que deriva dessa falta de formação”, disse. “Os juizes têm também de fazer a indagação dos factos para chegarem à descoberta da verdade, têm de fazer a análise da prova, mas quando se deparam com dificuldades não usam o que é comum usar-se noutros processos, que é o recurso à prova indireta, indiciaria, por presunção. Como não se sentem à vontade para julgar, há uma retração”, acrescentou.
Contactado pelo DN, o presidente da Associação Sindical do luízes Portugueses, António Martins, diz não entender as queixas do PGR. “Os juizes julgam esses processos como julgam os outros, com as regras que existem, com o código que temos e com as regras de valoração da prova que temos.” Também o antigo responsável pelo combate ao crime económico da Polícia Judiciária, o juiz Mouraz Lopes, admite que possa fazer falta formação aos magistrados, mas defendeu “ser preciso demonstrar que há uma relação causa-efeito entre a absolvição dos arguidos e a falta de formação”, disse ao DN.
Licínio Lima
Diário de Noticias de 28-02-2012

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