quarta-feira, 29 de maio de 2013

A propósito da criação de um Ministério Público Europeu, 

quando dele se (re)começou a falar no Dia Europeu da Justiça


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JL Lopes da Mota






Tem mais de 20 anos o debate sobre a criação de um Procurador Europeu (Procuradoria  Europeia ou MP Europeu).

Nos anos 90 foi feito o primeiro estudo sobre a viabilidade de criação de um tal órgão, com competência para investigar e levar a julgamento os autores de crimes afectando os denominados "interesses financeiros da Comunidade". 

Projecto de grande envergadura, patrocinado pela Comissão (OLAF) e dirigido por Mireille Delmas-Marty e John Vervaele, ficou conhecido por Corpus Juris (está publicado, em 4 volumes, pela Editora Intersentia - http://www.intersentia.com/searchDetail.aspx?bookid=4464).

Reuniu um grupo de académicos de renome, as opiniões dividiram-se, e um inquérito foi feito nos Estados-Membros da UE.

A conclusão foi que não havia base jurídica no Tratado das Comunidades Europeias (TCE), pelo que, no Conselho Europeu de Nice, na sequência de um novo estudo dirigido pela Comissão (OLAF) - o Livro Verde sobre o Procurador Europeu (http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/en/com/2001/com2001_0715en01.pdf) - foi, por esta, apresentada uma proposta de introdução de um novo artigo no TCE que pudesse constituir a base jurídica em falta.

O resultado é conhecido: a proposta foi recusada pelos Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros (Conselho Europeu) e, em vez disso, o Conselho Europeu decidiu introduzir uma disposição no Tratado da União, pelo Tratado de Nice - Jornal Oficial C-80, de 10.3.2001, p. 10 (http://www.ecb.int/ecb/legal/pdf/pt_nice.pdf) - que, alterando o artigo 31.º do Tratado da União Europeia, incluiu a Eurojust (cuja criação tinha sido decidida no Conselho Europeu de Tampere, em Outubro de 1999) no Tratado.

O assunto foi objecto de intensa discussão durante os trabalhos preparatórios da Constituição para a Europa e uma solução de compromisso foi encontrada: a haver uma Procuradoria Europeia, ela seria criada a partir da Eurojust.

Finalmente, o Tratado de Lisboa (2007) veio estabelecer a base jurídica que permitirá criar a Procuradoria Europeia: o artigo 86.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (Jornal Oficial C-83, de 30.3.2010) que dispõe:


"Artigo 86.o
1. A fim de combater as infracções lesivas dos interesses financeiros da União, o Conselho, por meio de regulamentos adoptados de acordo com um processo legislativo especial, pode instituir uma Procuradoria Europeia a partir da Eurojust. O Conselho delibera por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu.
Caso não haja unanimidade, um grupo de pelo menos nove Estados-Membros pode solicitar que o projecto de regulamento seja submetido ao Conselho Europeu. Nesse caso, fica suspenso o processo no Conselho. Após debate, e havendo consenso, o Conselho Europeu, no prazo de quatro meses a contar da data da suspensão, remete o projecto ao Conselho, para adopção.
No mesmo prazo, em caso de desacordo, e se pelo menos nove Estados-Membros pretenderem instituir uma cooperação reforçada com base no projecto de regulamento em questão, esses Estados-Membros notificam o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão em conformidade. Nesse caso, considera-se que foi concedida a autorização para proceder à cooperação reforçada referida no n.o 2 do artigo 20.o do Tratado da União Europeia e no n.o 1 do artigo 329.o do presente Tratado, e aplicam-se as disposições relativas à cooperação reforçada.
2. A Procuradoria Europeia é competente para investigar, processar judicialmente e levar a julgamento, eventualmente em articulação com a Europol, os autores e cúmplices das infracções lesivas dos interesses financeiros da União determinadas no regulamento a que se refere o n.o 1. A Procuradoria Europeia exerce, perante os órgãos jurisdicionais competentes dos Estados-Membros, a acção pública relativa a tais infracções.
3. Os regulamentos a que se refere o n.o 1 definem o estatuto da Procuradoria Europeia, as condições em que esta exerce as suas funções, as regras processuais aplicáveis às suas actividades e as que regem a admissibilidade dos meios de prova, bem como as regras aplicáveis à fiscalização jurisdicional dos actos processuais que a Procuradoria Europeia realizar no exercício das suas funções.
4. O Conselho Europeu pode, em simultâneo ou posteriormente, adoptar uma decisão que altere o n.o 1, de modo a tornar as atribuições da Procuradoria Europeia extensivas ao combate à criminalidade grave com dimensão transfronteiriça, e que altere em conformidade o n.o 2 no que diz respeito aos autores e cúmplices de crimes graves que afectem vários Estados-Membros. O Conselho Europeu delibera por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu e após consulta à Comissão."

A discussão está em aberto e reeditam-se posições anteriores, mostrando-se difícil o consenso.

Seria bom que Portugal, que contributos decisivos tem dado, nos últimos 15 anos, para progressos significativos na área da Justiça europeia (Convenção de Maio de 2000,  Rede Judiciária Europeia, Atlas Judiciário e Eurojust, para citar os mais importantes), pudesse dar, também neste assunto, um contributo importante.

As questões em aberto são múltiplas e muito complexas.

E sobre elas já foi expresso algum pensamento.

Convido os interessados a visitar este site.

E também a consultar:

A Constituição Europeia e a questão do Procurador Europeu: a Eurojust, embrião de um futuro procurador europeu

Revista do Ministério Público, 98, 2004

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