08/04/2013 - 00:00 [Público]
Acórdão do Tribunal Constitucional
deixa claro que só caso a caso é possível aferir se a contribuição
extraordinária de solidariedade configura uma situação de confisco
Foi uma
das medidas mais contestadas na praça pública, mas o Tribunal Constitucional
(TC) viabilizou a contribuição extraordinária de solidariedade (CES) aplicada
às pensões acima de 1350 euros. Porém nada impede que, no futuro, os
pensionistas impugnem os cortes nas pensões, obrigando o TC a voltar ao tema e
a analisar casos concretos.
Em 2013,
o Governo decidiu que as pensões acima de 1350 euros ficariam sujeitas a uma
contribuição entre 3,5% e 10%. O montante das pensões entre 5030 e 7545 euros
leva um corte adicional de 15%. Acima deste valor, a CES chega aos 40%.
A CES,
somada ao agravamento de impostos, leva a que em alguns casos as pensões sofram
reduções superiores a 50%, podendo configurar confisco. A questão foi colocada
pelo Presidente da República, Cavaco Silva, no pedido de fiscalização sucessiva
que endereçou ao TC. Mas também o antigo ministro das Finanças, Bagão Félix,
vários constitucionalistas ou Filipe Pinhal, ex-presidente executivo do BCP e o
rosto de uma associação de reformados recentemente constituída, alertam para
uma situação de confisco.
No
acórdão divulgado na sexta-feira, o TC deixa claro que a CES é "uma medida
conjuntural de carácter transitório, justificada por situação de emergência
económica e financeira" e por isso não tem "carácter
confiscatório".
Além
disso destaca que as taxas mais elevadas só se aplicam a partir de rendimentos
"especialmente elevados" e deixam "uma margem considerável de
rendimento disponível". O TC entende que o factor decisivo "não é
aquilo que o imposto retira ao contribuinte, mas o que lhe deixa ficar".
O TC
deixa ainda um sinal para o futuro ao dizer que mais do que analisar se as
taxas são ou não confiscatórias, esses efeitos devem ser aferidos "em
relação a determinado contribuinte em concreto".
"Quando
diz que tudo depende do caso concreto, não é impossível que o TC num caso
concreto venha a adoptar um entendimento diferente do que está acolhido neste
acórdão", realça o constitucionalista e professor da Universidade
Católica, Rui Medeiros. Mas é uma incógnita.
Há
situações em que a CES é claramente desproporcionada, realça, dando como
exemplo pensionistas com reformas pouco acima dos 7500 euros. Mas também
considera que face ao acórdão fica claro que o TC não irá preocupar-se com
casos de reformados e aposentados com reformas de 100 mil euros.
Em vez de
tomar uma decisão, lamenta o advogado Garcia Pereira, o TC "deixa a cada
cidadão o ónus de impugnar a liquidação da taxa e perante decisão desfavorável
dos tribunais administrativos e fiscais, recorrer para o TC".
Garcia
Pereira discorda da análise feita pelo TC e considera que "as
consequências da aplicação da CES já são constatáveis à partida",
alertando que o principal problema é saber se o esforço exigido é excessivo
face aos seus efeitos.
Também o
constitucionalista Tiago Duarte alerta que o carácter confiscatório da medida
deve ser analisado tendo em conta o princípio da proporcionalidade. "A
questão é ver até que ponto há um equilíbrio entre o que se retira, neste caso
aos pensionistas, e o benefício que isso tem para o interesse público".
Ora, alerta Rui Medeiros, o efeito orçamental da CES aplicada às pensões acima
de cinco mil euros é reduzido e não afecta muita gente.
A
Constituição não estabelece uma fronteira a partir da qual um imposto possa ser
considerado confisco. É retirar metade do rendimento? É ir além dessa
percentagem?
Durante
muito tempo, o entendimento dominante colocava a fronteira nos 50%. Mas a
questão pode não ser tão linear e subjacente à ideia de confisco estão
situações em que o grosso do rendimento dos particulares fica para o Estado. O
limite é discutível.
Mesmo
dentro do TC a decisão não foi unânime e dos 13 juízes, oito votaram pela não
inconstitucionalidade da CES. Cunha Barbosa e Catarina Sarmento e Costa, assim
como Fernando Vaz Ventura são três dos conselheiros que consideram que a CES
devia ter sido declarada inconstitucional.
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