21/04/2013 - 00:00 [Público]
Detidos dormem com cobertores velhos e rasgados e há falta de
higiene. Quase não existe luz e o calor é "insuportável". As obras
necessárias estão prometidas para este ano
O provedor da Justiça, Alfredo José de Sousa, considera que as
condições de detenção e de higiene a que são sujeitos os detidos nas celas da
PSP do Porto, no Quartel da Bela Vista, não são adequadas. Num relatório
recente de inspecção às instalações, ao qual o PÚBLICO teve acesso, sublinha
que a única roupa de cama, entregue aos detidos, corresponde a "dois ou
três cobertores, em muito mau estado", muito velhos e que "apresentam
diversos buracos e rasgões". O Quartel da Bela Vista, nas Antas - também
sede do Corpo de Intervenção (CI) - é o edifício em que ficam todos os detidos
pela PSP no Porto até à apresentação a um juiz.
O relatório, elaborado
também a propósito da inspecção, em 2012, à esquadra da Corujeira, revela ainda
circunstâncias que terão chocado o magistrado, que decidiu realizar a visita
por iniciativa própria e enquadrado nas suas funções de instituição nacional de
protecção dos direitos humanos. Já em 2010, familiares de 12 detidos havia uma
semana no quartel denunciaram a falta de condições para tomar banho. "O
regime de roupa de cama aplicável consiste numa muda a cada 15 dias. Assim, no
limite, pode acontecer que seja fornecido a um detido roupa de cama já usada
por 15 outras pessoas, sucessivamente, sem qualquer lavagem", critica o
provedor.
Fonte policial explicou ao
PÚBLICO que apenas algumas das 14 celas divididas entre a ala para homens e a
ala para mulheres têm colchões "muito finos". Numa recomendação
oficial à Direcção Nacional (DN) da PSP, Alfredo José de Sousa sublinha a necessidade
de serem "divulgadas normas sobre o regime de roupa de cama que assegurem
que cada detido receba peças de roupa limpas", bem como a tomada de
"medidas no sentido de melhoria das condições de detenção".
Para além de salientar os
níveis de humidade excessivos e a ausência de meios para controlar as
temperaturas "negativas" no Inverno e o calor
"insuportável" no Verão, o provedor critica a quase ausência de
luminosidade nas celas. "A luz natural não é fornecida pelas janelas, uma
vez que estão chapeadas e têm apenas pequenos orifícios que não permitem a
passagem de luz suficiente", refere o magistrado.
O relatório denunciava ainda
que os detidos dormiam em maciços de betão em cima de estrados de madeira, o
que violava o Regulamento das Condições Materiais de Detenção em
Estabelecimentos Policiais. Contudo, o Ministério da Administração Interna
(MAI) garantiu ao PÚBLICO que já foram feitos "alguns melhoramentos",
nomeadamente a "retirada" desses estrados, no seguimento da criação
em Janeiro de um grupo de trabalho para fazer o "levantamento exaustivo
dos quartos de detenção ao nível nacional".
Estudos da PSP apontam a
necessidade de 50 mil euros para efectuar obras que estão dependentes de
"disponibilidade financeira". A Direcção Nacional da PSP e da PSP do
Porto não confirmaram ao PÚBLICO, todavia, o prazo das obras de reabilitação
que a Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) diz estarem previstas
para este ano. Margarida Blasco, inspectora-geral da Administração Interna, que
sublinhou que a IGAI "tem competências específicas" para realizar
inspecções sem aviso prévio, adiantou que as irregularidades já tinham sido
detectadas em 2008 e que já tinha efectuado recomendações à PSP.
O MAI, que também não
avançou prazos para a reabilitação, que será feita por "fases",
assumiu que as obras dependem de uma candidatura da Câmara do Porto "a
fundos comunitários" no contexto de um programa que a PSP tem com vários
municípios. "A questão é prioritária. Estamos atentos", referiu o
subcomissário João Moura, porta-voz da DN da PSP. Já fonte oficial da PSP do
Porto admitiu apenas que é uma "prioridade resolver ou menorizar" os
problemas.
Restrições para telefonar
O provedor de Justiça exige
igualmente a cessação das restrições irregulares que detectou nos contactos
telefónicos, com os familiares e advogados, a que os detidos têm direito. Se os
detidos não fizerem o telefonema na esquadra do agente responsável pela
detenção, já não o poderão fazer na Bela Vista. A IGAI adiantou que, neste
caso, "o normal é que o detido use o telefone na esquadra originária da
detenção".
Alfredo José de Sousa alerta
ainda para as más condições físicas de trabalho na Corujeira e na Bela Vista.
"O edifício da esquadra não oferece boas condições físicas para trabalhar
ou para assegurar o atendimento ao público e também a área de detenção da Bela
Vista tem instalações e equipamentos degradados e muito pouco funcionais",
diz o provedor.
A "situação não é
nova" para o presidente da Associação Sindical dos Profissionais da
Polícia (ASPP), Paulo Rodrigues, que culpa os sucessivos governos pelo
"desinvestimento" que coloca agora em causa "até a saúde dos
agentes". A ASPP alerta que "existem várias instalações da PSP nas
mesmas ou até em piores condições" e que na Bela Vista "as condições
entre detidos e agentes [que dormem nas camaratas] são idênticas"..
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