Relação considerou legítimas
críticas do investidor à espécie de bullying bancário com que terá sido assediado
Um
pequeno accionista do BCP que foi para a porta das instalações do banco
protestar com cartazes exibindo frases do tipo "Enganaram o povo com as
suas acções p"ra levar no bolso mais uns milhões" acaba de ser
absolvido do crime de ofensa a pessoa colectiva pelo Tribunal da Relação do
Porto e não vai ter de pagar a indemnização que a instituição bancária
reclamava.
Os bancos
devem considerar "atípicas as manifestações públicas de cidadãos que, no
exercício do seu direito de liberdade de expressão, divulgam situações que
podem ser enquadradas num comportamento de bullying
banks", justificam os juízes desembargadores.
O pequeno
investidor de Fafe já tinha sido absolvido em primeira instância, mas os
responsáveis do BCP decidiram recorrer. Manuel Nogueira ficou conhecido como
"Senhor dos Passos", por se postar à porta de vários edifícios do BCP
vestido de Cristo, carregando uma cruz. O objectivo era vingar-se do banco por
lhe ter transformado a vida num "calvário".
Para os
desembargadores da Relação, é legítima a "atitude crítica do cidadão
comum" na denúncia daquilo que "vulgarmente se apelida debullying
banks". Podem então os bancos praticar bullying? Tudo indica que sim.
Fazem-no quando, através dos seus colaboradores, realizam "actos,
intencionais e repetidos, com o objectivo de vender os seus produtos e
serviços, colocando o consumidor numa atitude de acentuada vulnerabilidade
decisória, designadamente por omitir a necessária informação para que seja
tomada uma opção consciente", especifica o acórdão da Relação.
Terá sido
isso o que aconteceu com Manuel Nogueira, cliente antigo do BCP que em 2000
decidiu gastar mais de 500 mil euros na compra de acções do banco, em seu nome
e no de mais 27 familiares e amigos. Alegadamente aconselhado por funcionários,
que lhe terão garantido a valorização das acções, pediu um empréstimo e
arriscou. Ao preço de mais de cinco euros cada, as acções acabariam por cair a
pique, deixando-o numa situação aflitiva.
O pequeno
investidor foi um entre os muitos clientes do BCP que adquiriram acções nos
aumentos de capital do banco, de 2000 a 2001, e não foi o único a reclamar.
Vários outros encenaram ruidosos protestos, interpuseram processos em tribunal
e apresentaram queixas à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM),
acusando o banco de os ter levado a comprar os títulos. Mas Manuel foi
seguramente o cliente que deu mais nas vistas. Em 2009, surgiu na entrada do
edifício da Alfândega do Porto, onde se realizava uma assembleia de
accionistas, de roupas roxas, carregando uma imponente cruz. No ano seguinte,
voltou. Ameaçava então: "Não tenho medo. Daqui a 20 anos, estarei cá com a
mesma vitalidade."
Em
Novembro desse ano cumpriu a promessa e voltou, desta vez para a porta das
instalações do banco, no Porto, onde ficou posicionado horas a fio, durante
dois dias, munido de um banco, de uma cruz de madeira e vários cartazes.
"Fui enganado! Não posso ficar calado!", proclamava. Apesar de
considerarem que a linguagem usada é "dura e abstractamente
insultuosa", os desembargadores da Relação defendem que não ficou provado
serem falsos os factos e as afirmações contidas nos cartazes. Quando as acções
do BCP começaram a subir, Manuel Nogueira ainda tentou vendê-las, "no que
foi impedido pelos funcionários que lhe garantiram que iam subir", lembram,
notando que a "agressividade da campanha" levou este e outros
clientes a sentirem-se enganados.
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