quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Tribunal absolve pequeno accionista que acusou BCP de ter "enganado o povo"

 


Relação considerou legítimas críticas do investidor à espécie de bullying bancário com que terá sido assediado
Um pequeno accionista do BCP que foi para a porta das instalações do banco protestar com cartazes exibindo frases do tipo "Enganaram o povo com as suas acções p"ra levar no bolso mais uns milhões" acaba de ser absolvido do crime de ofensa a pessoa colectiva pelo Tribunal da Relação do Porto e não vai ter de pagar a indemnização que a instituição bancária reclamava.
Os bancos devem considerar "atípicas as manifestações públicas de cidadãos que, no exercício do seu direito de liberdade de expressão, divulgam situações que podem ser enquadradas num comportamento de bullying banks", justificam os juízes desembargadores.
O pequeno investidor de Fafe já tinha sido absolvido em primeira instância, mas os responsáveis do BCP decidiram recorrer. Manuel Nogueira ficou conhecido como "Senhor dos Passos", por se postar à porta de vários edifícios do BCP vestido de Cristo, carregando uma cruz. O objectivo era vingar-se do banco por lhe ter transformado a vida num "calvário".
Para os desembargadores da Relação, é legítima a "atitude crítica do cidadão comum" na denúncia daquilo que "vulgarmente se apelida debullying banks". Podem então os bancos praticar bullying? Tudo indica que sim. Fazem-no quando, através dos seus colaboradores, realizam "actos, intencionais e repetidos, com o objectivo de vender os seus produtos e serviços, colocando o consumidor numa atitude de acentuada vulnerabilidade decisória, designadamente por omitir a necessária informação para que seja tomada uma opção consciente", especifica o acórdão da Relação.
Terá sido isso o que aconteceu com Manuel Nogueira, cliente antigo do BCP que em 2000 decidiu gastar mais de 500 mil euros na compra de acções do banco, em seu nome e no de mais 27 familiares e amigos. Alegadamente aconselhado por funcionários, que lhe terão garantido a valorização das acções, pediu um empréstimo e arriscou. Ao preço de mais de cinco euros cada, as acções acabariam por cair a pique, deixando-o numa situação aflitiva.
O pequeno investidor foi um entre os muitos clientes do BCP que adquiriram acções nos aumentos de capital do banco, de 2000 a 2001, e não foi o único a reclamar. Vários outros encenaram ruidosos protestos, interpuseram processos em tribunal e apresentaram queixas à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), acusando o banco de os ter levado a comprar os títulos. Mas Manuel foi seguramente o cliente que deu mais nas vistas. Em 2009, surgiu na entrada do edifício da Alfândega do Porto, onde se realizava uma assembleia de accionistas, de roupas roxas, carregando uma imponente cruz. No ano seguinte, voltou. Ameaçava então: "Não tenho medo. Daqui a 20 anos, estarei cá com a mesma vitalidade."
Em Novembro desse ano cumpriu a promessa e voltou, desta vez para a porta das instalações do banco, no Porto, onde ficou posicionado horas a fio, durante dois dias, munido de um banco, de uma cruz de madeira e vários cartazes. "Fui enganado! Não posso ficar calado!", proclamava. Apesar de considerarem que a linguagem usada é "dura e abstractamente insultuosa", os desembargadores da Relação defendem que não ficou provado serem falsos os factos e as afirmações contidas nos cartazes. Quando as acções do BCP começaram a subir, Manuel Nogueira ainda tentou vendê-las, "no que foi impedido pelos funcionários que lhe garantiram que iam subir", lembram, notando que a "agressividade da campanha" levou este e outros clientes a sentirem-se enganados.

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